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Mundo

França destruirá 1,5 mil casas em zonas de risco de inundação

11 abr 2010 - 14h24
(atualizado em 12/4/2010 às 13h22)
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Lúcia Müzell
Direto de Paris

Não é só o Rio de Janeiro que vai expulsar os moradores que vivem em zonas de risco de catástrofes naturais. Coincidência do calendário, a França está vivendo nesta semana o drama de ordenar a demolição de 1510 casas que se situam nas localidades destruídas pela tempestade Xynthia, no final de fevereiro. A chamada zona negra, definindo quais moradias serão apagadas do mapa nas regiões de Charentes-Maritime e Vendée, na costa Atlântica do país, foi anunciada nesta quinta-feira e está provocando a ira da população envolvida.

No início de março, casas e ruas ficaram submersas na região litorânea entre La Rochelle e L'Aiguillon-sur-Mer, no oeste do país
No início de março, casas e ruas ficaram submersas na região litorânea entre La Rochelle e L'Aiguillon-sur-Mer, no oeste do país
Foto: AFP

As circunstâncias da tragédia na França são distintas das enfrentadas no Rio de Janeiro: ao contrário dos desabamentos de morros verificados no Brasil, no país europeu a forte tempestade provocou a cheia do mar e a destruição de diques de proteção. A enchente devastou as moradias construídas nas proximidades da praia e provocou a morte de 53 pessoas.

A região ainda está longe de se recuperar dos estragos e a demolição das casas em zonas de risco de inundação é justamente um dos pontos-chave do governo para impedir que novos dramas como este se repitam, além de querer estabelecer um marco-zero na reconstrução das cidades afetadas.

Aos habitantes, no entanto, estão resistentes à obrigação de ter de deixar suas casas, muitas vezes habitadas por décadas pela família, passando de geração em geração. Nem mesmo as indenizações de 250 mil euros previstas por casa destruída parecem animar os franceses a deixar suas casas. As reuniões de anúncio das casas condenadas foram marcadas por forte tensão, chegando a ter moradores ameaçando agredir o prefeito.

O que inquieta os habitantes é que os critérios da seleção não foram especificados. Em algumas cidades, moradores de um lado da rua terão de sair, enquanto que os do lado oposto poderão permanecer. Em outros casos, habitações que sequer foram atingidas pela tempestade terão de ser demolidas, enquanto que outras que sofreram estragos permanecerão de pé.

"O Estado não provou que a demolição é a única alternativa segura para os moradores. Não é possível aumentar a rigidez dos diques? As casas não podem ser reformadas de tal forma que seja possível evitar a inundação? Essas questões estão todas em aberto", explicou ao Terra Corinne Lepage, advogada da Associação das Vítimas de Inundações de Faute-sur-mer. Para Corine, a delimitação foi feita muito rapidamente, menos de dois meses após a tempestade, tempo insuficiente para realizar estudos mais precisos sobre a situação de cada casa, segundo ela.

Para muitos prefeitos, impotentes diante da decisão do governo da República, participar do processo também é uma tarefa particularmente difícil, já que além de impopular, muitas vezes vai contra as próprias conclusões do que está sendo feito. É o caso do prefeito de Loix, Lionel Quillet, que chegou a apresentar uma carta de demissão depois não conseguir ter acesso aos critérios técnicos que determinaram a lista de casas a serem destruídas na sua cidade. "Me recuso a participar desta arbitrariedade", reclamou ele na televisão.

A cartografia prevista para a reconstrução das cidades divide as zonas em negras, onde as construções serão proibidas, laranja, onde as casas deverão ser reformadas conforme certos critérios de prevenção, e em amarelas, nas quais a população poderá continuar vivendo normalmente.

Face à revolta, governo começa a recuar
O anúncio era em princípio irrevogável e não-negociável, mas revolta da população já resultou em declarações de recuo por parte do governo. Dominique Bussereau, ministro dos Transportes e presidente da região - espécie de governador nos padrões brasileiros ¿ sinalizou nesta sexta-feira que alguns casos poderão ser revistos em função de laudos de especialistas.

Nos casos em que a decisão será mantida, os moradores que quiserem contestá-la deverão mover um processo judicial contra o Estado. Nesta sexta-feira, associações de moradores já estavam mobilizadas para preparar as suas ações. Outros estão coletando assinaturas para entregar um abaixo-assinado ao presidente Nicolas Sarkozy, em uma última tentativa de rever a opção da demolição.

Já as indenizações deverão começar a ser pagas nas próximas semanas. Na França, todas as moradias são obrigadas a possuir seguro. Mesmo assim, os habitantes tem medo de serem prejudicados no processo. "Passei anos construindo a minha casa, que para mim era a casa dos sonhos. Quem me garante que o valor da indenização que vão me propor vai ser o que ela realmente valia?", disse Elisabeth Voix, a habitante de Charron.

Elisabeth conta que, mesmo que muitas pessoas estejam indignadas com a situação, há também uma infinidade de vítimas que, em função do trauma da tragédia, não veem a hora de deixar a região atingida. "A cidade está bem dividida. Acho que depende muito de o quanto cada um sofreu", avalia.

Fonte: Especial para Terra
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