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Mundo

Personagem da 'Time', poeta sensibiliza México contra o crime

12 fev 2012 - 15h37
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Elisa Martins
Direto da Cidade do México

Desde que seu filho, Juan Francisco, foi assassinado pelo crime organizado, em março de 2011, o poeta mexicano Javier Sicilia empreende uma jornada gigantesca de mobilização dos cidadãos contra a violência que já deixou dezenas de milhares de mortos no México desde a posse do presidente Felipe Calderón, em dezembro de 2006. A dor o levou a fundar o Movimento pela Paz com Justiça e Dignidade, um grupo que conseguiu unir a sociedade mexicana em longas caravanas de protesto e na criação de propostas que condenam a guerra travada contra o narcotráfico.

Foto de maio de 2011 mostra Sicilia - vestindo uma camiseta com a foto de seu filho - liderando uma passeata na Cidade do México: luta contra o crime
Foto de maio de 2011 mostra Sicilia - vestindo uma camiseta com a foto de seu filho - liderando uma passeata na Cidade do México: luta contra o crime
Foto: AFP

Veja o mapa da violência no México

A mais recente ação do movimento foi lançada no fim de janeiro, pouco depois de o governo anunciar a cifra oficial de 47.515 mortos nos confrontos entre forças de segurança e delinquentes, que também geram vítimas civis. É a campanha "En los zapatos del otro" ("Nos sapatos do outro"), protagonizada por artistas que apresentam histórias reais e impactantes de pessoas desaparecidas e assassinadas desde o início da ofensiva de Calderón. Nas imagens, os atores se colocam no lugar das vítimas, citam seus nomes e tornam pública a luta das famílias por justiça.

"A campanha foi desenhada por atores, cineastas e músicos que fizeram parte do movimento desde que ele começou, particularmente os atores Daniel Giménez Cacho e Ilse Salas. Eles entenderam o coração do movimento desde o princípio, acompanharam as caravanas e decidiram - a partir da sua perspectiva profissional - colocar-se no lugar das vítimas e mostrar seu sofrimento", disse em entrevista ao Terra o poeta e ativista mexicano Javier Sicilia.

"A campanha tem a intenção de sensibilizar os cidadãos sobre a dor das vítimas, a situação de emergência nacional e a necessidade de continuar empurrando, entre todos, uma agenda de paz e justiça, algo que estamos muito longe de viver neste país", completou. Sicilia reconhece que a presença dos artistas deu visibilidade à causa. A campanha teve grande repercussão nos meios de comunicação e nas redes sociais, onde recebeu muitos comentários (para ver o spot da campanha, clique aqui).

"A mensagem é clara. Ao levantarmos a voz, mostramos como a mobilização gigantesca que se deu no país mudou muita coisa. Não chegamos à paz nem à justiça, mas conseguimos visualizar a emergência nacional e o rosto e o nome das vitimas. Juntos, podemos transformar o país, o que infelizmente os políticos não têm feito", afirma Sicilia.

A maioria dos casos mostrados no vídeo da campanha continua sem solução. Curiosamente, o único em que se teria encontrado os culpados foi o caso do filho de Sicilia, Juan Francisco, assassinado com outras seis pessoas na cidade de Cuernavaca. Mesmo assim, os supostos autores do crime ainda não foram sentenciados. Sicilia duvida da Justiça.

"Os problemas não vão se resolver de um dia para outro porque eles são profundos, e as lutas neste país devem ser longas, infelizmente. A destruição que os políticos fizeram e a omissão dos cidadãos levou o país a um estado grave, mas temos que continuar pressionando. Se não mantivermos essa marcha, aí é que nunca haverá uma solução. O movimento é de não violência, somos de tradição gandhiana. Às vezes as pessoas esquecem que a luta de Gandhi durou 40 anos, em longas batalhas", conta o poeta e ativista.

Personagem da Time
Sua peregrinação pacífica (mas não silenciosa) o levou a ser escolhido um dos personagens do ano pela revista Time, que destacou a figura do "manifestante" como o personagem de 2011. Na edição figuravam Sicilia e outros líderes de protestos ao redor do mundo. A revista elogiou o desafio assumido pelo poeta mexicano para difundir a dor e os nomes das vítimas, muitas incluídas como culpadas nas estatísticas, em um fenômeno antes conhecido no combate às guerrilhas na Colômbia como "falsos positivos".

À Time, Sicilia disse que nunca havia pensado em fundar um movimento nem ser porta-voz da sociedade mexicana, mas que fez o que seu coração mandava - e a surpresa de ver uma resposta nacional foi muito grata. No ano passado, a revista mexicana Quién também nomeou Sicilia como um dos "50 personagens que movem o México".

Ceticismo político
Com a proximidade das eleições presidenciais, que serão realizadas em 1º de julho deste ano, o país vive uma nova expectativa. No último domingo, em uma votação interna, o Partido Ação Nacional (PAN), ao qual pertence o atual presidente Felipe Calderón, anunciou a vitória da ex-ministra e deputada Josefina Vázquez Mota como candidata da legenda nas urnas. Com a ambição de ser a primeira presidente mulher na história do país, Josefina já declarou que vai manter as políticas de Calderón, o que incluiria sua estratégia de segurança. Javier Sicilia reage com ceticismo à preocupação dos candidatos com a população mexicana.

"Não importa quem vença. Nenhum deles entende a dor das vítimas nem a corrupção do sistema, ninguém propõe uma solução. Na condição em que está o país, o novo presidente entrará para administrar a desgraça, caso não elabore uma agenda de unidade nacional com todos", opina o poeta e ativista, que planeja convidar os candidatos a um debate público, a exemplo do que já fez com Calderón no ano passado.

A aspirante do PAN, Josefina Vázquez Mota, terá como principais adversários o ex-governador do Estado do México, Enrique Peña Nieto (Partido Revolucionário Institucional - PRI), favorito nas pesquisas, e Andrés Manuel López Obrador (Partido da Revolução Democrática - PRD), derrotado por Calderón nas últimas eleições presidenciais. Vázquez Mota já declarou que Peña Nieto seria seu rival mais forte. Ao saber que a candidata o desconsidera na corrida presidencial, López Obrador reagiu e afirmou que é melhor que o tomem "como morto". O clima de hostilidade entre os candidatos está apenas começando.

Fonte: Especial para Terra
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