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Paraíba do Sul São Paulo

Disputado por SP e RJ, rio Paraíba do Sul recebe 1 bi de litros de esgoto todos os dias

GHX Comunicação

O Paraíba do Sul, um dos mais importantes rios brasileiros, banha os estados de Minas Gerais (88 municípios), Rio de Janeiro (57) e São Paulo (39). Formado pela confluência dos rios Paraitinga e Paraibuna, o Paraíba é a única fonte de abastecimento de água para mais de 12 milhões de pessoas no Rio de Janeiro. Nasce na Serra da Bocaina, em São Paulo, e perfaz um trajeto de aproximadamente 1,1 mil quilômetros até a foz em Atafona, no norte fluminense. Em superfície, tem uma das três maiores bacias hidrográficas secundárias do Brasil, em uma área de quase 57 mil quilômetros quadrados.

Paraíba do Sul
Paraíba do Sul

O impacto do homem

Maculado pela poluição, o rio recebeu investimentos para sua revitalização nos últimos anos e, com a medida, melhorou diversos índices de qualidade. Mas ainda há muito a ser feito. Segundo a Agência Nacional de Águas (ANA), até um bilhão de litros de esgoto são despejados todos os dias em sua bacia. Ao todo, menos de 6% dos efluentes oriundos do Rio de Janeiro e pouco mais de 7% do esgoto de Minas Gerais são tratados. Enquanto isso, São Paulo trata quase 55%. Muito desse esgoto in natura acaba nas águas do rio Paraíba do Sul.

Pesa o fato de o rio abranger território quase que completamente antrópico, ou seja, habitado pelo homem. “A poluição de qualquer curso de água piora quanto maior o grau de antropização”, explica o engenheiro agrônomo Eugênio de Araujo Neto, representante do Sindicato das Indústrias de Extração de Areia do Estado de São Paulo. “Ou seja, quanto mais gente morando perto do rio, maior a carga poluidora, tanto das pessoas quanto de indústrias. Não que no meio rural isso não ocorra, mas ocorre em menor grau e por outras fontes, como uso de agrotóxicos e demais insumos agrícolas, além de dejetos animais”.

A bacia do rio possui, entre suas principais atividades econômicas, os setores industrial e agropecuário. Em estudos, análises da qualidade da água apontaram a presença, em diferentes locais, de substâncias tóxicas como metais pesados, além de inseticidas e herbicidas, todos danosos ao ecossistema. Essas substâncias contribuem em muito para a perda da diversidade biológica no rio.

“Quanto mais gente morando perto do rio, maior a carga poluidora”

O Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) mantém, inclusive, um programa para recuperar e manter as espécies aquáticas ameaçadas de extinção da região. Batizado de Plano de Ação Nacional para Conservação das Espécies Aquáticas da Bacia do Rio Paraíba do Sul, ele visa proteger 17 espécies aquáticas atualmente na lista nacional de espécies ameaçadas de extinção e duas na lista de espécies ameaçadas do estado de São Paulo.

Transposição

A mais recente polêmica envolvendo o rio Paraíba do Sul foi a proposta de transposição automática de suas águas para o sistema Cantareira sempre que o reservatório que serve a capital paulista chegar a 35% de sua capacidade. O projeto colocou, em campos opostos, os governos paulista e fluminense. O então governador do Rio de Janeiro Sérgio Cabral (PMDB-RJ) chegou a dizer, em meados de março, que “não permitiria” o projeto de transposição apresentado pelo governador de São Paulo Geraldo Alckmin (PSDB-SP)

Com ou sem transposição, a preocupação com a limpeza do rio deve ser de ambos os estados, que se beneficiam direta e indiretamente de suas águas. Não são poucos os acidentes que mostram o quão exposto está o Paraíba do Sul. Com as margens pesadamente industrializadas, eventos de graves repercussões ecológicas estão sempre prestes a acontecer.

Dois dos mais danosos ocorreram em 2003 e 2008. No primeiro, houve o lançamento ao rio de soda cáustica com lignina, um rejeito comum da fabricação de papel. No segundo, em 2008, 8 mil toneladas de um pesticida vazaram de uma fábrica de fertilizantes e atingiram o rio Pirapetinga, afluente do Paraíba do Sul, provocando a morte de mais de 80 toneladas de peixes. Por fim, em dezembro de 2010, um vazamento de cerca de 2 milhões de litros de resíduos tóxicos de um tanque da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), em Volta Redonda, colocou em risco o abastecimento de água de 8 milhões de consumidores

Melhora

Há motivos para comemorar, no entanto. De acordo com o relatório de Conjuntura dos Recursos Hídricos no Brasil de 2013, organizado pela ANA, a bacia do Paraíba do Sul encontra-se entre as que apresentaram o maior número de pontos com melhorias entre 2001 e 2011 no Brasil. Segundo as estatísticas, 24% dos locais monitorados aprimoraram seus índices de qualidade, especialmente graças ao aumento dos investimentos em coleta e tratamento de esgoto.

“Existem dezenas de projetos para despoluição, além de ações implementadas pelos poderes executivos através dos sistemas de tratamento de água e esgoto”, afirma Neto. “No âmbito do Comitê das Bacias Hidrográficas do Rio Paraíba do Sul, são fomentados projetos de melhoria da qualidade das águas da bacia do rio e seus afluentes, projetos de “revegetação” e proteção de margens e projetos de controle e drenagem de áreas urbanas, além de educação ambiental em vários níveis”. As ações são bancadas pela cobrança do uso de água e com recursos do Fundo Estadual de Recursos Hídricos.

No ano passado, para celebrar o Dia do Rio Paraíba do Sul, em 22 de setembro, a Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp) anunciou a soltura de 2 mil peixes das espécies piabanha e lambari em Tremembé. A piabanha é uma espécie característica do Paraíba do Sul que voltou a povoar as águas do rio por conta do aumento nos níveis de oxigênio, embora continue ameaçada em outros cursos no País. O evento simbolizou o retorno da vida ao trecho paulista do rio.

Em 2014, a Sabesp pretende universalizar o saneamento básico nas 24 cidades onde opera no Vale do Paraíba e na Serra da Mantiqueira. Ao todo, a Sabesp afirma estar investindo, no período de 2011 a 2014, R$ 519 milhões em obras para melhorar a qualidade da água do rio Paraíba do Sul e seus afluentes.

De acordo com dados do Sistema Nacional de Informações de Saneamento, 14 municípios da bacia hidrográfica do rio Paraíba do Sul apresentaram atendimento maior ou igual a 90% em 2011, em comparação com 11 em 2009. Os indicadores da proporção de efluente doméstico coletado e tratado em relação ao efluente doméstico total gerado também indicam que houve pequena melhora desde 2012.

Investimentos

Para os próximos anos, mais investimentos são esperados. Conforme o relatório Conjuntura dos Recursos Hídricos no Brasil, o Comitê de Integração da Bacia Hidrográfica do rio Paraíba do Sul (Ceivap) tem as seguintes metas: estruturação e operacionalização do sistema de gestão de forma integrada com os demais organismos de bacia existentes, recuperação da qualidade da água que é comprometida pelos efluentes domésticos e industrias e controle de processos erosivos em função da degradação ambiental verificada na bacia.

Para isso, o plano de recursos hídricos do Paraíba do Sul prevê a necessidade de investimentos públicos e privados de R$ 4,7 bilhões para o período entre 2007 e 2020. O projeto apresenta duas linhas principais. A primeira focada em ações estruturais ligadas aos sistemas de coleta e tratamento de esgotos domésticos, aos sistemas de tratamento de água e à disposição final de resíduos sólidos urbanos. A segunda em programas de planejamento e gestão dos recursos hídricos que compreendem ações, tanto estruturais quanto não estruturais, de prevenção e controle de inundações, proteção de mananciais e sustentabilidade do uso do solo, além de racionalização do uso dos recursos hídricos.