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Ásia

Em meio a crise japonesa, Itália quer reativar programa nuclear

21 mar 2011 - 11h50
(atualizado às 12h05)
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Leandro Demori
Direto de Roma

A Itália é o símbolo de um continente que busca caminhar ao futuro tendo os pés cimentados no passado. A guerra na Líbia e o falimento das tentativas de resfriar os reatores nucleares danificados de Fukushima podem mudar os rumos da política energética local - o país é o único dos grandes europeus que não produz energia nuclear e estava disposto a cortar a primeira fita inaugural de uma usina em três anos.Com o desastre japonês as certezas viraram dúvidas.

O consenso nacional é que o país precisa de alternativas na geração de energia. "Produzimos apenas 12% de nosso consumo", alerta Gian Antonio Stella, autor do livro La Deriva. Perché l'Italia rischia il naufrágio ("À Deriva. Porque a Itália arrisca o naufrágio", sem tradução para o português). "Dos 88% que importamos, a maior parte é gás, sobretudo do norte da Europa, da Rússia e da Líbia". O país de Kadafi, hoje, mantém as torneiras de fornecimento fechadas por conta da guerra; cerca de 12% do gás que deveria chegar ao território italiano é compensando por importações de outros países, situação insustentável a longo prazo.

O xadrez energético desfavorável faz com que a Itália gaste cerca de 30 bilhões de euros por ano com importações de gás, petróleo e também energia produzida em centrais atômicas na França. A conta fecha no vermelho para os consumidores: a luz italiana é a mais cara da Europa.Esse é o principal argumento dos defensores da reativação do programa atômico nacional, interrompido em 1987 quando duas centrais já estavam em construção, o que representou prejuízos de trilhões de antigas liras. Naquele ano, 80% dos italianos disse 'não' ao nuclear, e ainda 70% impediram que a companhia energética nacional ENEL sequer investisse em programas atômicos no exterior.

As discussões prometem gritos e tensões de um jogo de cálcio. "Neste país, o tema gera paixões como talvez nenhum outro", acredita Enrico Pedemonte, físico e auto-definido 'de esquerda, ecologista e nuclearista não-arrependido'. "O que tem a ver 'ser de esquerda' com 'ser contra o nuclear' é algo que jamais entendi. A França ergue centrais desde os tempos do socialista François Mitterrand. Tony Blair e Bill Clinton são a favor da energia atômica", argumenta. "As novas centrais que podemos levantar no nosso país têm capacidade para aguentar o impacto de um avião, são muito mais robustas e confiáveis do que a de Fukushima". A usina japonesa foi construída no fervor econômico japonês dos anos 1970 quando o país precisava de energia para sustentar seu rápido crescimento industrial.

A resposta contrária do campo oposto vem embalada em um sloganfutebolístico: "melhor ativos hoje do que radioativos amanhã", defendem as associações criadoras do "No Nuclear Day", manifestação que aconteceu em 2010 em Milão e que promete ocupar espaços públicos nas cidades italianas nos próximos meses. "Ainda não se sabe o que fazer com o lixo nuclear, o fato de as usinas serem mais resistentes não muda nada", defende Stefano Ciafani, responsável científico da Legambiente, a principal associação de ambientalistas italianos.

Os dois lados da disputa terão pouco tempo para convencer a população.No próximo mês de junho, a Itália passará por outro referendo sobre energia nuclear, onde caberá novamente aos cidadãos definirem se o país deve investir em centrais atômicas. A pesar no bolso está a cara conta de luz, mas também há um componente ambiental: usinas nucleares não produzem gases que contribuem para o efeito estufa. Contra, jogam o lixo nuclear - material perigoso e de alto custo de manutenção - e o território altamente sísmico do país. Para ambientalistas, um terremoto poderia devastar imensas áreas caso se repita o que acontece hoje em Fukushima.

Fonte: Especial para Terra
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