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Tragédia em Santa Maria

Boate Kiss: palmas, sinos e buzinas marcam os três meses da tragédia

Em Santa Maria (RS), cerca de 200 pessoas se reuniram na Praça Saldanha Marinho, no Centro, para lembrar as 241 vítimas do incêndio na casa noturna

27 abr 2013 - 10h26
(atualizado às 10h43)
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O toque dos sinos da Catedral Metropolitana de Santa Maria (RS), pontualmente às 8h deste sábado, foi a senha para que cerca de 200 pessoas começassem a prestar suas homenagens às 241 vítimas da tragédia da boate Kiss, no dia em que o incêndio completa três meses. Nesse momento, os amigos e familiares das pessoas que morreram começaram a bater palmas na Praça Saldanha Marinho, no Centro da cidade. O ato já se tornou tradicional no dia 27 de cada mês.

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Era para ser um minuto de barulho que, além das palmas e dos sinos, ainda teve o componente das buzinas dos carros. Mas foram sete minutos. Enquanto um grupo fazia sua reverência na praça, outro se reunia em frente à boate Kiss, a uma quadra dali.

Depois das palmas, Denyze Marques Diniz, 60 anos, pediu que todas a acompanhassem em um “Parabéns a Você" para o neto Vinicius Silveira Marques de Mello, que morreu no incêndio da Kiss e completaria 21 anos neste sábado. Em seguida, o presidente da Associação de Familiares de Vítimas e Sobreviventes da Tragédia de Santa Maria (AVTSM), Adherbal Ferreira, comandou um Pai Nosso e uma Ave Maria, com todos de mãos dadas.

Durante a manifestação da manhã deste sábado, familiares usaram camisetas com fotos das vítimas e penduraram banners e cartazes junto à tenda da AVTSM na praça. Enquanto os aplausos ecoavam, muitos não seguraram a emoção e choraram. Também eram constantes os abraços.

Tatiele Arrial, 26 anos, foi à praça para não deixar que a tragédia seja esquecida. Ela estava na boate na madrugada do incêndio e conseguiu sair com vida, ficando seis dias internada depois. O namorado dela, Marton Matana, 22 anos, não conseguiu escapar e morreu. “A gente quer justiça, é o principal. Não só pelos 241 mortos, mas também por todos os sobreviventes”, diz Tatiele.

Desde a noite de sexta-feira, familiares e amigos de vitimas da tragédia da boate Kiss fizeram uma vigília na Praça Saldanha Marinho, dividindo experiências e fazendo orações. Às 18h, no mesmo local, a associação promoverá um “minuto de aplausos”.

Outro evento dos três meses da tragédia que tem a participação de familiares das vítimas é uma caminhada organizada pelo Movimento Santa Maria do Luto à Luta. O nome do evento, "Meu Partido É um Coração Partido", é para destacar que a iniciativa é totalmente apartidária.

Na programação, haverá distribuição de panfletos na Praça Saldanha Marinho a partir das 16h30 deste sábado. Depois, às 17h30, também na Saldanha Marinho, começa a concentração para uma caminhada. Nesse momento, as manifestações serão permitidas somente para familiares das vítimas da tragédia.

Para as 18h30, está marcada a saída da caminhada até a Basílica da Medianeira. No trajeto, serão colocadas fitas pretas nos postes e nas árvores de um dos lados das vias do percurso, para simbolizar o luto. Do outro lado, serão amarradas fitas brancas, em referência à paz que os manifestantes estão buscando. Serão 241 fitas no total, em alusão ao número de vítimas da tragédia.

A missa na Basílica da Medianeira começa às 20h. Durante o sábado, haverá celebrações religiosas alusivas à tragédia em outras igrejas de Santa Maria.

Incêndio na Boate Kiss

Na madrugada do dia 27 de janeiro, um incêndio deixou 241 mortos em Santa Maria (RS). O fogo na Boate Kiss começou por volta das 2h30, quando um integrante da banda que fazia show na festa universitária lançou um artefato pirotécnico, que atingiu a espuma altamente inflamável do teto da boate.

Com apenas uma porta de entrada e saída disponível, os jovens tiveram dificuldade para deixar o local. Muitos foram pisoteados. A maioria dos mortos foi asfixiada pela fumaça tóxica, contendo cianeto, liberada pela queima da espuma.

Os mortos foram velados no Centro Desportivo Municipal, e a prefeitura da cidade decretou luto oficial de 30 dias. A presidente Dilma Rousseff interrompeu uma viagem oficial que fazia ao Chile e foi até a cidade, onde prestou solidariedade aos parentes dos mortos.

Os feridos graves foram divididos em hospitais de Santa Maria e da região metropolitana de Porto Alegre, para onde foram levados com apoio de helicópteros da FAB (Força Aérea Brasileira). O Ministério da Saúde, com apoio dos governos estadual e municipais, criou uma grande operação de atendimento às vítimas.

Quatro pessoas foram presas temporariamente - dois sócios da boate, Elissandro Callegaro Spohr, conhecido como Kiko, e Mauro Hoffmann, e dois integrantes da banda Gurizada Fandangueira, Luciano Augusto Bonilha Leão e Marcelo de Jesus dos Santos. Enquanto a Polícia Civil investiga documentos e alvarás, a prefeitura e o Corpo de Bombeiros divergem sobre a responsabilidade de fiscalização da casa noturna.

A tragédia fez com que várias cidades do País realizassem varreduras em boates contra falhas de segurança, e vários estabelecimentos foram fechados. Mais de 20 municípios do Rio Grande do Sul cancelaram a programação de Carnaval devido ao incêndio.

No dia 25 de fevereiro, foi criada a Associação dos Pais e Familiares de Vítimas e Sobreviventes da Tragédia da Boate Kiss em Santa Maria. A associação foi criada com o objetivo de oferecer amparo psicológico a todas as famílias, lutar por ações de fiscalização e mudança de leis, acompanhar o inquérito policial e não deixar a tragédia cair no esquecimento.

Indiciamentos

Em 22 de março, a Polícia Civil indiciou criminalmente 16 pessoas e responsabilizou outras 12 pelas mortes na Boate Kiss. Entre os responsabilizados no âmbito administrativo, estava o prefeito de Santa Maria, Cezar Schirmer (PMDB). A investigação policial concluiu que o fogo teve início por volta das 3h do dia 27 de janeiro, no canto superior esquerdo do palco (na visão dos frequentadores), por meio de uma faísca de fogo de artifício (chuva de prata) lançada por um integrante da banda Gurizada Fandangueira.

O inquérito também constatou que o extintor de incêndio não funcionou no momento do início do fogo, que a Boate Kiss apresentava uma série das irregularidades quanto aos alvarás, que o local estava superlotado e que a espuma utilizada para isolamento acústico era inadequada e irregular. Além disso, segundo a polícia, as grades de contenção (guarda-corpos) existentes na boate atrapalharam e obstruíram a saída de vítimas, a boate tinha apenas uma porta de entrada e saída e não havia rotas adequadas e sinalizadas para a saída em casos de emergência - as portas apresentavam unidades de passagem em número inferior ao necessário e não havia exaustão de ar adequada, pois as janelas estavam obstruídas.

Já no dia 2 de abril, o Ministério Público denunciou à Justiça oito pessoas - quatro por homicídios dolosos duplamente qualificados e tentativas de homicídio, e outras quatro por fraude e falso testemunho. A Promotoria apontou como responsáveis diretos pelas mortes os dois sócios da casa noturna, Mauro Hoffmann e Elissandro Spohr, o Kiko, e dois dos integrantes da banda Gurizada Fandangueira, Marcelo de Jesus dos Santos e Luciano Augusto Bonilha Leão.

Por fraude processual, foram denunciados o major Gerson da Rosa Pereira, chefe do Estado Maior do 4º Comando Regional dos Bombeiros, e o sargento Renan Severo Berleze, que atuava no 4º CRB. Por falso testemunho, o MP denunciou o empresário Elton Cristiano Uroda, ex-sócio da Kiss, e o contador Volmir Astor Panzer, da GP Pneus, empresa da família de Elissando - este último não havia sido indiciado pela Polícia Civil.

Os promotores também pediram que novas diligências fossem realizadas para investigar mais profundamente o envolvimento de outras quatro pessoas que haviam sido indiciadas. São elas: Miguel Caetano Passini, secretário municipal de Mobilidade Urbana; Belloyannes Orengo Júnior, chefe da Fiscalização da secretaria de Mobilidade Urbana; Ângela Aurelia Callegaro, irmã de Kiko; e Marlene Teresinha Callegaro, mãe dele - as duas fazem parte da sociedade da casa noturna.

Fonte: Especial para Terra
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