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Tragédia em Santa Maria

Familiares de vítimas da Kiss protestam contra MP: 'esculhambaram'

Com faixas, banners e cartazes, eles mostraram sua indignação pelo arquivamento do Inquérito Policial Militar (IPM)

21 ago 2013 - 17h27
(atualizado às 17h43)
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Os manifestantes ficaram cerca de uma hora na frente da sede do MP de Santa Maria, localizada perto do Fórum, no bairro Nossa Senhora de Lourdes
Os manifestantes ficaram cerca de uma hora na frente da sede do MP de Santa Maria, localizada perto do Fórum, no bairro Nossa Senhora de Lourdes
Foto: Luiz Roese / Especial para Terra

Familiares de vítimas da tragédia da Boate Kiss fizeram um protesto silencioso em frente à sede do Ministério Público (MP) de Santa Maria (RS) na tarde desta quarta-feira. Com faixas, banners e cartazes, eles resolveram mostrar sua indignação pela manifestação dos promotores pelo arquivamento do Inquérito Policial Militar (IPM) em relação aos bombeiros que atuaram no combate ao fogo e no resgate das pessoas que estavam na casa noturna, na madrugada de 27 de janeiro.

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"Nossa indignação é pelo trabalho do MP. Os bombeiros, no dia do incêndio, só estavam molhando e mandando a gurizada entrar para salvar os outros. Não levaram em consideração os depoimentos de vários jovens. Só consideraram o que um médico disse, que os jovens estavam violentos. O único trabalho competente do Ministério Público foi esculhambar o que a Polícia Civil fez”, desabafou Carina Mignon, que perdeu na tragédia a filha Thanise Garcia, 18 anos.

A manifestação foi silenciosa. Nem mesmo quando os dois promotores responsáveis pela denúncia do caso à Justiça Militar, Joel Oliveira Dutra e César Augusto Pivetta Carlan, passaram, houve hostilidade. Eles não chegaram a falar com os manifestantes. Quem também participou do protesto foi a sobrevivente Maria de Fátima Nascimento, que tinha ido à Kiss em 27 de janeiro para tentar conseguir um emprego. Acabou com várias sequelas e, atualmente, sem poder trabalhar, está passando por muitas dificuldades financeiras.

"Vim prestar meu apoio aos familiares. Meus pais morreram há 11 anos, e sei o quando dói perder alguém da família”, disse. Outro que se juntou ao grupo e não perdeu familiar algum na tragédia foi Adair do Amaral, que trabalhava no estacionamento em frente à boate. Os manifestantes ficaram cerca de uma hora na frente da sede do MP de Santa Maria, localizada perto do Fórum, no bairro Nossa Senhora de Lourdes. Depois, todos entraram.

No saguão em frente à recepção, rezaram. Eles não chegaram a pedir para conversar com algum promotor. A manifestação desta quarta também marcou o primeiro ato do Movimento Mães de Janeiro, que agrega mulheres que perderam seus filhos em função do incêndio na Kiss. “O movimento  tem esse nome porque foi o mês em que nossas vidas acabaram, com a morte dos nossos filhos”, explicou Carina. 

Incêndio na Boate Kiss
Na madrugada do dia 27 de janeiro, um incêndio deixou 242 mortos em Santa Maria (RS). O fogo na Boate Kiss começou por volta das 2h30, quando um integrante da banda que fazia show na festa universitária lançou um artefato pirotécnico, que atingiu a espuma altamente inflamável do teto da boate.

Com apenas uma porta de entrada e saída disponível, os jovens tiveram dificuldade para deixar o local. Muitos foram pisoteados. A maioria dos mortos foi asfixiada pela fumaça tóxica, contendo cianeto, liberada pela queima da espuma.

Os mortos foram velados no Centro Desportivo Municipal, e a prefeitura da cidade decretou luto oficial de 30 dias. A presidente Dilma Rousseff interrompeu uma viagem oficial que fazia ao Chile e foi até a cidade, onde prestou solidariedade aos parentes dos mortos.

Os feridos graves foram divididos em hospitais de Santa Maria e da região metropolitana de Porto Alegre, para onde foram levados com apoio de helicópteros da FAB (Força Aérea Brasileira). O Ministério da Saúde, com apoio dos governos estadual e municipais, criou uma grande operação de atendimento às vítimas.

Quatro pessoas foram presas temporariamente - dois sócios da boate, Elissandro Callegaro Spohr, conhecido como Kiko, e Mauro Hoffmann, e dois integrantes da banda Gurizada Fandangueira, Luciano Augusto Bonilha Leão e Marcelo de Jesus dos Santos. Enquanto a Polícia Civil investiga documentos e alvarás, a prefeitura e o Corpo de Bombeiros divergem sobre a responsabilidade de fiscalização da casa noturna.

A tragédia fez com que várias cidades do País realizassem varreduras em boates contra falhas de segurança, e vários estabelecimentos foram fechados. Mais de 20 municípios do Rio Grande do Sul cancelaram a programação de Carnaval devido ao incêndio.

No dia 25 de fevereiro, foi criada a Associação dos Pais e Familiares de Vítimas e Sobreviventes da Tragédia da Boate Kiss em Santa Maria. A associação foi criada com o objetivo de oferecer amparo psicológico a todas as famílias, lutar por ações de fiscalização e mudança de leis, acompanhar o inquérito policial e não deixar a tragédia cair no esquecimento.

Indiciamentos
Em 22 de março, a Polícia Civil indiciou criminalmente 16 pessoas e responsabilizou outras 12 pelas mortes na Boate Kiss. Entre os responsabilizados no âmbito administrativo, estava o prefeito de Santa Maria, Cezar Schirmer (PMDB). A investigação policial concluiu que o fogo teve início por volta das 3h do dia 27 de janeiro, no canto superior esquerdo do palco (na visão dos frequentadores), por meio de uma faísca de fogo de artifício (chuva de prata) lançada por um integrante da banda Gurizada Fandangueira.

O inquérito também constatou que o extintor de incêndio não funcionou no momento do início do fogo, que a Boate Kiss apresentava uma série das irregularidades quanto aos alvarás, que o local estava superlotado e que a espuma utilizada para isolamento acústico era inadequada e irregular. Além disso, segundo a polícia, as grades de contenção (guarda-corpos) existentes na boate atrapalharam e obstruíram a saída de vítimas, a boate tinha apenas uma porta de entrada e saída e não havia rotas adequadas e sinalizadas para a saída em casos de emergência - as portas apresentavam unidades de passagem em número inferior ao necessário e não havia exaustão de ar adequada, pois as janelas estavam obstruídas.

Já no dia 2 de abril, o Ministério Público denunciou à Justiça oito pessoas - quatro por homicídios dolosos duplamente qualificados e tentativas de homicídio, e outras quatro por fraude e falso testemunho. A Promotoria apontou como responsáveis diretos pelas mortes os dois sócios da casa noturna, Mauro Hoffmann e Elissandro Spohr, o Kiko, e dois dos integrantes da banda Gurizada Fandangueira, Marcelo de Jesus dos Santos e Luciano Augusto Bonilha Leão.

Por fraude processual, foram denunciados o major Gerson da Rosa Pereira, chefe do Estado Maior do 4º Comando Regional dos Bombeiros, e o sargento Renan Severo Berleze, que atuava no 4º CRB. Por falso testemunho, o MP denunciou o empresário Elton Cristiano Uroda, ex-sócio da Kiss, e o contador Volmir Astor Panzer, da GP Pneus, empresa da família de Elissando - este último não havia sido indiciado pela Polícia Civil.

Os promotores também pediram que novas diligências fossem realizadas para investigar mais profundamente o envolvimento de outras quatro pessoas que haviam sido indiciadas. São elas: Miguel Caetano Passini, secretário municipal de Mobilidade Urbana; Belloyannes Orengo Júnior, chefe da Fiscalização da secretaria de Mobilidade Urbana; Ângela Aurelia Callegaro, irmã de Kiko; e Marlene Teresinha Callegaro, mãe dele - as duas fazem parte da sociedade da casa noturna.

Fonte: Especial para Terra
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