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América Latina

'Boom' de heroína aumenta violência nas montanhas do México

20 ago 2013 - 07h58
(atualizado às 08h56)
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Nos últimos dias, uma pergunta tem sido recorrente nos escritórios dos órgãos de segurança e da imprensa do México: por que a violência aumentou nas zonas montanhosas de Estados como Sinaloa, Michoacán e Guerrero? Entre as respostas apareceu uma palavra: heroína.

Nessas regiões está a maioria das zonas de produção de papoula, de cujo bulbo se extrai a pasta com que se elabora essa droga - e também outras como o ópio e a morfina. Além disso, nessas regiões fica a maior parte dos laboratórios que a processam, assim como o início das rotas que a transportam para o mercado americano - tanto por estradas como por via aérea.

Especialistas advertem que ao menos três cartéis pretendem controlar essa região. Porém, atualmente a balança se inclina a favor da organização de Sinaloa, encabeçada entre outros por Joaquín Guzmán Loera, o Chapo.

Esse interesse parece coincidir com um dado que o escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime repete há vários anos: o México ocupa um lugar cada vez mais importante no tráfico internacional de heroína. Assim, o relatório anual de 2013 do órgão indica que a produção mexicana desse entorpecente seja 30 vezes maior que a da Colômbia, que durante décadas se manteve como o principal exportador do continente americano.

Um dado que surpreendeu a muitos, mas que é parte da realidade do país, segundo disse à BBC Mundo o especialista Alberto islas, diretor da consultoria de segurança Risk-Evaluation. "O México sempre foi um produtor importante de heroína. A ONU se deu conta disso mas com dados velhos, porque não há no país um relatório governamental que diga quanto da papoula foi plantada e quantas plantações foram erradicadas", disse.

Isso quer dizer que a produção de "heroína café" (como a droga é chamada no linguajar dos cartéis e consumidores) pode ser ainda maior que a estimada pela ONU.

Hitler, Coreia e Vietnan

A relação entre os mexicanos e a pasta de papoula é antiga, pois os primeiros registros do cultivo da substância nas montanhas de Sinaloa, no noreoeste do país, corresponde aos fins do século XIX. Especilistas como Luis Astorga, pesquisador da Universidade Nacional Autônoma do México, creditam a imigrantes chineses a entrada do entorpecente no país. 

Naqueles dias a produção era escassa, quase para consumo pessoal. A situação mudou durante a Segunda Guerra, quando o governo dos Estados Unidos fomentou o cultivo da planta no México - pois seus fornecedores asiáticos haviam interrompido as remessas. A pasta de papoula era fundamental para as tropas americanas, pois era utilizada para elaborar a morfina para os feridos em combate. Essa situação se manteve durante a guerra da Coreia e na primeira etapa do conflito do Vietnã.

Dessa forma, a papoula desbancou outros produtos como a maçã, o milho e o tomate, especialmente na região conhecida como o "Triângulo Dourado", uma zona montanhosa que se espalha pelos Estados de Sinaloa, Durango e Chihuahua. Ali nasceu a maioria dos chefes de alguns cartéis do narcotráfico, como Chapo Guzmán; Ismael Zambada García, o Mayo; os irmãos Beltrán Leyva; Rafael Caro Quintero; Ernesto Fonseca Aguilar; ou Miguel Ángel Félix Gallardo, o Chefe dos chefes.

Nixon

A situação mudou quando o governo do presidente Richard Nixon mudou a política estadunidense sobre as drogas e iniciou uma perseguição contra os produtores que enviavam maconha e heroína para os Estados Unidos. A papoula virtualmente desapareceu da vista dos mexicanos, segundo os especialistas.

No México, a decisão se traduziu em uma série de operações militares nas regiões montanhosas de Sinaloa e Guerrero, que se intensificaram a partir de 1977, quando teve início a Operação Condor. Antes dessas operações, a flor da papoula adornava jardins públicos em lugares como a Cidade do México, Oaxaca ou Guadalajara, e era comum encontrá-la à venda nos mercados.

Depois, a presença da planta se limitou às montanhas vigiadas pelos cartéis do narcotráfico. Mas até agora as operações do governo mexicano não têm conseguido reduzir a área plantada da flor, segundo analistas e estimativas oficiais. Por exemplo, o relatório "Combate ao Narcotráfico", da Secretaria de Defesa Nacional, assinala que em 2007 os militares destruíram 11.393 hectares de plantações. Cinco anos depois, em 2012, foram 14.347 hectares.

Por que?

As estatísticas da Secretaria revelam um aumento na zona de cultivo de papoula, afirma o analista Islas. "A produção cresce em Nayarit, Durango, Colima e Guerrero".

Por que? Há vários fatores. O relatório da ONU diz que a Colômbia reduziu as plantações de papoula, mas ao mesmo tempo o cultivo aumentou no México, onde há 12 mil hectares "com um correspondente potencial maior de produção de heroína", segundo o documento. A maior parte do território se encontra na zona controlada pelo Cartel de Sinaloa, segundo estatísticas da Comissão Nacional de Segurança Pública.

Mas o aumento da produção de heroína pode desatar uma nova disputa entre cartéis, disse à BBC Mundo Guilhermo Garduño Valero, pesquisador da Universidade Autônoma Metropolitana. "A guerra continuará, agora as máfias não vão se enfrentar apenas pelos mercados de cocaína e de maconha", disse.

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