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Mundo

Fantasma da sucessão assusta líbios após queda de Kadafi

22 mar 2012 - 06h43
(atualizado às 13h22)
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Tariq Saleh
Direto de Beirute

Na semana passada, quando uma manifestação por uma maior autonomia da região do leste da Líbia acontecia na praça principal de Benghazi, segunda maior cidade do país, os líbios Mohamed El Tajouri e Bassem al-Darwish lamentavam o que eles descreveram como um desrespeito aos mortos durante o conflito que derrubou a ditadura de Muammar Kadafi.

Após lutar contra Muammar Kadafi, Bassem Al-Darwish espera que a Líbia tenha um futuro brilhante pela frente
Após lutar contra Muammar Kadafi, Bassem Al-Darwish espera que a Líbia tenha um futuro brilhante pela frente
Foto: Tariq Saleh / Especial para Terra

"Todos nós pegamos em armas para lutar por uma Líbia livre, unida. Se queríamos apenas a nossa região para formarmos uma federação, então nem terïamos nos dado ao trabalho de avançar rumo ao oeste e liberar a capital Trípoli", falou El Tajouri.

Benghazi, berço da revolução que acabou com os 42 anos de poder absoluto de Kadafi, tem visto intensos debates e divisões sobre a proposta polêmica de semiautonomia do leste, conhecida como Cyrenaica. Depois da indpendência da Líbia, em 1951, as três regiões do país - Tripolitania, Cyrenaica e Fezzan -, tinham status de federações autonômas, depois extinto em 1963, quando o país se tornou um Estado unitário.

Alguns líderes da região de Cyrenaica vêm defendendo a volta do federalismo, gerando controvérsia até entre a população do leste.De acordo al-Darwish, os líderes deveriam usar maior energia para resolver os problemas econômicos, sociais e institucionais, modernizando o país, ao invés de "ressuscitar velhos modelos".

"Não lutamos essa guerra toda no ano passado para agora discutirmos como vamos nos separar do restante da Líbia. Não derrubamos Kadafi para ver uma Líbia dividida", enfatizou ele, por telefone, ao Terra.

De acordo com a proposta de líderes a favor de uma semi-autonomia, incluindo Ahmed Zubair el-Senussi, membro regional do Conselho Nacional de Transição (CNT), que governa interinamente o país, o "Estado da Cyrenaica" teria controle de sua força policial, uma Corte de justiça e a criação de um parlamento regional, mas negam a intenção de se separar do restante da Líbia.

Protestos a favor e contra a proposta já ocorreram em Benghazi e a capital Trípoli, e alguns incidentes envolveram confrontos armados entre os dois grupos.

Tristeza
Al-Darwish, 38 anos, dono de um café em Benghazi, contou que lutou durante o conflito contra Kadafi esperançoso de que o país teria um futuro brilhante pela frente.

"Alguns destes líderes pró-autonomia faziam discursos de unidade há alguns meses, ainda durante o luta contra Kadafi. Agora me parece estranho abrirem a boca apra falar de autonomia. Para mim, esse é o primeiro passo para uma separação total do resto do país", enfatizou.

"Eu quero fazer parte da Líbia, sou um líbio e vejo o povo do oeste como meus irmãos", completouy al-Darwish. Outro líbio, Mohamed El Tajouri, teme que a divisão interna em Cyrenaica sobre a proposta de semiautonomia leve a uma situação tensa e um conflito armado.

"A Líbia é um país tribal, diferentes líderes com diferentes interesses e opiniões. Se houver divergências extremas, um confronto armado entre facções tribais colocaria em risco todo país", disse El Tajouri, 43 anos, funcionário público e que também combateu nas fileiras rebeldes contra as tropas leais a Kadafi.

De acordo com ele, uma divisão da Líbia seria uma tristeza imensa para todos aqueles "que lutaram e perderam suas vidas para liberar cada pedaço de terra das mãos do regime de Kadafi".

"Quando chego em casa, olho para meus dois filhos adolescentes e esposa e vejo uma aflição. Meus filhos me contaram que escutam de amigos diferentes opiniões a favor e contra a proposta (de semiautonomia). A geração jovem está começando a ficar dividida e é aí que está o perigo".

Sem rebeldia
Mahmoud Sussi, 35 anos, é engenheiro e a favor da semiautonomia porque acha que o leste "sempre foi esquecido e marginalizado pelo oeste". "Não defendo uma separação completa, ainda quero que a Cyrenaica seja parte da Líbia. Mas temos o direito de termos algum tipo de autonomia, de decidirmos algumas leis que sejam compatíveis com nosso estilo de viver aqui", falou ao Terra.

Para ele, não se trata de rebeldia em relação a um poder central, mas dos líderes da capital respeitarem a vontade da população de Cyrenaica."Não temo uma guerra civil ou algo assim. Acho que nós temos a capacidade de resolver as diferenças internas em torno da proposta. O que não pode acontecer é simplesmente ignorarem os desejos de uma parte do povo aqui, seja maioria ou minoria", salientou.

Ainda este ano, em junho, haverá um pleito onde os líbios elegerão uma Assembleia Constituinte que terá como missão escrever uma nova Constituição para o país. E os debates sobre federalismo e a semiautonomia do leste deverão ser bastante polêmicos.

Alguns líderes contra a semiautonomia acusam os defensores da proposta de buscarem ganhos políticos e econômicos, considerando que a Cyrenaica é também berço de dois terços da produção de petróleo da Líbia.

Até o momento, o governo cental em Trípoli não se manifestou oficialmente e de forma firme sobre a proposta de Cyrenaica. No entanto, o presidente do CNT, que governa o país, Mustafa Abdel Jalil, disse há alguns dias que defenderia a undiade da Líbia com o uso da força, mas depois explicou que não quis dizer que usaria a força militar para coibir tentativa de autonomia de regiões ou cidades do país.

Fonte: Especial para Terra
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