Chanceler: Ocidente deve se preparar para Egito islamizado
11 fev2011 - 17h28
(atualizado às 17h32)
Compartilhar
Eduardo Graça
Direto de Nova York
"Há risco de o Egito se tornar um país mais islamizado, mas a Europa e o Ocidente precisam se preparar para este cenário e trabalhar de forma mais produtiva do que em outros episódios semelhantes no passado", afirmou o Ministro de Estado e dos Negócios Exteriores de Portugal, Luis F. M. Amado, pouco antes do início da reunião de Alto Nível do Conselho de Segurança da ONU, nesta manhã, presidida pelo Ministro das Relações Exteriores do Brasil, Antonio de Aguiar Patriota. O chanceler português conversou com os jornalistas sobre a crise nos países árabes instantes antes da renúncia do presidente egípcio Hosni Mubarak, nesta sexta, e elogiou o tema da reunião, proposto pelo Brasil, que exerce este mês a presidência rotativa do Conselho de Segurança, em torno da Paz, Segurança e Desenvovimento.
Veja anúncio oficial da renúncia de Mubarak no Egito:
"Estamos preocupados com a situação no Egito e acreditamos ser necessária uma posição forte e unificada do Ocidente em relação à necessidade de uma transição pacífica no Egito, que leve em conta os anseios da população. O papel das Forças Armadas egípicas é importantíssimo neste momento. É um momento histórico e o mundo ocidental precisa aprender as licões das ruas de Cairo. A Europa, especialmente, precisa ter uma visão estratégica nova e integrada frente à nova realidade do mundo árabe", disse.
O secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, reiteirou, hoje de manhã, que a organização espera uma transição pacífica, transparente e ordeira no Egito, com respeito aos direitos humanos. Ban Ki-moon também afirmou que a ONU está pronta para auxiliar os egípcios no processo de transição.
Ontem, em encontro fechado com intelectuais, diplomatas e jornalistas americanos, promovido pelo Council of Foreign Relations (CFR), um dos think-tanks mais influentes dos EUA, o ministro Patriota afirmou esperar que o Egito saia mais forte da crise, mais democrático, afim de trilhar um caminho de aprimoramento institucional que leve também ao progresso econômico. "Acho que boa parte dessa crise reflete frustração com a desigualdade, com a dificuldade que o Egito tem tido de encontrar um caminho para a prosperidade inclusiva. Isso é uma causa muito cara ao Brasil, é o que temos conseguido produzir no nosso país", afirmou Patriota.
Egípcios saem às ruas, derrubam Mubarak e fazem história
Desde o último dia 25 de janeiro - data que ganhou um caráter histórico, principalmente na internet, principalmente pelo uso da hashtag #Jan25 no Twitter -, os egípcios protestam pela saída do presidente Hosni Mubarak, que está há 30 anos no poder. No dia 28 as manifestações ganharam uma nova dimensão, fazendo o governo cortar o acesso à rede e declarar toque de recolher. As medidas foram ignoradas pela população, mas Mubarak disse que não sairia. Limitou-se a dizer que buscaria "reformas democráticas" para responder aos anseios da população a partir da formação de um novo governo.
A partir do dia 29, um sábado, a nova administração foi anunciada. A medida, mais uma vez, não surtiu efeito, e os protestos continuaram. O presidente egípcio se reuniu com militares e anunciou o retorno da polícia antimotins. Enquanto isso, a oposição seguiu se organizando. O líder opositor Mohamad ElBaradei garantiu que "a mudança chegará" para o Egito. Na terça, dia 1º de fevereiro, dezenas de milhares de pessoas se reuniram na praça Tahrir para exigir a renúncia de Mubarak. A grandeza dos protestos levou o líder egípcio a anunciar que não participaria das próximas eleições, para delírio da massa reunida no centro do Cairo.
O dia seguinte, 2 de fevereiro, no entanto, foi novamente de caos. Manifestantes pró e contra Mubarak travaram uma batalha campal na praça Tahrir com pedras, paus, facas e barras de ferro. Nos dias subsequentes os conflitos cessaram e, após um período de terror para os jornalistas, uma manifestação que reuniu milhares na praça Tahrir e impasses entre o governo e oposição, a Irmandade Muçulmana começou a dialogar com o governo.
Em meio aos protestos do dia 10 de fevereiro - o 17º seguido desde o início das manifestações -, Mubarak anunciou que faria um pronunciamento à nação. Centenas de milhares rumaram à Praça Tahrir, enquanto corriam boatos de que o presidente poderia anunciar a renúncia ao cargo. À noite e com atraso de mais de uma hora, a TV estatal egípcia transmitiu a frustração: Mubarak anunciava, sem clareza alguma, que 'passava alguns poderes' para seu vice, Omar Suleiman, mas que permanecia no cargo, para a ira de Tahrir.
Após o momento de incredulidade na quinta, os egípcios mantiveram a força dos protestos na sexta-feira. Insatisfeitos, milhares de manifestantes pernoitaram na Praça Tahrir, mantendo a pressão sobre o governo. No final da tarde, o vice-presidente Omar Suleiman, num pronunciamento de 30 segundos na TV estatal, anunciou que Hosni Mubarak renunciava ao poder, encerrava seu governo de quase 30 anos e abria espaço definitivamente para a transição no Egito.
Desenho de 1882 mostra oficiais britânicos em missão no Egito durante o conflito pelo controle do Canal do Suez. Nessa época, forças nacionalistas do Egito tentavam assumir o controle do país. Os europeus - especialmente Reino Unidos e França - temeram pelas consequências, e iniciaram uma série de intervenções
Foto: Hulton Archive / Getty Images
Em 1936, estudante preso por policial durante levante estudantil no Cairo é entrevistado por jornalista. Em 1922, o Egito atingiu sua independência, passando a funcionar como uma monarquia
Foto: Fox Photos / Getty Images
Soldado britânico baixa a bandeira do Reino Unido a meio mastro, indicando a morte do Rei Fuad, em 1936. O sultão Fuad foi o primeiro rei da era moderna egípcia, e foi sucedido por seu filho Farouk, o segundo e último
Foto: Oscar Marcus/Fox Photos / Getty Images
Em abril de 1936, estudantes egípcios proclamam lealdade ao Rei Fuad, ao lado de sua tumba
Foto: Oscar Marcus/Fox Photos / Getty Images
Em abril de 1936, estudantes egípcios proclamam lealdade ao Rei Fuad, ao lado de sua tumba, no lado de fota do Palácio Abdine
Foto: Oscar Marcus/Fox Photos / Getty Images
Foto de 1938 mostra o Rei Farouk em momento de meditação. Sucessor do pai, ele reinou no Egito de 1936 a 1952
Foto: Keystone / Getty Images
Foto oficial do Rei Farouk; sei reinado terminou na revolução de 1952, quando seu filho, Fuad II, reinou como regente na transição política
Foto: Hulton Archive / Getty Images
Em fevereiro de 1936, soldados descansam ao lado da Universidade Egípcia, no Cairo, à espera de novos levantes populares
Foto: Keystone / Getty Images
Aluna gesticula em direção à multidão durante protestos após a assinatura do tratato anglo-egípcio, que encerrou a ocupação militar britânica no Egito, mas manteve o Canal do Suez sobre controle dos estrangeiros
Foto: General Photographic Agency/Hulton Archive / Getty Images
Soldados revistam trabalhadores egípcios na região do Canal do Suez, em 1951, cujo controle era desde o início do século cobiçado por diversas potências
Foto: Raymond Kleboe/Picture Post / Getty Images
Foto mostra porta-retrato quebrado com a foto do Rei Farouk, o último rei do Egito. Ele foi forçado a exilar-se após o golpe de Estado de 1952, que inaugurou a era republicana egípcia
Foto: Hulton Archive / Getty Images
Em 1953, multidão de apoiadores do general e presidente egípcio Muhammad Naguib se agrupam na cidade de Helwan para saudá-lo; Naguib foi o primeiro presidente do país, posto que ocupou até 1954
Foto: Three Lions / Getty Images
Em 1953, o líder egípcio Muhammad Naguib (centro, à direita) e Gamal Abdul Nasser (centro, à esquerda), participam de conferência, um ano após o golpe de Estado; Nasser, ao lado de Naguib, era um dos principais líderes do período
Foto: Ronald Startup/Picture Post / Getty Images
Multidões saúdam passagem do presidente Muhammad Naguib, no Cairo. Naguib e outros oficiais haviam acabado de tomar o poder do Rei Farouk em um golpe de Estado
Foto: Bert Hardy / Getty Images
Jornais britânicos de 31 de outubro de 1956 estampam manchetes sobre a Crise no Canal do Suez, iniciada no dia 29
Foto: G Godden / Getty Images
Em 1956, crianças egípcias são treinadas para o serviço de atiradores; a Crise do Suez colocou o Egito, então uma jovem república, contra Reino Unido, França e Israel
Foto: Bert Hardy / Getty Images
Em 1956, em meio à luta pelo controle do Canal do Suez, egípcias judias se despedem com no aeroporto do Cairo
Foto: Scheler / Getty Images
Refugiado judeu egípcio para atrás de propaganda de companhia da Escandinávia, em 1956, no Egito
Foto: Scheler / Getty Images
Egípcia chora enquanto corre na tentativa de alcançar o carro que leva o corpo de seu marido, nas ruas da cidade de Port Said, ocupada pelas tropas anglo-francesas
Foto: Terry Fincher / Getty Images
Jovem soldado observa colegas, posicionado na varanda de uma residência atingida por bala. A batalha pelo Suez acabou com a eventual retirada das tropas estrangeiras
Foto: Joseph McKeown/Picture Post / Getty Images
Em 1967, conflitos de interesses entre Israel e diversos países árabes eclodiram na Guerra dos Seis Dias; a foto mostra soldados egípcios feridos, capturados pelas forças israelenses durante o confronto
Foto: Terry Fincher / Getty Images
Infantaria israelense avança à frente de batalha do Suez; ao lado, um caminhão leva prisioneiros egípcios de guerra na direção oposta
Foto: Terry Fincher / Getty Images
Foto mostra soldados egípcios mortos no caminho das forças israelenses durante a Guerra dos Seis Dias; estima-se que cerca de 20 mil pessoas tenham morrido no conflito
Foto: Terry Fincher/Express / Getty Images
Tropas israelenses avançam em direção ao Deserto do Sinai para atacar o exército egípcio; o território acabou conquistado pelos israelenses
Foto: Keystone / Getty Images
Foto mostra (da esq. à dir.) os líderes israelense, Yitzhak Rabin; egípcio, Hosni Mubarak; jordaniano, Rei Hussein; e americano, Bill Clinton, observados por Yasser Arafat, instantes antes da assinatura de um acordo sobre a divisão do controle da Cisjordânia