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Oriente Médio

Analistas: aplicar reformas e manter regime desafia a Síria

9 abr 2011 - 08h22
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Tariq Saleh
Direto de Beirute

A onda de protestos e revoluções que sacode o mundo árabe desde o mês de dezembro chegou à Síria, que nas últimas semanas enfrenta manifestações pró-democracia em diversas cidades do país. O governo sírio vem reprimindo com força os levantes populares. Para tentar evitar o mesmo destino de Hosni Mubarak, no Egito, e Zine El Abidine Ben Ali, na Tunísia, o presidente Bashar Al-Assad prometeu reformas para atender às demandas da população. Mas analistas acreditam que o líder sírio terá uma tarefa difícil entre reformar o Estado e manter o regime.

Bashar Al-Assad tem o desafio de aplicar reformas que contrariam alguns dos preceitos básicos que formam o autoritário regime da Síria
Bashar Al-Assad tem o desafio de aplicar reformas que contrariam alguns dos preceitos básicos que formam o autoritário regime da Síria
Foto: Diego Medina/Arte / Terra

De acordo com especialistas em política no Oriente Médio, o presidente Assad enfrentará a resistência da chamada "velha guarda", grupo remanescente do regime de seu pai, Hafez Al-Assad, para fazer reformas em um Estado contaminado por corrupção, impunidade, autoritarismo e falta de democracia. "Quando Bashar chegou ao poder, em 2000, após a morte de seu pai, ele tentou promover sua imagem como reformista com ideias mais progressistas. Mas pouco se avançou nos últimso 10 anos sob sua presidência", disse o analista político egípcio Bassem Oudat.

Os protestos começaram na cidade de Deraa, no sul do país, e foram duramente reprimidos. Forças de segurança acabaram usando bombas de gás lacrimogênio e munição letal, deixando ao menos 50 mortos e dezenas de feridos em cinco dias. Mas de acordo com ativistas de direitos humanos, mais de 100 pessoas foram mortas pelas forças policiais e a Guarda Republicana, cuja missão é proteger o regime de Assad.

Segundo Oudat, o presidente sírio está em um dilema, pois precisa promover reformas para atender às aspirações do povo sem colocar em risco os mecanismos que sustentam o seu regime e das pessoas que o cercam."Ele quer evitar os levantes semelhantes às da Tunísia e Egito, que levaram à queda dos presidentes destes países, mas não pode abrir o Estado demasiadamente sem que isso comprometa o sistema atual", explicou Oudat.

Na semana passada, Assad anunciou um pacote de reformas após dissolver o governo, prometendo encerrar as leis de emergência (que vigoram há 48 anos) aliviar algumas das restrições à imprensa e formação de partidos políticos. O governo também prometeu combater a corrupção e aumentar os salários de servidores públicos.

Assad chegou a se desculpar pelas mortes em Deraa e declarou que o governo evitaria usar violência contra manifestantes. Ele acusou, também, "forças estrangeiras" de arquitetar os protestos para minar o Estado sírio.

As promessas, no entanto, não surtiram efeito, e manifestações se alastraram por outras 10 cidades do país, incluindo a capital Damasco. Manifestantes queimaram prédios do partido governista Baath e falaram abertamente em revolução para derrubar o regime, não mais se contentando com reformas, obrigando o governo a aumentar a presença de tropas nas ruas, a censura aos meios de comunicação e o controle da internet e celulares.

Armadilhas
Poucas pessoas acreditam em reformas na Síria, já que no passado as mesmas mudanças foram anunciadas sem se concretizarem. Em 2005, por exemplo, após um congresso nacional do partido Baath, o governo anunciou amplas reformas que não foram cumpridas.

Muitos acreditam que as novas promessas de mudanças do regime são na verdade uma armadilha para garantir sua sobrevivência. Entre grupos opositores, a impressão é de que o regime sírio está tentando salvar sua legitimidade de todas as maneiras possíveis.

Mas Fayes Ezzedin, membro do partido Baath, falou à mídia árabe que o governo estava sério em realizar mudanças no país. "As decisões do governo não foram vazias. As condições objetivas para reformas existem e a hora é certa para resoluções que levem a reformas. Os sírios não deveriam pedir garantias de que acontecerão. O presidente Assad tem toda a intenção de atender às demandas do povo", disse Ezzedin.

Ameaça ao regime
O jornalista e colunista político libanês Hanin Ghaddar escreveu em sua coluna em diversos jornais árabes que "as exigências dos sírios, assim como de tunisianos, egípcios, líbios, iemenitas e outros do mundo árabe, estão basicamente ficados em liberdade e reformas internas".

"Assad sabe disso, mas a razão principal é que ele não pode, nem deverá, cumprir alguma de suas promessas sem que isso signifique o fim do regime. As leis de emergência não são um texto que pode ser tirado por um decisão ou um comitê. São leis que se transformaram em um componente fundamental do regime, que foram criados para protegê-lo dos impulsos democráticos do povo", salientou Ghaddar.

Segundo ele, o regime de Assad não sobreviveria em uma sociedade que permitisse a liberdade de expressão e eleições livres e transparentes. "Seu governo é sectário, feito em sua maioria de Alawitas, um grupo minoritário na Síria. É um regime que sobreviveu por 50 anos por causa das leis de emergência e um sistema de segurança severo", completou.

A Guarda Republicana, a mesma acusada de reprimir violentamente os manifestantes, é controlada por Maher Al-Assad, irmão do presidente. Membros da família de Assad controlam, também, os serviços de inteligência, segurança e Exército.

"O problema com o regime sírio é que continua a usar uma linguagem arcaica. Se não mudar sua postura, enfrentará cada vez mais insurreições. Bashar é ainda jovem e poderia tomar uma inciativa surpreendente e reformar o país. Mas continuar acusando estrangeiros e formular teorias de conspiração para esconder as falhas de seu governo só mostra que ele não quer abrir os olhos e enxergar a realidade do futuro da região".

Fonte: Especial para Terra
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