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O Tigre-de-dente-de-sabre e a educação do futuro

A educação, para ser eficaz, precisa acompanhar as necessidades humanas, sabendo que elas se transformam com o tempo.

3 abr 2017 - 11h51
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Nos tempos da caça e da coleta, os jovens membros do bando precisavam aprender com os mais experientes as habilidades de sobrevivência em um ambiente hostil. Diante da ameaça de um aterrorizante Tigre-de-dente-de-sabre, lições de análise sintática (serei objeto direto ou indireto?) ou de Física Clássica (quantos metros por segundo é necessário correr até a árvore mais próxima?) de nada serviriam ao novo caçador. Os melhores alunos aprendiam rapidamente a identificar os sinais de que, em determinada região, o gigantesco mamífero estava à espreita. Essa sim era uma aula de geografia com valor de vida ou morte.

Foto: DINO

E assim é que a educação, para ser eficaz, precisa acompanhar as necessidades humanas, sabendo que elas se transformam com o tempo. É bem verdade que nos primeiros milênios da história, as mudanças na hierarquia das necessidades foram lentas. Nietzsche comparava esses tempos primordiais a um camelo, que geme, suporta, mas permanece parado. Contudo, a modernidade veio com a ferocidade de um leão, que é muito mais ágil e começa a dizer não à pobreza, não à tirania, não às catástrofes, não à ignorância, não à corrupção.

Se colocarmos a tortuosa linha evolutiva da história humana ao lado da famosa "Pirâmide de Maslow", entenderemos que, as necessidades educacionais dos povos estão se tornando muito mais sofisticadas agora. Para o melhor entendimento da hipótese que lanço, gostaria de usar a hierarquia que o psicólogo humanista revisou antes de morrer, e que possui oito e não apenas os cinco níveis da pirâmide ensinada nos cursos de graduação.

De baixo para cima, a pirâmide possui quatro níveis de "Necessidades por Deficiência", que são: fisiológicas, segurança, pertencimento e estima, e mais quatro níveis de "Necessidades de Crescimento", que sobem nesta ordem: cognitivas, estéticas, de autorrealização e de transcendência. A dinâmica da pirâmide indica que à medida que vamos nos libertando do peso das necessidades por deficiência, sentimos maior disposição e interesse para resolver as necessidades de crescimento. Embora a realidade não seja tão linear quanto a teoria, as pesquisas mais recentes sobre o desenvolvimento cognitivo, conduzidas na Universidade de Harvard pelo renomado Dr. Howard Gardner, levaram a esta conclusão análoga: "a trajetória do desenvolvimento humano pode ser vista como o declínio contínuo do egocentrismo".

A maior parte dos modelos educacionais vigentes no mundo de hoje, inclusive no Ensino Superior, foi desenhada ao longo da Revolução Industrial, entre os finais do século XVIII até meados do século XX. Não havíamos ainda entrado na Era do Trabalhador do Conhecimento, ou a Era da Informação e da Tecnologia, que alguns autores situam a partir da década de 1960, tendo como marco simbólico a chegada do Homem à Lua.

Ora, esses modelos de educação legados pela Era Industrial, num ambiente de polarização política (esquerda x direita), podem ser classificados como instrumentais. Sua concepção teve como objetivo primário estimular e direcionar o indivíduo ao desenvolvimento de certas funções específicas que servem à grande máquina produtiva da sociedade, fosse ela capitalista ou comunista: aprender e especializar-se para servir ao sistema é a ideia que resume tais modelos.

Pouco espaço existe nesses modelos educacionais para se realizar o que chamaremos aqui de desenvolvimento integral do indivíduo. Carl Jung, um dos mais importantes pensadores do desenvolvimento humano, captura essa tendência opressora em sua obra icônica Tipos Psicológicos, publicada em 1921: "A psique coletiva odeia, de certa forma, qualquer desenvolvimento individual que não sirva diretamente aos fins da coletividade. Ainda que a diferenciação de uma função seja o desenvolvimento de um valor individual, ela é tão determinada pelo ângulo visual do coletivo que reverte em prejuízo do próprio indivíduo".

Jung veria hoje, se estivesse entre nós, que os ambientes organizacionais contemporâneos, por mais sofisticados, não são ainda desenhados para que o indivíduo possa ser ele mesmo para, a partir dessa originalidade, crescer no sentido de contribuir voluntariamente. As relações competitivas, egocêntricas por definição, fazem com que o trabalhador ainda no século XXI tenha de ter dois empregos: aquele para o qual foi contratado e um outro, no qual usa grande parte de sua energia, que é o de parecer ser aquilo que não é.

No mundo inteiro, acelera-se o despertamento da consciência, o aumento vertiginoso de autonomia pessoal, o acesso à informação, as trocas culturais em rede, as experiências empáticas, e principalmente as aspirações de uma vida regida por propósitos e sentido.

Arrisco-me a dizer que, nestes tempos de pós modernidade, ao menos 50% da humanidade já mergulhou na busca por aplacar as quatro necessidades superiores da pirâmide, já atravessou os portais das motivações meramente extrínsecas (as recompensas que vêm de fora) para compreender o valor transcendental de mover-se por razões intrínsecas: as aspirações de desenvolvimento integral.

O Tigre-de-dente-de-sabre que nos ameaça agora é muito mais complexo. Nossos alunos não poderão vencê-lo apenas evitando entrar nos seus temidos territórios. Sua ameaça é onipresente: ela começa em nosso próprio receio de avançar, de nos tornar tudo aquilo o que podemos nos tornar, começa em nossa hesitação de assumir nossa grandeza. Parece que nos contentamos com a posição de súditos hipnotizados por engenhosos brinquedos tecnológicos, quando podemos SER ilimitadamente mais.

Luciano Alves Meira, Diretor de Metodologia do IPOG e sócio fundador da Caminhos Vida Integral

DINO Este é um conteúdo comercial divulgado pela empresa Dino e não é de responsabilidade do Terra
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