PUBLICIDADE
URGENTE
Saiba como doar qualquer valor para o PIX oficial do Rio Grande do Sul

Mundo

Eleitor da extrema-direita francesa quer Sarkozy mais radical

15 abr 2010 - 12h18
Compartilhar
Lúcia Müzell
Direto de Paris

A análise dos números das eleições regionais não deixam dúvidas sobre a ascensão da extrema-direita na França. Seu partido mais representativo, o Frente Nacional, passou de uma média de 10% nos pleitos anteriores para 18% neste ano. Passadas três semanas das eleições, especialistas são unânimes em concluir que o voto no partido, no entanto, não necessariamente significa uma adesão aos princípios preconceituosos e nacionalistas do FN, mas sim um alerta para o governo do presidente Nicolas Sarkozy: é preciso ser ainda mais de direita.

Marine Le Pen (esq.) deve ser a sucessora de Jean-Marie Le Pen à frente do partido Frente Nacional
Marine Le Pen (esq.) deve ser a sucessora de Jean-Marie Le Pen à frente do partido Frente Nacional
Foto: AFP

Tudo porque, desde que assumiu o Palácio do Eliseu, Sarkozy fez questão de assimilar ao seu governo nomes das mais variadas correntes políticas ligados à "diversidade", chegando a empossar como ministro das Relações Exteriores o ex-socialista Bernard Kouchner. O resultado é que, por mais que seja alvo de críticas generalizadas sobre o reforço das políticas anti-imigração, para o eleitorado clássico da direita essas medidas são insuficientes.

"Foi um voto claro de desafio. Sessenta por cento dos eleitores do Frente Nacional nas eleições regionais votaram para enviar um recado ao governo nacional", explica uma das maiores autoridades em extrema-direita da França, o cientista político Jean-Yves Camus, do Instituto das relações Internacionais e Estratégicas (IRIS). "O eleitor do FN, formado basicamente por homens trabalhadores das classes modestas, havia sido seduzido pelo discurso de Sarkozy de que valorizaria 'a França que acorda cedo' e a 'identidade nacional', mas acabou decepcionada com o governo que ele de fato implantou, muito mais moderado."

Entre os que apoiam o partido de extrema-diretia, encontram-se apenas 5% de gerentes de empresas ou intelectuais, contra 16% de desempregados e 19% de operários. É justamente essa camada da população a que mais se vê ameaçada pela chegada da mão de obra imigrante no país.

"Os franceses estão cheios dessa política da enganação levada pelo presidente Sarkozy. Ele não fez nada do que prometeu, o nosso país continua recebendo milhares de imigrantes por ano", pregava abertamente Marine Le Pen, filha do presidente e fundador do partido, Jean-Marie Le Pen, que foi candidata nas eleições regionais pelo Nord-Pas-de-Calais e é a sua provável sucessora no comando da sigla.

O escore obtido pelo Frente Nacional no último pleito - semelhante aos 17% que levaram Jean-Marie Le Pen ao segundo turno das traumáticas eleições presidenciais de 2002, face a Jacques Chirac - causou temor aos franceses. No último final de semana, cerca de 2 mil pessoas protestaram em Lyon contra "a ascensão do FN e do fascismo". Como habitualmente acontece, nenhuma pesquisa de intenções apontava a subida da sigla.

"As pesquisas sempre subestimam as porcentagens do Frente Nacional não porque erram, mas porque os eleitores deste partido tendem a não declarar a sua intenção de voto, que comporta uma certa transgressão das normas socialmente aceitáveis", justifica Camus.

"Ao perceber que o FN chegou ao segundo turno, o eleitorado do partido se mobilizou e decidiu mostrar a sua cara", avalia o diretor-adjunto do Departamento de Opinião do Instituto Francês de Opinião Pública (Ifop), Jérôme Fourquet. "O pior é que tão logo os resultados foram anunciados, o governo de direita de Sarkozy, grande perdedor das regionais, entendeu o recado e imediatamente reagiu, anunciando medidas anti-imigração. Isso funcionou como uma prova para o eleitor do FN de que ele agiu bem, de que o seu voto foi útil e que o FN é a força política de direita que mais atrapalha o status quo centro-direitista."

Eleitor do FN não quer mistura com outras culturas

As regiões nordeste, leste e sudeste são as que mais viraram à extrema-direita. A própria Marine Le Pen previa que o partido venceria em 11 regiões, o que acabou acontecendo em 12. Marselha, no sul, é um caso emblemático onde o FN atingiu 23% dos votos, apesar de ser uma das cidades que mais abriga a comunidade muçulmana e imigrante moradora na França. Na avaliação dos especialistas, os "franceses da gema" - como o Frente Nacional gosta de denominar os cidadãos de pele e olhos claros - não parecem estar nada satisfeitos com a invasão de imigrantes.

Camus lembra que, além do desprezo pelas elites e o sentimento de abandono social, a recusa da imigração, do Islã, de uma França multicultural e mestiça são fatores-chave que determinam a adesão ao partido. O etnocentrismo, diz o especialista, é bem mais forte do que o antissemitismo nos eleitores do partido, embora importantes nomes da sigla ainda não tenham admitido o Holocausto e já tenham demonstrado oposição à comunidade judaica.

O maior problema ainda pode estar por vir e vai acontecer quando o Frente Nacional perceber que o seu maior potencial de eleitorado não está nas pessoas mais à direita no espectro político, mas sim nas que se encontram nas camadas mais inferiores da sociedade, prevê o filósofo e cientista político ligado à direita Alain de Benoist. "A alternativa que traria mais sucesso ao Frente Nacional não é se fechar no seu buncker dos 'duros e puros', encarnar a direita da direita. A melhor opção para eles seria defender radicalmente as camadas populares, os mais sensíveis ao discurso populista que eles adotam", afirma Benoist.

O futuro dirá se o Frente Nacional mudará suas estratégias, impulsionado pela aposentadoria de Jean-Marie Le Pen, anunciada na semana passada. Por enquanto, a maior mudança é sutil, porém assusta: o eleitorado jovem vem aumentando de eleição em eleição e o próprio poder do partido está migrando para as mãos de políticos mais jovens, com entre 40 e 50 anos. Dos 118 vereadores eleitos pela sigla, 60 o foram pela primeira vez. Símbolo da nova geração, até mesmo a neta de Le Pen, Marion Maréchal-Le Pen, 19 anos já se filiou ao partido e concorreu na última votação, pela região de Yvelines - mas não foi eleita.

Fonte: Especial para Terra
Compartilhar
Publicidade