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Ásia

'Precisava mostrar a dor afegã', diz fotógrafo ferido em ataque

13 dez 2011 - 17h31
(atualizado às 18h02)
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A fotografia tirada por Massoud Hossaini de uma menina afegã de pé em meio a uma pilha de corpos capturou a imagem da devastação deixada imediatamente, após o ataque suicida contra um santuário xiita em Cabul. O fotógrafo, 30 anos, da AFP, estava a alguns metros quando a bomba explodiu em 6 de dezembro, deixando ao menos 70 mortos.

Foto de Massoud Hossaini mostra desespero de menina afegã parada em meio a pilha de corpos em santuário xiita
Foto de Massoud Hossaini mostra desespero de menina afegã parada em meio a pilha de corpos em santuário xiita
Foto: AFP

Em entrevista, ele descreve o que aconteceu e o que significa ser um fotógrafo afegão trabalhando em seu país destruído pela guerra.

Conte o que aconteceu naquele dia.

Massoud Hossaini: "Eu estava checando a minha câmera quando de repente houve uma explosão enorme. Por um momento não tive consciência de nada, só senti a onda da explosão e a dor em meu corpo. Joguei-me no chão. Vi um monte de gente correndo no sentido oposto à fumaça. Sentei-me e vi que minha mão estava sangrando, mas não sentia dor. É meu trabalho saber o que está acontecendo, então corri na direção oposta de toda a gente. Quando a fumaça baixou, vi que eu estava de pé no meio de um círculo de cadáveres, amontoados, um em cima do outro. Eu estava exatamente no lugar em que o suicida esteve".

Como você reagiu?
MH: "Fiquei em estado choque. Não sabia o que fazer. Então comecei a clicar. Sabia que estava chorando. Foi muito estranho chorar, nunca tinha reagido daquela forma, antes. Não ajudei ninguém, porque não pude, estava realmente em choque. Sabia que precisava cobrir aquele horror, registrar tudo, toda a dor, as pessoas correndo, chorando, batendo no peito e gritando: 'morte à Al-Qaeda, morte ao Talibã!'".

Como você tirou a foto de Tarana, a garota de 12 anos?

MH: "Virei-me para a direita e vi a menina. Quando Tarana se deu conta do que tinha acontecido a seu irmão, primos, tios, mãe, avó, todas as pessoas ao redor dela, começou a gritar. Nas minhas fotos, ela estava apenas gritando. Essa reação de choque era tudo o que eu queria captar." (Nesse momento, chegou um grupo de jovens que começou a atacar os jornalistas no local do atentado.) Eles me tiraram do local, mas de alguma forma eu consegui voltar e só me lembro quando as pessoas estavam carregando os corpos e eu tentei capturar aquele momento. Eu queria apenas refletir a dor real de todos ali, para qualquer pessoa que visse minhas fotos. Não importava se afegãos, americanos, muçulmanos, cristãos, ou outros quaiquer. Só queria que soubessem o que meu povo estava sentindo."

Como o incidente afetou você?
MH: "Senti 100% tudo. Estive no local antes, durante e depois (do atentado), e fiquei ferido. Foi uma experiência importante. Na primeira e segunda noite, tive dificuldade para dormir. Sempre que fechava os olhos lembrava da cena, me perguntando o que mais eu poderia ter feito por aquelas pessoas, por que não ajudei ninguém? No terceiro dia, todas essas emoções na minha cabeça acabaram porque eu descobri que a foto tinha sido publicada em todo lugar. Vi que tinha feito uma grande cobertura que tinha tido efeito importante. Graças a Deus eu estava lá e consegui tirar uma foto e enviá-la o mais rápido que consegui."

Como é ser um repórter fotográfico no Afeganistão?

MH: "Sinto que nasci no lugar errado - Afeganistão - e que cresci no lugar errado - Irã - e agora estou vivendo no lugar errado de novo - Cabul. Minha família deixou o Afeganistão por causa da guerra quando eu era bebê e foi para o Irã, onde a vida era realmente difícil. Vejo o Afeganistão como um 'outsider' porque eu não cresci aqui. A maioria vê a guerra como parte de sua vida, mas eu nunca senti isso no Irã. Aqui, tudo é guerra. Nunca vi isso na minha infância. Eu sinto as pessoas, eu choro com elas. Antes, eu era apenas um fotógrafo e eles eram o povo, eles eram meu assunto. Agora eu digo que são meu assunto, mas também que estou com eles. O que os machuca também me machuca."

Você deixaria o Afeganistão?

MH: "Como todo mundo, eu quero sair do país e viver em uma situação melhor, com uma qualidade de vida melhor. Mas é complicado. Se eu sair do Afeganistão, o que vou fazer? Quero fazer o que posso pelo Afeganistão, mostrando a verdade da situação o máximo possível. Pode ser uma verdade difícil e amarga, mas eu quero mostrá-la. Mas essa parte da minha vida é realmente difícil para mim. A verdade que quero mostrar em minhas fotos algo que eu também sinto na minha vida. Às vezes, penso que gostaria de fazer coberturas em outro lugar. Ser capaz de usar meu profissionalismo, sem me machucar."

AFP Todos os direitos de reprodução e representação reservados. 
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