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Visões sobre o impeachment: 'Provoca aumento de intolerância no país'

30 ago 2016 - 08h37
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Em reta final, desdobramentos do processo de impeachment para a democracia no país dividem pesquisadores
Em reta final, desdobramentos do processo de impeachment para a democracia no país dividem pesquisadores
Foto: Getty Images / BBC News Brasil

O impeachment da presidente Dilma Rousseff enfraquece ou fortalece a democracia brasileira? A BBC Brasil entrevistou três especialistas com visões diferentes sobre as consequências do processo, que entrou em sua reta final. Confira a opinião de Margarida Lacombe, professora de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

Especialista em Teoria do Direito, a professora Margarida Lacombe considera que a aprovação do impeachment significaria a perda da "boa política" e o aumento da "intolerância" no país.

Segundo Lacombe, é importante que o país tenha um período longo de estabilidade, com os presidentes eleitos cumprindo integralmente seus mandatos, "para que as pessoas saibam exercer a política".

"Romper esse processo é bastante prejudicial sob o ponto de vista pedagógico de exercício da democracia. Em vez de cortar (o mandato da Dilma), por que os descontentes, a oposição, não utilizam a via política para pressionar e compor com o Presidente da República, para alcançar o poder?", questiona.

Na sua visão, a oposição buscou "um atalho" para chegar à Presidência, o que gera descrédito nos partidos políticos e no sistema democrático.

"A tolerância é uma palavra chave quando falamos de democracia. A democracia pressupõe uma convivência com o diferente, com o plural. Se politicamente a gente não precisa disso, você pode ter uma elite que se identifique entre si e alcance o poder (sem eleição). Você não precisa mais compor com o outro", ressalta.

Para Lacombe, esse cenário está se refletindo "em outros espaços" da sociedade: "Se a intolerância é uma palavra de ordem, começa a ter também mais intolerância de raça, de gênero, de qualquer tipo de coisa. Porque (esse impeachment indica que) você não precisa respeitar o outro".

Especialista em teoria do direito afirma que oposição buscou "atalho" para a Presidência
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Foto: Arquivo pessoal / BBC News Brasil

'Afronta brutal'

Na visão da professora, a cassação do mandato de Dilma seria "uma afronta brutal a nossa democracia", porque representaria um desrespeito do direito ao voto.

"Depois de duas décadas de ditadura militar (1964-1985), de escolha indireta dos nossos representantes, nós conquistamos a possibilidade do voto direto, secreto, universal para a escolha do chefe do Poder Executivo Nacional. Foi uma conquista muito importante que se deu em termos relativamente recentes", observou.

Para Lacombe, mesmo que os senadores tenham sido eleitos para representar a população, eles não podem substituir o voto direto e destituir a presidente. Na sua leitura, o instrumento de impeachment - adotado no Brasil a partir do modelo americano - está sendo aplicado de maneira inadequada.

Ela diz que o processo de impeachment prevê que primeiro seja feita a avaliação jurídica sobre se há crime de responsabilidade. Caso haja crime, em seguida deve ser feita uma avaliação política sobre se a ilegalidade cometida é motivo suficiente para derrubar o governante eleito.

A especialista avalia que não há crime de responsabilidade e as supostas irregularidades fiscais estão sendo usadas como "pretexto" para um "golpe". Dessa forma, acredita, o uso indevido do impeachment enfraquece a democracia, criando um precedente que gera desconfiança sobre eleições futuras.

"Caso o impeachment vingue, a partir de agora, nas próximas eleições, não saberemos se o presidente ou a presidente que a gente escolher vai ficar no cargo", critica. "O modelo do presidencialismo não comporta essa utilização do impeachment. E isso, em termos de precedente, é uma brutalidade."

"Esse risco de utilização política (do impeachment) não acontece nos Estados Unidos porque lá o vice é do mesmo partido do presidente."

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