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Oriente Médio

Futuro da Síria é "incerto e pessimista", dizem analistas

14 ago 2012 - 10h27
(atualizado às 10h29)
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Tariq Saleh
Direto de Beirute

Com a guerra civil na Síria cada vez mais violenta, o futuro do país, segundo analistas ouvidos pelo Terra, não é promissor e pode levar a Síria a um segundo conflito entre diferentes facções políticas.

Imagem mostra integrante do Exército Livre da Síria em ação durante batalha na vila de Mukhtariya, em Homs
Imagem mostra integrante do Exército Livre da Síria em ação durante batalha na vila de Mukhtariya, em Homs
Foto: AP

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Para eles, um possível colapso do governo e a saída de Assad deixariam a Síria com "um vácuo de poder, sem líderes políticos capazes de unificar os diferentes grupos de oposição, atualmente muito divididos". Além disso, o risco do país entrar em uma guerra armada entre diferentes facções depois da saída de Assad é real e já preocupa, segundo eles, os governos árabes e ocidentais.

"Hoje, a Síria é uma incógnita. O futuro do país é incerto e pessimista", salientou o analista Oussama Safa, diretor do Centro Libanês para Estudos Políticos em Beirute. O conflito na Síria já dura 17 meses, e passou de protestos pacíficos para confrontos armados entre tropas leais ao governo e militantes rebeldes, formado por desertores do exército nacional e civis.

Grandes cidades como Homs, Hama, Deera, Idlib e Deir al-Zor sofreram com cercos das forças de segurança e do Exército do governo, com bombardeios que deixaram muitas vítimas. Recentemente, as duas maiores cidades, a capital Damasco e Aleppo, o centro comercial da Síria, também passaram a ser palcos de intensos combates entre os dois lados. A capital chegou a ter alguns bairros ocupados por rebeldes, depois expulsos pelas tropas governamentais. Já Aleppo sofre bombardeios pesados do Exército nacional que tenta expulsar os rebeldes, em poder de cerca de 50% da cidade.

Segundo analistas e comentaristas políticos, os governos estrangeiros já mostram preocupação com a Síria pós-Assad, vendo poucas chances de um processo de transição pacífico no país, e tentando, ao menos, minimizar os efeitos colaterais de um colapso do regime sírio. "Com armas químicas do governo podendo cair em mãos erradas, oposição dividida, rebeldes compostos por seculares mas também por islamistas radicais, os governos ocidentais se mostram cautelosos em seu apoio aos opositores", disse outro analista, o egípcio Hani Raslan, do Centro Al-Ahram de Estudos Políticos e Estratégicos do Cairo.

Complexidade

Segundo as Nações Unidas, o conflito na Síria já deixou mais de 15 mil mortos (ativistas sírios falam em 20 mil). O levante popular iniciou em março de 2011, protestos exigiram democracia e a renúncia do presidente Assad, que há 10 anos comanda o país - posto herdado de seu pai, Hafez al-Assad, que por 30 anos governou a Síria.

O governo sírio respondeu com repressão e justificava suas ações dizendo que combatia "gangues armadas e terroristas" apoiados por governos estrangeiros. O uso da força pelo governo levou à criação de uma frente militar rebelde para derrubar o regime sírio, fazendo a crise síria tornar-se uma ampla guerra civil.

De acordo com o libanês Oussam Safa, o atual momento da Síria indica que o caos deverá emergir após uma eventual saída de Assad do poder pelo fato de os rebeldes já são compostos por diferentes grupos que não mostram sinais de afinidade ideológica. "Entre os rebeldes há militares, seculares, liberais, islamistas conservadores, jihadistas e até alguns membros da Al-Qaeda. Podem haver surpresas e uma transição pacífica. Mas em tese, não há como eles se unirem num cenário pós-Assad", disse.

Para Safa, há o sério risco da Síria mergulhar em mais uma guerra civil no futuro, com diferentes facções disputando o poder. "Seria uma batalha entre seculares e islamistas, militares e jihadistas, liberais e conservadores. Sem contar o componente sectário, sempre perigoso, onde há uma maioria sunitas e minorias de curdos, alauítas e cristãos".

Ele exemplifica os crimes que vêm sendo comitidos pelos dois lados no atual conflito sírio. "Embora o governo tenha comitido muito mais cirmes, até pelo seu poder bélico ser maior, os rebeldes também fizeram atrocidades e execuções sumárias que já levantaram a preocupação de entidades de direitos humanos internacionais como a Anistia Internacional", falou Safa ao Terra.

Isso mostra, segundo ele, que os rebeldes não estão sob um controle central e que após uma saída de Assad do poder, a tendência é que haja uma desintegração das forças opositoras em pequenos grupos, cada qual lutando pelos seus interesses. "O mesmo ocorreu na Líbia, onde até hoje as milícias são um desafio ao governo líbio. Mas lá, a população é mais ou menos homogênea, não há cristãos, somente sunitas, com brigas tribais. A Síria é mais complexa pela diversividade de etnias e religiões e seus interesses".

Oposição dividida

O colunista político Abdel-Moneim Said, da prestigiada revista semanal egípcia Al Ahram, escreveu recentemente que a Síria, por estar situada em uma região instável, será mais complicada para os governos ocidentais do que foi a Líbia. "A Líbia está isolada no norte do África em uma região relativamente calma, enquanto que a Síria está situada no mmeio de uma região de instabilidade étnica, religiosa, política e militar. Os problemas são muito maiores, como os Estados Unidos, Rússia, Irã, Turquia e Árabia Saudita lutando por influência", escreveu ele.

Em seu artigo, ele também fala que "diferentemente de Tunísia e Egito, onde as revoluções terminaram de forma rápida, Líbia e Síria fazem parte de uma outra categoria, mais violenta, onde geralmente o exército, sociedade e instituições se fragmentam". Said também salienta que já seria a hora da Liga Árabe considerar um plano de envio de tropas de paz para a Síria, após um eventual colapso do governo, um consequente vácuo de poder e em face da clara divisão entre as forças políticas de oposição.

"Líderes do Conselho Nacional Sírio (da oposição) falam de que a lei prevalecerá, que todas as minorias serão incluidas no processo democrático, e a justiça e troca de autoridade será pacífica. É claro que todos desejamos isso para o país, mas os grupos de oposição são muito divididos, e não há um figura forte para ser líder de transição". "A Liga Árabe deveria considerar uma presença política em Damasco, e até uma presença militar se necessária, para garantir a transferência pacífica de autoridade", completou ele e seu artigo.

O ministro de Relações Exteriores da França, Laurent Fabius, pediu há alguns dias que a oposição síria se organizasse para assumir o poder no país e que "a hora já havia chegado para uma fase de transição". O ministro também declarou que esperava que um governo interino fosse formado o mais rápido possível e que incluisse todos os setores da sociedade síria.

No entanto, o analista Hani Raslan falou que a realidade é bem diferente. "Não há um único líder sírio de oposição capaz de unir a sociedade. E os opositores do regime no exterior são vistos com desconfiança pelos sírios por serem um incógnita e por terem estado muito tempo em contato com governos estrangeiros". Para Raslan, os governos ocidentais já preparam a transição na Síria, mas têm dúvidas sobre as forças políticas fora e dentro do país. "Eles não parecem ter uma ideia muito clara de quem apoiar neste momento".

Para ele, haverá uma guerra ideológica entre conservadores e liberais, além de seculares e islamistas para a formação de um governo interino. "O perigo de um novo conflito armado pós-Assad na Síria passa diretamente pelas desavenças ideológicas entre os grupos de oposição e a falta de consenso de nomes para um governo interino", falou Raslan ao Terra. Alguns membros da oposição acham que um governo de transição não deveria durar muito tempo. Em entrevista à revista Al Ahram, Haitham Manaa, diretor do Comitê de Coordenação das Forças de Mudança Democrática, um grupo de oposição, disse que um governo interino deveria "organizar eleições o quanto antes para solidificar e estabelecer um Estado democrático".

Ele também disse que se Assad renunciasse ou fosse removido do poder todas as figuras do regimes deveriam ser removidas e não participar de um govenro interino. "A oposição deve rejeitar qualquer acordo com pessoas ligadas ao regime, mesmo que elas tenham um nome de consenso entre a população", disse ele.

Fonte: Especial para Terra
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