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Europa

Gorbachev: povo e Yeltsin derrotaram golpistas e evitaram guerra

17 ago 2011 - 16h05
(atualizado às 17h02)
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O último dirigente da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS), Mikhail Gorbachev, reconheceu nesta quarta-feira o "papel decisivo" do povo soviético e do falecido presidente russo Boris Yeltsin na derrota do golpe de Estado de agosto de 1991. "O povo exerceu um papel decisivo e Yeltsin também. O importante era evitar um derramamento de sangue. Podia eclodir uma guerra civil. Éramos uma potência com armas nucleares", assinalou Gorbachev em uma agitada entrevista coletiva.

Gorbachev, 80 anos, chamou de "traidores" os integrantes do Comitê Estatal de Emergência (GKChP) que o tiraram do poder entre 19 e 21 de agosto de 1991 - durante o chamado Putsch de Moscou -, entre os quais estavam "amigos" como o presidente do Soviete Supremo (Parlamento), Anatoly Lukyanov. "Tinha que ser muito idiota para aplicar um golpe. Mas tinha que tirar do caminho o velho Gorbachev. Tinha me transformado em uma figura incômoda para os reacionários. Olha que tinham me avisado muitas vezes que haveria um golpe", lembrou.

O político octogenário, que chegou ao poder em março de 1985, elogiou a coragem mostrada pelos militares soviéticos quando se recusaram a invadir a Casa Branca russa, então sede do Parlamento, onde se concentravam Yeltsin e milhares de pessoas contrárias ao golpe. "Tolices", respondeu Gorbachev com firmeza, quando perguntado sobre as suspeitas de que ele teria participado de alguma maneira da mobilização organizada pela temida KGB - órgão de inteligência soviética -, que tentava conservar os privilégios da nomenclatura.

O último líder soviético, que proclamou o fim da URSS no dia 25 de dezembro de 1991, também criticou a anistia concedida aos golpistas, já que a maioria deles acabou refazendo carreira política na Rússia pós-soviética. Os 12 protagonistas do frustrado levante de agosto de 1991 foram processados por "traição à Pátria", mas nunca chegaram a ser condenados graças ao benefício da anistia aprovada pelo Parlamento russo em fevereiro de 1994.

"Era preciso renovar a URSS, democratizá-la, não destruí-la", assinalou Gorbachev, que reconheceu sua responsabilidade como secretário-geral do Partido Comunista da União Soviética (PCUS) ao não ter prevenido o golpe. Gorbachev ressaltou que o Estado totalitário soviético "não era intransponível, mas se podia ter criado uma nova União de Estados Soberanos".

"As questões estratégicas como defesa, diplomacia e economia teriam corrido a cargo do centro federal e o resto ficaria a cargo das repúblicas", apontou. Mas o golpe precipitou a independência das 15 repúblicas soviéticas, processo que seria iniciado pelas nações bálticas e pela Geórgia, seguidas de Ucrânia, Belarus, países do Cáucaso e as cinco centro-asiáticas.

Gorbachev culpa em grande medida Yeltsin, o primeiro dirigente russo a ser eleito por sufrágio universal em junho de 1991, por descumprir suas promessas, o que, em sua opinião, condenou a URSS ao desaparecimento no final daquele ano. "Quando conversávamos, ele dizia que era preciso conservar a União. Depois, ia para casa, tomava banho, comia e, pelas minhas costas, dizia tudo o contrário. Acho que a moral e a política devem seguir de mãos dadas. Não posso fazer acordos com pessoas assim", comentou.

Além disso, Gorbachev fez uma apologia da política da "perestroika" (reconstrução), ao considerar que, após a morte de três secretários-gerais do PCUS entre 1982 e 1985, "era preciso democratizar o partido". "Era necessário derrubar a Cortina de Ferro que separava o partido da sociedade. Disse (o ministro de Exteriores soviético) Andrei Gromyko: 'O povo não suporta mais essa situação. Não se pode viver assim'", citou o ex-líder, que reconheceu não ter inventado o conceito "perestroika". "Ouvi, gostei e adotei-o", explicou.

O golpe de 1991, protagonizado por uma junta integrada por importantes políticos e militares soviéticos, fracassou no dia 21 de agosto daquele ano graças à resistência do povo e das autoridades da República Socialista Federativa Soviética da Rússia, como Yeltsin e Ruslan Khasbulatov, o presidente do Soviete Supremo russo. Além disso, Gorbachev criticou as recentes tendências autoritárias que surgiram na política russa, como a Frente Popular criado pelo primeiro-ministro russo, Vladimir Putin, para aglutinar todas as forças patrióticas e formar uma coligação às eleições parlamentares.

"Não podemos repetir os erros do PCUS. É preciso renovar os dirigentes. O mais importante é que as eleições sejam limpas, já que o habitual é o uso do recurso administrativo. Estamos a meio caminho rumo à democracia", exclamou. Segundo as pesquisas de opinião, mais da metade dos russos ainda lamenta a desintegração da URSS, que Putin classificou como "a maior catástrofe geopolítica do século XX".

EFE   
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