DEMOCRACIA AINDA NÃO CHEGOU

Dez anos após ser invadido, o Iraque de 2013 está mergulhado em uma grave crise política agravada pelo conflito religioso, e não parece em nada com a democracia anunciada pelos Estados Unidos.

O roteiro traçado pelo então presidente americano, George W. Bush, se baseava em um único argumento. As tropas se lançaram no deserto iraquiano com a ordem de encontrar supostas armas de destruição em massa que estariam em poder do regime de Saddam Hussein. A existência dessas armas nunca foi confirmada.

Muito rapidamente, os Estados Unidos convenceram o Iraque a se juntar aos seus aliados do Ocidente. Mas a queda de Saddam Hussein permitiu que o Irã, país xiita - assim como a maioria oprimida pelo governo de Saddam - mantivesse influência sobre seu vizinho. Desde a saída dos últimos soldados, em dezembro de 2011, Washington tem dificuldade para se fazer ouvir em Bagdá.

Em 2003, Bush defendeu "argumentos de fachada, como a existência de armas de destruição em massa, as ligações (do Iraque) com a Al-Qaeda, os riscos que apresentava para a segurança dos Estados Unidos", resume Crispin Hawes, diretor do serviço Oriente Médio da Eurasia Group. "Atualmente, tudo isso parece grotesco", considera.

E ainda havia outro argumento: "a ideia de que o Iraque poderia se tornar um aliado dos Estados Unidos e que a retomada da economia poderia se transformar em catalizador do crescimento no Iraque e em sua região, tornando-se um exemplo a ser seguido", acrescentou.

A guerra não durou muito tempo. Os bombardeios começaram em 19 de março de 2003, na véspera da invasão. Bagdá caiu em 9 de abril, e no dia 1º de maio Bush declarava "Missão cumprida". Mas o pós-guerra se mostrou muito mais sangrento do que a própria guerra. O atentado contra um mausoléu xiita em Samarra, no norte de Bagdá, no dia 22 de fevereiro de 2006, deu início a um conflito religioso de uma violência sem precedentes.

De 2006 a 2008, os redutos sunitas de Al-Anbar e Mossul, as cidades sagradas xiitas de Najaf e Kerbala, assim como Bagdá, se tornaram palco de combates de rua, atentados e assassinatos, colocando insurgentes xiitas e sunitas de um lado e as forças da coalizão de outro.

As hostilidades causaram a morte de mais de 4,8 mil soldados estrangeiros, em sua grande maioria americanos. E, apesar das tropas estrangeiras terem retornado para seus países e a violência ter perdido intensidade, os atentados continuam a matar quase diariamente no Iraque.

Desde a invasão de 2003, ao menos 110 mil (estimativas modestas) civis iraquianos morreram em meio à violência. A reconciliação nacional e uma improvável consolidação das instituições, que deveriam caminhar de mãos dadas com a diminuição da violência, continuam a ser apenas um pensamento positivo.

O governo de Bagdá não suporta ver a região autônoma do Curdistão, ao norte assinar, sem o seu prévio acordo, contratos com companhias de petróleo estrangeiras. Os dois disputam ainda uma faixa de território que inclui Kirkuk, onde se concentra parte das reservas de hidrocarbonetos do país.

Mas, por enquanto, a principal questão é a retomada dos conflitos religiosos que o governo tenta controlar, adiando ao mesmo tempo a implementação de políticas reais para resolver outras importantes questões como a de infraestrutura, corrupção, desemprego e insegurança. Desde o final de dezembroDE 2012, a minoria sunita - que governava o país no período de Saddam Hussein - cobra o fim da marginalização de que considera ser vítima por parte do governo do xiita Nuri al-Maliki.

FONTE: AFP