A seguir, leia um balanço do Brasil e dos brasileiros durante os 21 anos da ditadura nas áreas da Economia, Direitos Humanos, Política e Imprensa. E decida sobre os feitos e eventos do período e sobre a interpretação de 1964: golpe ou intervenção? TÍTULO DO INFO: GOLPE OU INTERVENÇÃO Ditadura brasileira: retrocesso ou desenvolvimento? A ditadura iniciada em 1964 e encerrada em 1985 não representa apenas 21 anos de estado de exceção e suspensão dos direitos da população. O regime militar brasileiro, cujos efeitos ecoam até hoje, é também a deturpação do lento e tortuoso processo democrático iniciado após a Era Vagas (1930-1945) e interrompido com o avanço das tropas ao Rio de Janeiro e a fuga de João Goulart. O saldo dos anos de chumbo se obtém da equação entre o que se ganhou e o que se perdeu às custas de um golpe que inicialmente propunha a “liberdade” para depois usurpar direitos básicos da sociedade. Mas o golpe contra o governo de João Goulart foi e ainda hoje é visto por parcela da população como um movimento legítimo que impediu a instauração de uma ditadura comunista e garantiu grande crescimento econômico ao País. A seguir, leia um balanço do Brasil e dos brasileiros durante os 21 anos da ditadura nas áreas da Economia, Direitos Humanos, Política e Imprensa. E decida sobre os feitos e eventos do período e sobre a interpretação de 1964: golpe ou intervenção? Imagem: noitedosgenerais Crédito: Evandro Teixeira ECONOMIA Milagre X dívidas e inflação O desenvolvimento econômico é frequentemente citado como um dos principais saldos positivos da ditadura militar. Entre 1968 e 1973, o Brasil cresceu anualmente a uma taxa que variou entre 7 e 13%. Trata-se de um número hoje similar ao crescimento da China, outro país que vive um regime ditatorial, e muito louvado pelo sua pujante expansão econômica. Ao mesmo tempo, esse tipo de crescimento só foi possível devido ao alto grau de centralização das decisões econômicas do governo e ao abandono de investimentos com medidas sociais em prol da redução da desigualdade. Foi justamente esse eixo abandonado da economia e defendido pelo governo trabalhista de João Goulart que fundamentou as reformas dos militares. “O problema era a própria concorrência democrática. Havia uma legitimação técnica de um processo, ainda que autoritário, de contenção e controle dos conflitos sociais e políticos, com o argumento de que isso era fundamental para enfrentar os problemas econômicos”, afirma o professor de Economia da Unicamp Pedro Paulo Zahluth Bastos. Assim, o principal eixo do chamado “milagre econômico” se deu no investimento em infraestrutura sobretudo nos campos de transporte e energia. A hidrelétrica de Itaipu, construída entre 1975 e 1982 e umas das maiores usinas do mundo, é um dos grandes marcos do regime. A Rodovia Transamazônica (1969-1974), atualmente a terceira maior do País, também está entre os grandes investimentos do período, aos quais se somam as construções da Ponte Rio-Niterói e o Aeroporto do Galeão. Mas a robustez do Milagre - que, com o tri campeonato mundial da Seleção Brasileira de futebol, ajudou a formar uma nova identidade nacional - foi forjada às custas do endividamento externo e da falta de investimentos sociais na educação em meio a um cenário de supressão dos direitos civis. “O milagre econômico é inexoravelmente, umbilicalmente ligado com a ampliação da desigualdade de renda. Muitos dos sucessos do milagre está associado à redução dos salários de base e à contenção do gasto público para diferentes formas de gasto social e a reorientação do gasto público para investimentos particularmente em novas áreas residenciais financiadas para a construção civil por meio de uma mudança dos critérios de demissão”, resume o professor. Milagre à parte, a desigualdade do país cresceu durante os 21 anos de uma ditadura cujas medidas ainda hoje repercutem na economia e na cidade brasileira. “O legado da ditadura é terrível. Uma inflação altíssima, uma dívida externa impagável, uma dúvida interna crescente, um desemprego generalizado, uma perda de perspectiva e esperança com o futuro do País e um Estado absolutamente quebrado, com empresas estatais, que eram fundamentais para o tipo de modelo, inteiramente quebradas”, defende Paulo. VOTE Na sua opinião, as medidas dos militares... • garantiram ao Brasil anos de grande crescimento, fortaleceram a nação e impediram que reformas socialistas abalassem a economia nacional. • impediram fundamentais reformas de base na economia e na sociedade brasileira, além de herdar à democracia futura uma enorme dívida. Imagem: Itaipu-Binacional Crédito: divulgação DIREITOS CIVIS Direitos e liberdade X guerra contra comunismo O golpe de 1964 foi executado pelos militares e defendido por parcelas da população em nome da defesa da liberdade da nação perante aquilo que consideravam ser a ameaça totalitária do comunismo. No entanto, em pouco tempo a intervenção militar se mostrou ser a porta para um regime de exceção e virtual anulação de todos os direitos civis básicos. O primeiro movimento foi disparado pelo presidente Castello Branco ainda no primeiro ano de governo. A um só tempo, o general eliminou a pluralidade orgânica da livre agremiação política ao instituir o bipartidarismo e determinou eleições indiretas para presidente da república. Em 1968, o presidente Costa e Silva baixou o Ato Institucional nº 5, um dos maiores marcos do período. O AI-5, fruto do ápice da repressão e da censura do período da ditadura e que só sairia de cena em 1978, representou a virtual eliminação da liberdade de expressão, tanto por parte da imprensa como por parte da população civil. Para a professora de História pela Universidade Federal Fluminense Angela de Castro Gomes, o período de 64 representa um retrocesso ao lento avanço democrático traçado pelo Brasil desde 1945. “(O ano de) 1964 realmente foi um momento que trouxe modernização para o país, mas prestou um desserviço total e radical às nossas conquistas democráticas” Ao mesmo tempo, o golpe pode ter representado ao Brasil - país de forte tradição de reformas capitaneadas pela elite política - a chance do despertar da consciência cívica. A falta dos direitos civis, e a falência dos direitos humanos, pode ser visto como o início de uma nova consciência nacional. “O período de 1964 a 1985 é o período que traz para o Brasil, para cultura brasileira, de forma bem efetiva, o tema dos direitos humanos”, afirma o professor de Sociologia da Universidade do Vale do Rio dos Sinos Solon Eduardo Annes Viola. “Quando o movimento de 64 chama a questão da liberdade, a liberdade não se efetiva, e a sociedade brasileira logo vai descobrir que há uma sonegação da liberdade. As liberdades civis e os direitos políticos desaparecem da sociedade brasileira. E a sociedade brasileira vai reagir a isso.” Por outro lado, a repressão podia ser vista por parcela da população como uma medida necessária para conter aquilo que consideravam ser o perigo do extremismo da esquerda. “Foi somente em 1969 que as autoridades brasileiras decidiram dar uma resposta enérgica e profissional à luta terrorista, criando os órgãos de segurança que viriam, nos anos seguintes, dar um fim às ações armadas”, defende o grupo Terrorismo Nunca Mais (https://ternuma.com.br/index.php/quem-somos), que contabiliza 120 mortes causadas pelas guerrilhas esquerdistas. VOTE Na sua opinião, os militares... • acertaram ao suprimir os direitos civis e humanos em nome do enfrentamento da ameaça de grupos comunistas. • reverteram avanços democráticos obtidos desde 1945 e, de forma ditatorial, cometeram crimes contra a própria população. Imagem: greveartistascontracensura1968 Crédito: Evandro Teixeira POLÍTICA Bipartidarismo X pluripartidarismo Sob a bandeira da ameaça comunista e em nome da liberdade e da segurança nacional, o presidente Castello Branco baixou em 1965 o segundo Ato Institucional (AI-2), que reduzia o crescente espectro pluripartidário desenvolvido após a Era Vargas (1930-1945) em dois partidos. Assim, UDN, PSD, PTB, PSB, PSP e outras siglas que começavam a criar a cultura partidária brasileira se viram forçado a optar entre Movimento Democrático Brasileiro (MDB), de oposição, e a Aliança Renovadora Nacional (Arena), dos militares governistas. O AI2 também instituiu eleição indireta para a presidência, passando a escolha do chefe do Executivo da população civil para o Congresso. Isso implicava, na prática, o controle dos militares sobre os eleitos, uma vez que as casas legislativas eram dominadas pelos aliados do regime. “A gente não pode dimensionar o que a gente perdeu se a gente não souber o que a gente estava ganhando em termos de avanços”, diz a professora de História da Universidade Federal Fluminense Angela de Castro Gomes sobre os anos anteriores ao golpe, no qual o Brasil iniciava a cultivar uma tradição de organização e racionalidade política. “A democracia é difícil. Mas a gente sempre deve lembrar que, se não é fácil com ela, é certamente muito pior sem ela. Cinquenta anos do golpe é um bom momento para a gente não esquecer se disso”, lembra a professora. O bipartidarismo foi extinto em 1979, período em que o regime gradualmente começava a reabrir as portas à democracia. Aos poucos os partidos começaram a retornar à política nacional. Em 1985, os partidos socialista e comunista, que representavam o grande alvo dos golpistas de 1964, voltaram à ativa. Hoje, o Brasil apresenta um dos maiores quadros partidários do mundo, com mais de 30 partidos regularizados junto ao Tribunal Superior Eleitoral. Trata-se de uma situação elogiada pela pluralidade politico-democrática, mas também criticada pelo excesso de siglas e seu peso nas alianças com os governos eleitos. VOTE Na sua opinião, os militares... • estabeleceram o bipartidarismo por ser mais eficaz na distinção das ideologias e evitar a proliferação de partidos. Além disso, a eleição indireta qualifica a escolha do presidente. • minaram os desenvolvimento democrático da política brasileira ao forçar um sistema bipartidário e instituir eleição indireta para a presidência. Imagem: voto_anistia_rep Crédito: reprodução IMPRENSA Imprensa livre X Controle da imprensa O golpe militar foi referendado pela maioria dos jornais brasileiros. “Desde ontem se instalou no País a verdadeira legalidade”, afirmava o editorial do Jornal do Brasil, no Rio de Janeiro, na edição do dia 1º de abril de 1964. “A legalidade está conosco e não com o caudilho aliado dos comunistas”, completava, sobre a suposta ameaça totalitária do governo João Goulart. A postura de tolerância e aplauso ao golpe militar mudaria gradualmente, à medida que o governo permanecia no poder e caminhava contra a promessa da liberdade. O ápice da censura à imprensa se deu com o Ato Institucional 5 (AI5), que virtualmente suprimiu a liberdade de expressão. “Foi uma característica da imprensa brasileira. Ela ainda é uma imprensa muito atrasada e ligada a determinados setores, digamos, oligárquicos”, avalia o professor de Jornalismo Pedro Osório. “Em 1964, ela expressou seu compromisso com determinados setores que estavam inquietos com as reformas de base que o governo estava encaminhando.” Símbolo da censura e da violência dos militares contra a imprensa foi o jornalista Vladimir Herzog, morto em 1975. Em meio à censura e ao alinhamento aos militares, entretanto, gestou-se lentamente uma imprensa alternativa, de resistência ao governo militar e de subversão à ordem vigente. Foi quando floresceram marcos do jornalismo brasileiro, como o Pasquim, Opinião, Movimento, Versus e Coojornal. Estima-se que mais de 150 periódicos tenham sido criados para dar vozes e contar histórias dos arcabouços da vida sob a égide ditatorial. Afora a forte censura da imprensa escrita, o período militar representa, do ponto de vista técnico, uma expansão das telecomunicações através do sistema da Telebrás, criada em 1965. O sistema tratou de unificar e disseminar o sistema de rádio e televisão pelo País, processo do qual a Rede Globo foi uma das grandes beneficiárias. Nos primeiros anos da redemocratização, o governo do presidente José Sarney distribuiu mais de 500 concessões de canais em um dos marcos da ligação entre o oligopólio da mídia e o poder político no Brasil. “Nisso o Brasil não avançou. Não há uma política pública de comunicação. As coisas melhoraram bastante, mas ainda é absolutamente descricionária. A sociedade não consegue intervir nesta questão”, resume o professor Pedro Osório. VOTE Na sua opinião, os militares... • foram prudentes e a imprensa reagiu naturalmente a isso. Além disso, a difusão de rádio e televisão ajudou a democratizar as comunicações. • minaram a democracia ao restringir o direito fundamental da liberdade de expressão. Imagem: passeata100mil1968_1 Crédito: Evandro Teixeira GOLPE OU REVOLUÇÃO? A denominação do movimento desencadeado no dia 31 de março de 1964 sempre motivo de debate no País. Foi uma revolução ou um golpe. Qual sua opinião? 1964 FOI UMA REVOLUÇÃO • Com firmeza e decisão, os militares tomaram o poder em nome de reformas importantes para o Brasil. Eles impediram a instauração de um governo comunista, preservaram a liberdade e possibilitaram um período de forte crescimento da economia da nação. 1964 FOI UM GOLPE • Sob o pretexto da ameaça da instauração de um governo comunista totalitário, os militares depuseram um governo democraticamente eleito e protagonizaram 21 anos de poder centralizado, supressão dos direitos civis e crimes contra a população civil. mais especiais de notícias