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Polícia

Procurador quer apurar morte de cinegrafista sem equipamento

Procurador dá como certo que Band seja ouvida sobre os procedimentos adotados para minimizar a exposição dos jornalistas

10 fev 2014 - 17h12
(atualizado às 17h16)
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O Ministério Público do Trabalho (MPT) planeja instaurar procedimento investigatório para apurar o caso do cinegrafista da TV Bandeirantes Santiago Ilídio Andrade, 49 anos. Atingido por um rojão durante uma manifestação popular contra o aumento das passagens de ônibus, na última quinta-feira, no Rio de Janeiro, o profissional teve morte cerebral diagnosticada nesta segunda-feira. Se instaurado, o procedimento pode levar à adoção de medidas para garantir a segurança dos jornalistas.

O procurador do Trabalho João Batista Berthier, coordenador do MPT no Rio de Janeiro, disse que ele mesmo vai apresentar a notícia de fato (investigação preliminar), que será distribuída, por sorteio, a outro procurador, que vai decidir se o Ministério Público do Trabalho deve investigar o caso e tomar as providências que julgar necessárias. Se a investigação for instaurada, o procurador dá como certo que a TV Bandeirantes seja ouvida sobre os procedimentos adotados para minimizar a exposição de seus profissionais aos riscos da cobertura de protestos e conflitos.

Jornalistas debatem o uso de colete à prova de bala no trabalho:

"Acho que não é um caso que deva ser arquivado, embora ainda seja cedo para falarmos em um processo. Na medida em que uma atividade envolve risco, ela implica, em tese, o uso obrigatório de equipamentos de proteção individual como coletes e capacetes. O que é preciso agora é avaliarmos o que aconteceu, que providências haviam sido tomadas (para evitar acidentes). Às vezes, o repórter dispõe de um capacete, mas não o usa. Ou não recebe um. Temos que ver", disse o procurador.

Berthier confirmou não haver nenhuma norma do Ministério do Trabalho e Emprego que trate da obrigatoriedade do fornecimento de equipamentos de proteção individual aos trabalhadores da imprensa, mas lembrou que o Artigo 7º da Constituição Federal estabelece o direito de todos os trabalhadores à redução dos riscos de acidentes do trabalho por meio do estabelecimento de normas de saúde, higiene e segurança.

"No jornalismo, a questão é como o Estado deve proteger os trabalhadores sem inibir a liberdade de imprensa. O jornalismo é uma atividade que, em muitas situações, implica algum risco aos profissionais, e não dá simplesmente para impedir os jornalistas de acompanhar ações e fatos em que haja esse risco. Só que o Estado tem o dever de tutelar o trabalhador, e é fundamental reduzir os riscos da profissão", disse o procurador.

"Essa é uma questão que deve ser discutida. As manifestações têm terminado de forma violenta e, por isso, acho que é hora de todos tomarem adotarem medidas preventivas. Acho que é preciso apostar no uso de equipamentos de proteção individual ao menor sinal de perigo, como, por exemplo, o arremesso de pedras", acrescentou o procurador. 

Coordenador de comunicação da ONG Conectas e responsável pelo curso sobre jornalismo em situações de conflito armado que o Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV) e a empresa de comunicação Oboré promovem desde 2001, João Paulo Charleaux destacou que a prática do jornalismo em situações como as manifestações registradas desde junho de 2013, em todo o País, envolve riscos que devem ser minimizados com o uso de equipamentos de proteção.

"Do ponto de vista jurídico, eu não conceituaria nenhuma dessas situações como um conflito armado, mas sim como situações de violência interna, de distúrbio e tensão. São situações em que temos visto vítimas - entre elas, jornalistas. Portanto, é preciso que esses profissionais, as redações e as empresas saibam que tais situações envolvem risco de morte, à integridade física, emocional e psicológico", destacou o jornalista, para quem a responsabilidade de uma empresa jornalística não é diferente da de uma do setor da construção civil.

"Os profissionais que trabalham em situações que envolvem risco devem ter equipamento de proteção individual e treinamento sobre o manejo do equipamento, sobre os riscos e sobre o que fazer quando o pior acontece. No Brasil, ainda não há essa cultura de preparar os profissionais para cobrir situações de violência e muito menos para a compra e uso de material de proteção individual", acrescentou Charleaux, lembrando que só recentemente os profissionais que cobrem ações policiais em comunidades do Rio de Janeiro começaram a usar capacetes coletes à prova de balas.

"Contraditoriamente, isso não é uma conquista, e sim um retrocesso do ponto de vista da segurança pública, pois significa que a situação está mais violenta. Ainda assim, é um avanço que os profissionais da comunicação estejam mais alertas e se protejam. Ainda assim, é assustadora a recorrência de situações em que profissionais de comunicação feridos (enquanto trabalhavam) não usavam equipamentos", concluiu Charleaux.

Atingido em protesto, cinegrafista tem morte cerebral

Santiago foi atingido na cabeça por um rojão durante a cobertura de um protesto contra o aumento do preço do ônibus no Centro do Rio de Janeiro, no dia 6 de fevereiro. Além dele, outras seis pessoas ficaram feridas na mesma manifestação. 

De acordo com a Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro, o cinegrafista chegou em coma ao hospital municipal Souza Aguiar. Ele sofreu afundamento do crânio, perdeu parte da orelha esquerda e passou por cirurgia no setor de neurologia. A morte encefálica foi informada pela Secretaria Municipal de Saúde (SMS) no início da tarde do dia 10 de fevereiro, após ser diagnosticada pela equipe de neurocirurgia do hospital, onde ficou internado no Centro de Terapia Intensiva desde a noite do dia 6.

O tatuador Fábio Raposo confessou à polícia ter participado da explosão do rojão que atingiu Santiago. Ele foi preso na manhã de domingo em cumprimento a um mandado de prisão temporária expedido pela Justiça. O delegado Maurício Luciano, titular da 17ª Delegacia de Polícia (São Cristóvão) e responsável pelas investigações, disse que Fábio já foi indiciado por tentativa de homicídio qualificado e crime de explosão e que a pena pode chegar a 35 anos de reclusão.

De acordo com o delegado, Fábio está colaborando com as investigações, mas ainda não é possível afirmar se ele entrará no programa de delação premiada. A defesa do rapaz e a polícia estão em negociação, para que o tatuador possa colaborar ainda mais com a investigação.

Fábio afirmou à polícia não saber o nome do segundo suspeito de participar da explosão que resultou na morte do cinegrafista. Segundo o advogado do jovem, Jonas Tadeu, seu cliente realmente não sabe o nome do homem apontado como o principal suspeito de ter acionado o explosivo que atingiu Santiago. Eles seriam apenas conhecidos de manifestações anteriores, já que Fábio era assíduo frequentador de protestos populares no Rio.

Agência Brasil Agência Brasil
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