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Mundo

Volta de caixas para abandonar bebês na Europa preocupa a ONU

15 jun 2012 - 10h42
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Lúcia Müzell
Direto de Paris

Uma prática comum na Idade Média está de volta à Europa: as chamadas "caixas para bebês", que permitem abandonar um recém-nascido em completo anonimato, voltaram a ser utilizadas em vários países europeus. Reintroduzido na Alemanha há 12 anos e disseminado pouco a pouco em outros 10 membros da União Europeia, o mecanismo já proporcionou o abandono de pelo menos 400 bebês, levando a Organização das Nações Unidas (ONU) a demonstrar preocupação com a situação.

As cerca de 200 caixas são encontradas em igrejas, prefeituras ou outros locais movimentados de cidades da Áustria, República Tcheca, Suíça ou Polônia. Fixadas em uma parede e munidas de uma abertura de vidro transparente, contêm um colchão, uma câmera e um alarme, que deve ser acionado pela pessoa que coloca o recém-nascido dentro do mecanismo. O alarme avisará o hospital mais próximo sobre a presença de um bebê à espera de socorro.

A prática provoca polêmica. De um lado, religiosos e políticos conservadores tendem a ser favoráveis à existência deste artifício, por supostamente evitar que os bebês sejam deixados na rua e sem proteção, ou ainda pela possível influência na diminuição dos abortos. Mas legisladores e defensores das crianças rejeitam estes argumentos e afirmam que o dispositivo fere um dos direitos fundamentais infantis, o de conhecer seus pais, presente no artigo 7 da Convenção dos Direitos da Criança da ONU. O artigo 9 diz ainda que "os Estados devem respeitar o direito de a criança manter relações pessoais e contatos diretos com seus pais".

Nesta semana, o Comitê de Direitos das Crianças das Nações chamou a atenção dos países envolvidos. "Estamos como na Idade Média, com as pessoas falando que as caixas para bebês impedem infanticídios. Entretanto, não há provas que sustentem essa afirmação", explicou Maria Herczog, psicóloga do comitê. Para ela, esta ferramenta deveria ser substituída por melhores políticas de planejamento familiar e de apoio financeiro do governo para gravidez indesejada

Já as associações de defesa de mães e crianças se dividem. Na Suíça, por exemplo, as caixas para bebês foram instaladas a pedido de uma delas, a Ajuda para a Mãe e a Criança (ASME, na sigla em francês).

"Não se trata de um verdadeiro abandono, porque o resultado não é a morte da criança, como acontece quando ela é deixada em uma lixeira, por exemplo", afirma Nahum Freck, pediatra e membro da entidade. "Esta ferramenta permite às famílias que não se sentem em condições de educar uma criança entregá-la com segurança a quem possa fazê-lo. Trata-se de dar uma chance a uma vida melhor."

O futuro dos bebês abandonados varia de acordo com o país, mas na maioria deles os pais têm até oito semanas para voltar atrás na decisão e recuperar o recém-nascido. A identificação da mãe ou do pai é feita através das digitais colhidas na criança assim que ela é retirada da caixa. Na Suíça, o prazo de arrependimento pode ser estendido a até dois anos, mediante condições. Neste período, a criança permanece sob a tutela do Estado, e depois, o bebê é submetido à adoção.

A alternativa das caixas para bebês apareceu como um paliativo à falta de legislação garantindo o direito às mães de deixar seus bebês na maternidade, como acontece na França, por exemplo. Ao decidir pelo abandono, as mães francesas são incitadas a deixar informações sobre si junto aos serviços sociais, mas não são obrigadas a declarar nada além de dados importantes para a saúde da criança.

A existência de uma lei autorizando o abandono não exclui, entretanto, as polêmicas sobre o assunto. Há anos, a direita francesa tenta reverter total ou parcialmente esta norma e deseja obrigar a mãe a deixar pelo menos o seu nome para que, se desejar, o filho possa procurá-la após os 18 anos de idade. Desde 2002, as mulheres que deixaram voluntariamente referências podem ser contatadas por serviços especializados, que a pedido do filho intermedeiam um eventual contato entre os dois.

Fonte: Especial para Terra
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