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Lava Jato

Em quase dois anos, governo federal puniu 5 empresas com lei anticorrupção; nenhuma delas é alvo da Lava Jato

7 dez 2016 - 07h38
(atualizado às 08h41)
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Infraero é a única agência do governo federal que já investigou e puniu empresas com base na lei anticorrupção
Infraero é a única agência do governo federal que já investigou e puniu empresas com base na lei anticorrupção
Foto: Getty Images

A Lei Anticorrupção, que permite a governos investigar e punir administrativamente empresas envolvidas em casos de corrupção, já foi aplicada para sancionar oito companhias desde janeiro de 2014, quando entrou em vigor.

Nenhuma das penalizadas com processos administrativos até o momento é alvo da Operação Lava Jato. Cinco empresas foram punidas pela Infraero, única agência do governo federal que já aplicou a lei na esfera nacional.

A legislação dá autonomia a diferentes agências de União, estados e municípios para abrir processos administrativos contra empresas acusadas de corromper seus funcionários públicos, fraudar concorrências e obstrução de investigações.

Ela prevê sanções administrativas apenas contra pessoas jurídicas - como multa e inclusão e um cadastro único de punidos por atos lesivos à administração pública.

As punições administrativas não estão atreladas a nenhuma decisão do Judiciário. Mas a lei também prevê procedimentos na esfera judicial, como, por exemplo, suspenção ou interdição das atividades de uma empresa e proibição de receber qualquer tipo de incentivo ou subsídio de órgãos públicos.

Além de cinco empresas punidas pela Infraero, outras três foram alvo de processos administrativos abertos por governos estaduais, conforme consta no Cadastro Nacional de Empresas Punidas, mantido pelo Ministério da Fiscalização, Trânsparência e Controladoria-Geral da União (a antiga CGU) e aberto para consulta na internet.

Duas companhias foram penalizadas administrativamente pelo governo do Espírito Santo, que afirma ser o primeiro a aplicar no Brasil uma multa com base na nova legislação. O governo do Maranhão também já aplicou punição contra uma empresa.

A CGU explica que o cadastro "é somente um instrumento de divulgação" das empresas punidas, alimentado com dados de órgãos do Executivo que já aplicaram algum tipo de sanção.

Esclarece ainda que há empresas investigadas pela Lava Jato que também são alvos de processo administrativo dentro da CGU. Contudo, elas só podem ser penalizadas pela lei anticorrupção se ficar comprovado que cometeram alguma ilegalidade depois de 29 janeiro de 2014, data em que a legislação entrou em vigor.

Já houve, contudo, punição, mas não pela lei anticorrupção. "As sanções aplicadas por este Ministério às empresas envolvidas no Lava Jato, tais como a Mendes Junior e a Skaska, não tiveram como fundamento a Lei nº 12.846/13, e sim normas de licitações e contratos", informou a CGU.

No rastro dos protestos

A proposta, que se colocou como uma alternativa para punir pessoas jurídicas sem a necessidade de haver um processo judicial, foi encaminhada pelo Executivo em fevereiro de 2010, depois de muita pressão de órgãos internacionais para que o Brasil tivesse uma legislação compatível com as de países como os EUA.

A lei anticorrupção foi aprovada pelo Congresso e sancionada pela então presidente Dilma Rousseff em 2013, quando o Brasil assistia aos protestos em massa em diferentes cidades.

No entanto, a legislação só foi regulamentada pela presidente Dilma em março de 2015, depois de uma nova onda de protestos.

Lei anticorrupção foi aprovada e sancionada em 2013, durante a onda de protestos que tomou conta do país
Lei anticorrupção foi aprovada e sancionada em 2013, durante a onda de protestos que tomou conta do país
Foto: Getty Images

Ainda assim, antes mesmo de ser aplicada, a lei sofreu tentativas de mudanças para, por exemplo, incluir o Tribunal de Contas das União e o Ministério Público Federal como partes ativas de acordos de leniência.

O texto em vigor permite que órgãos do Executivo assinem acordos de leniência para que empresas colaborem com as investigações na tentativa de reduzir o peso das sanções.

Recentemente, contudo, o acordo firmado pela holandesa SBM Offshore com a CGU, Advocacia-Geral da União e a Petrobras, por crimes cometidos pela empresa no Brasil entre 1996 e 2012 e que previa pagamento de R$ 1 bilhão em multa para a estatal, não foi homologado pela 5ª Câmara de Coordenação e Revisão do MPF.

As negociações, por ora, estão em suspenso diante do impasse. E, por isso, até agora, somente a Infraero, na esfera federal, já puniu empresas com base na lei anticorrupção.

A Infraero já finalizou um processo, no qual puniu cinco empresas do ramo de alimentação com sede em Curitiba e em Recife por fraude em licitação. Segundo a assessoria de imprensa do órgão, há outros dois processos em andamento.

"Nenhuma das empresas solicitou acordo de leniência até o presente momento", esclarece a Infraero, que diz ter arrecadado multas de R$ 120 mil.

"Vontade política"

A multa aplicada pelo governo federal parece pequena se comparada com o que arrecadou o governo do Espírito Santo com base na legislação. Pelo texto, a multa varia de 0,1% a 20% do faturamento bruto da empresa, no ano anterior à instauração do processo.

Os cinco processos já concluídos renderam ao Estado quase R$ 1 milhão. Há ainda outros 20 procedimentos em andamento.

"É possível tirar a lei do papel, o Espírito Santo é um exemplo disso. O primeiro passo é ter vontade política", afirma Eugênio Ricas, secretário estadual de controle e transparência.

Eugênio Ricas, secretário de controle e transparência do Espírito Santo, já conseguiu arrecadar quase R$ 1 milhão em multas aplicando a nova lei anti-corrupção
Eugênio Ricas, secretário de controle e transparência do Espírito Santo, já conseguiu arrecadar quase R$ 1 milhão em multas aplicando a nova lei anti-corrupção
Foto: Romero Mendonça/Secom-ES / BBC News Brasil

Ricas observa que, além de prazo de 180 dias para concluir processos, a lei prevê responsabilidade objetiva, o que significa não ser necessário comprovar culpa do dono ou responsável pela empresa.

A maior multa aplicada pelo Espírito Santo refere-se a um caso de tentativa de suborno, no qual Ricas foi protagonista.

"À época, eu era secretário de Justiça e um empresário dono de uma empresa de monitoramento em vídeo me prometeu uma comissão para que fosse feito um adendo no contrato", conta o secretário, que filmou o encontro e deu voz de prisão ao empresário.

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