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Enem sem pressão! Escolas apostam em abordagem diferente

Estudantes falam das vantagens da pedagogia Waldorf na hora de prestar o exame e outros vestibulares

17 set 2015 - 09h59
(atualizado às 10h25)
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Pedagogia Waldorf não aposta em pressão para que alunos tenham um bom desempenho no Enem
Pedagogia Waldorf não aposta em pressão para que alunos tenham um bom desempenho no Enem
Foto: iStock

Marina Silveira tem 18 anos, é aluna do 3º ano do Ensino Médio e pretende cursas Letras. Ela pega provas antigas para fazer em casa, estuda por conta própria e sabe o que esperar do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) por ter feito a avaliação no 2º ano. Mas Marina não é mais uma candidata que estuda 14 horas por dia ou chega a passar mal por causa da pressão colocada pela família e pelo colégio.

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A aluna estuda desde os 3 anos no Colégio Rudolf Steiner, que adota a pedagogia Waldorf como método de ensino. A diferença já começa na grade escolar. Nada de aulas de reforço de matemática ou física. A carga horária de artes é que chama a atenção. E Marina, assim como seus colegas de classe, não aceita que Q = M.C.T seja um mero Que MaCeTe. “Aqui nós aprendemos por que tem essa fórmula, de onde vem, onde aplicar essas fórmulas. A informação acaba se tornando instrução”.

“O que eu mais amo é que não me sinto condicionada a decorar o máximo de informação possível. Sinto-me encorajada a pensar, colocar os ensinamentos na prática. Não sou criada para pensar quadradinho, ser alienada”, completa.

A pedagogia Waldorf foi criada em 1919 pelo filósofo Rudolf Steiner e tem como base a Antroposofia, palavra grega que significa “sabedoria humana”. O método de ensino foca no desenvolvimento humano e intelectual do aluno. “Na realidade, a pedagogia Waldorf tem inúmeras vantagens. Ela me parece mais humanista do que outra coisa. Traz um enfoque maior no desenvolvimento do homem, sua capacitação. Na verdade, são aspectos que todas as escolas deveriam trabalhar”, explica a professora de metodologia de ensino da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) Regina Denigres.

Marina explica que o ensino em sua escola é muito livre, não há aulas específicas preparatórias para o vestibular.

“Na escola, os professores não voltam nas matérias especialmente para o vestibular, é muito livre”, afirma. Ela comenta que a escola não prioriza atividades específicas para provas externas em detrimento do conteúdo original das aulas e que a atitude de estudar precisa partir do aluno. “Eu sei o que quero fazer e sei onde tenho que me aprofundar para isso. Já peguei exercícios da Fuvest para fazer, mas não temos exercícios de vestibulares no meio das aulas. Se a gente pedir ao professor, ele traz, ajuda, mas vai de cada um... Alguns alunos fazem simulados fora também, de cursinhos.”

Porém, essa “falta” de atividades preparatórias não é uma desvantagem para os alunos, como explica Marcelo Rito, professor de história e coordenador do Ensino Médio no Colégio Rudolf Steiner.

“Aqui não temos atividades específicas para o vestibular, eventualmente temos simulados, mas isso precisa partir dos alunos, queremos que eles se mobilizem e organizem isso. Pois parte do diferencial da Waldorf é o aprendizado autônomo. Confiança e criatividade são palavras-chave na pedagogia Waldorf”, afirma.

O resultado desse processo de aprendizado é bem ilustrado quando Marina diz que “no final, é você e o mundo. A escola não vai te auxiliar para sempre.”

“O enfoque é que o aluno tenha confiança em si para obter o sucesso no Enem ou em outros vestibulares", afirma coordenador do Ensino Médio do Colégio Rudolf Steiner
“O enfoque é que o aluno tenha confiança em si para obter o sucesso no Enem ou em outros vestibulares", afirma coordenador do Ensino Médio do Colégio Rudolf Steiner
Foto: FuturaPress

O método é bem diferente do ensino tradicional e parece até surreal à primeira vista. O que pode ocasionar certo preconceito, como relata a estudante: “tem até um preconceito, as pessoas dizem que não fazemos nada, só pintamos, pois há uma carga horária grande de arte, mas não. Por exemplo, fiz o Enem no 2º ano e fui razoavelmente bem. Tirei 860 pontos na redação. Não é 100%, mas fui bem para quem não tinha aulas de redação específicas, que te ensinam só a fazer uma dissertação argumentativa para o vestibular”.

Segundo Rito, “o enfoque é que o aluno tenha confiança em si para obter o sucesso no Enem ou em outros vestibulares. E não por via da pressão.”

A diferença entre metodologias fica ainda mais clara quando um aluno que estudou em uma escola Waldorf desde o Jardim de Infância muda para um colégio tradicional, como no caso de Olivia Ignacio, de 18 anos, que quer estudar música.

A estudante frequentou por 15 anos um colégio Waldorf, mas precisou mudar porque ele ainda não tinha o Ensino Médio. Ao ir para uma escola tradicional, logo sentiu a diferença: “a pressão é maior, tanto que eles promovem vários simulados aos sábados para criarmos um hábito de estudo que possa no auxiliar no momento ideal”.

“Quando uma escola se preocupa demais com atividades externas, vestibulares, simulados, ela foca no que falta ao aluno, faz com que ele se preocupe demais no que não sabe. Aqui fazemos eles pensarem, terem autonomia para adquirirem conhecimento, pesquisarem, principalmente em casa”, explica Marcelo Rito.

A pressão por bons resultados no fim do Ensino Médio também preocupa Denigres. “Como educadora fico preocupada porque os pais, quando estão procurando por uma escola para os filhos, já perguntam no jardim de infância sobre Enem, vestibulares, questões que deveriam ser trabalhadas apenas lá na frente.”

Apesar das diferenças sentidas, Olivia ressalta que ter experiência com os dois métodos está sendo importante, pois os ensinamentos humanos e práticos se complementam.

“Foi e está sendo uma ótima experiência vivenciar uma outra forma de se aprender, mas creio que não é a melhor. Ao meu ver a Waldorf é uma escola que te ensina a viver de uma forma mais delicada, ensina a arte, no geral, ela dá valor para todas as áreas e o melhor é que você tem o prazer de ir à escola. Já no colégio tradicional em que estou, as coisas são bem mais secas, com objetivos mais aparentes e eles te ensinam a ter cada vez mais foco para saber lidar com o mundo competitivo”.

Apesar de ver vantagens na pedagogia Waldorf, a estudante aponta que seu colégio antigo não dava uma base forte em exatas, uma das áreas mais complicadas para diversos alunos no Enem.

“Considero que a principal desvantagem no caso são as matérias de exatas, que são de pesos maiores, e a parte da lógica. Elas não são muito trabalhadas na Waldorf, o que pode acarretar em grande dificuldades no futuro”.

A professora Denigres também pede atenção a outro lado da pedagogia. “A Waldorf, embora queira dar oportunidade para todos, é uma escola muito elitista. Não é aberta para a comunidade em geral. Acredito que eles poderiam auxiliar escolas públicas com seu know-how. Preparar professores também para atuarem em escolas que não adotam a pedagogia exclusivamente”.

Ela aponta que a pedagogia tem suas especificações que não conseguem ser aplicadas em qualquer escola tradicional, “mas há questões muito importantes, valores universais que eles enfatizam na pedagogia que poderia ser compartilhado” e assim, tornar-se mais democrática.

Vestibular? "Somos mais do que isso"

Escolas que adotam a pedagogia Waldorf vão totalmente na contramão ao não priorizarem provas como Enem e vestibulares no Ensino Médio. E a estudante Marina Silveira critica ferrenhamente o modelo de aprovação das universidades: “Eu, particularmente, não concordo com o vestibular. A gente não nasceu para ser uma máquina, somos mais do que isso. A prova só vê o que você decora, não sua inteligência, o que você realmente sabe.”

Para Marcelo Rito, o principal trunfo da pedagogia “é que o aluno aprende a aprender. Aprende a aprender por ele mesmo, ele aprende a ousar, criar hipóteses, colocar em movimento o que aprende. Esperamos que ele seja um desbravador, pense por si só, tenha autonomia.”

A liberdade para debates e discussões em sala é tão grande e rotineira, que Marina até conta um fato engraçado sobre quando prestou o Enem no ano passado.

“A única coisa é que como estou acostumada a questionar muito durante as aulas, sempre há muito debate, quando chega na prova (Enem), fico pensando nas alternativas, não vou direto na resposta, mas costumo pensar, refletir, penso em várias cosias que levaram a aquelas alternativas. Entendo porque não é essa e sim aquela alternativa. Não vou por eliminação. Eu penso para chegar em uma conclusão.”

De todos os medos que poderia afligir uma aluna no último ano do Ensino Médio, Marina só demonstrou um para a reportagem: “me dá medo de ir para o cursinho e ter que decorar um monte de coisa”.

Fonte: Terra
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