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Veja o que ainda impede a aproximação entre EUA e Cuba

Anúncio sobre a reabertura das embaixadas é somente mais um passo no caminho para normalizar as relações

1 jul 2015 - 19h11
(atualizado às 21h05)
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Um "passo histórico". Foi como o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, descreveu o restabelecimento da embaixada do país em Havana e da embaixada de Cuba em Washington, que acontecerá no próximo dia 20 de julho.

Governos anunciaram reabertura de embaixadas, mas ainda há temas espinhosos a debater
Governos anunciaram reabertura de embaixadas, mas ainda há temas espinhosos a debater
Foto: Reuters

Histórico, mas não definitivo. O anúncio desta quarta-feira sobre a reabertura das embaixadas é somente mais um passo no caminho longo e difícil para normalizar as relações diplomáticas entre os dois países depois de meio século sem elas.

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"É um passo positivo, mas, de nenhuma maneira, final no processo de normalização", disse Eduardo Gómez, especialista em Cuba e professor de Desenvolvimento Internacional e Economias Emergentes do King's College, em Londres, à BBC Mundo.

Praticamente ao mesmo tempo em que Obama fazia seu discurso, o governo de Raúl Castro publicava no jornal oficial a declaração onde confirmava o processo e expressava concretamente os temas ainda pendentes entre os dois governos.

"Não poderá haver relações normais entre Cuba e Estados Unidos enquanto se mantenha o bloqueio econômico, comercial e financeiro", afirmou o governo cubano. E esta não é a única condição.

"Para alcançar a normalização, será indispensável também que se devolva o território ilegalmente ocupado pela base naval em Guantánamo, que cessem as transmissões radiofônicas e televisivas a Cuba (...), que se eliminem os programas destinados a promover a subversão e a desestabilização internas e que se compense o povo cubano pelos prejuízos humanos e econômicos provocados pelas políticas dos Estados Unidos."

Por sua vez, o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, mencionou, ao anunciar a abertura da sede diplomática em Havana, uma série de diferenças fundamentais que persistem: visões sobre direitos humanos e sobre a liberdade de expressão e de reunião.

Embargo por democratização?

Nos últimos meses, ocorreram avanços significativos na aproximação dos países. Em maio, os Estados Unidos retiraram Cuba da lista de países patrocinadores do terrorismo, onde estava desde 1982. E também foram levantadas diversas restrições a viagens, às finanças e ao comércio com a ilha.

Mas um dos assuntos mais difíceis de resolver é a suspensão completa do embargo. Isso só pode acontecer por decisão do Congresso americano, e não por medidas executivas do presidente.

"O embargo não será levantado nos próximos três anos", diz à BBC Mundo Diego Moya-Ocampos, analista sobre Cuba da consultoria de risco IHS.

De acordo com ele, a aprovação da suspensão do embargo pelo Congresso está condicionada a duas coisas: que Raúl Castro deixe o poder e que Cuba dê início a um processo de democratização.

No entanto, do ponto de vista cubano, são os Estados Unidos que devem reconhecer sua forma de "democracia popular e participativa", como chamam o sistema do governo do país. E não eles que devem mudá-lo.

Tanto Moya-Ocampos quanto Gómez acreditam que o principal problema é que, ao passo que os Estados Unidos querem impor seus "valores democráticos", Cuba quer que seu sistema de "democracia participativa" com partido único seja reconhecido.

"Estas relações (com os Estados Unidos) deverão alicerçar-se no respeito absoluto a nossa independência e soberania, ao direito inalienável de todo Estado a eleger seu sistema político, econômico, social e cultural sem nenhum tipo de ingerência", diz a declaração de Cuba.

Já os Estados Unidos não parecem ter problemas para manter o comércio com outros países não democráticos ou de partido único, como a China.

Eduardo Gómez, no entanto, acredita que esta parte do problema provavelmente se resolverá com uma declaração de intenções por parte de Cuba, em que o país se comprometa a aderir aos "valores" democráticos sem realizar reformas estruturais em seu sistema político.

"Há muitos países no mundo que se dizem democráticos, mas, na prática, não são democracias", diz.

A batalha no Congresso

Para além das declarações de intenção, é pouco provável que o Congresso americano aprove a suspensão do embargo antes que Castro saia do poder, o que deve acontecer em 2018. É também no Capitólio que Obama tem seus principais oponentes: Robert Menéndez, senador democrata de Nova Jersey, e Marco Rubio, senador republicano da Flórida.

Ambos os senadores, descendentes de cubanos, foram membros ativos do Comitê de Relações Exteriores do Senado, que tem um papel fundamental na hora de tomar decisões de política internacional.

Mas há outras vozes importantes nos Estados Unidos que condenaram o embargo e pediram sua suspensão. Entre elas, a atual candidata democrata à Presidência, Hillary Clinton.

A ex-secretária de Estado, ex-senadora e ex-primeira-dama disse em várias ocasiões que as restrições não respondem aos interesses atuais do país e nem ajudam a promover mudanças na ilha caribenha.

"(Para levantar o embargo) seria muito positivo que Hillary Clinton fosse a próxima presidente. Com um republicano, o processo será muito mais lento e com mais travas", diz Eduardo Gómez.

E Clinton não é a única a apoiar publicamente o fim do embargo. Mais de 40 altos funcionários do governo, empresários e intelectuais enviaram, no ano passado, uma carta aberta ao presidente Barack Obama pedindo que ele suavizasse a política em relação a Cuba.

A eles se somaram, posteriormente, 78 figuras do mundo político e econômico para demonstrar seu apoio ao novo rumo que as relações com Havana tomaram.

O problema de Guantánamo

A base naval americana de Guantánamo, no sudeste da ilha, também é uma pedra no sapato de Obama e de Raúl Castro.

O governo cubano assinalou explicitamente que quer o território de volta como condição para a normalização das relações com os Estados Unidos.

O fechamento da prisão foi uma das promessas eleitorais da primeira campanha de Obama em 2008 que ele ainda não cumpriu. Mas nunca se falou em devolver o território.

"No sei se ele terá força para fechar Guantánamo. Evidentemente estava oficialmente em sua agenda", comenta Moya-Ocampos.

"É uma situação muito difícil, porque é parte da área de Defesa e Segurança dos Estados Unidos e os republicanos não vão negociar a manutenção e o aumento de sua presença e segurança. Vai ser um tremendo desafio, mas a restituição da área a Cuba é um passo necessário", diz Gómez.

Justamente porque afeta diretamente os planos de Defesa e Segurança do país é que as negociações sobre este ponto não foram tão públicas como as do embargo. "É um tema que está sendo tratado nos bastidores", diz Moya-Ocampos.

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