Pelo menos 640 pessoas morreram por protestos na Líbia
A Federação Internacional de Direitos Humanos (FIDH) elevou nesta quarta-feira o número de mortos na Líbia para 640 pessoas, dos quais 130 são militares da região de Benghazi executados por seus oficiais por se negarem a disparar contra a população.
A presidente da FIDH, Souhayr Belhassen, garantiu que o número que trabalha sua organização atende a um balanço de mortos "contados um a um" graças às informações repassadas por fontes médicas e militares no terreno.
Belhassen assinalou que 275 pessoas teriam morrido em Trípoli e outras 230 em Benghazi, das quais 130 seriam "militares executados por seus oficiais por se negarem a disparar contra a população" que protesta contra o regime de Muammar Kadafi.
A FIDH considera os assassinatos ocorrem de forma "sistemática e generalizada", acrescentou Belhassen, por isso que solicitam intervenção do Tribunal Penal Internacional (TPI) porque entendem que "há crime contra a humanidade".
Por sua vez, em declarações à rede de televisão Al Arabiya, um membro líbio do Tribunal Penal Internacional (TPI) elevou a 10 mil as pessoas que morreram na Líbia desde o início dos protestos populares contra o regime de Muammar Kadafi.
Em declarações à rede a partir de Paris, o membro líbio, que não declarou se falava em nome do TPI, também assinalou que os feridos podem chegar a cerca de 50 mil. Além disso, lembrou que "desde que Kadafi chegou ao poder assassinou a milhares de pessoas e também a milhares de presos nas mesmas prisões".
Por sua vez, o governo líbio afirmou na terça-feira à noite que os mortos pelos distúrbios que atingem a Líbia nos últimos dias somam 300, dos quais 189 são civis e outros 111 membros das forças de segurança, militares ou policiais.
Kadafi enfraquecido
A informação chega no momento em que o regime de Kadafi parece cada vez mais enfraquecido. Nesta quarta, os opositores assumiram o controle da costa oriental do país, onde os militares se somaram ao movimento de protesto contra o regime em vigor há 42 anos. Rebeldes - em maioria armados - se posicionaram na estrada próxima ao litoral mediterrâneo que vai da fronteira com o Egito à cidade de Tobruk, a 150 km mais a oeste.
Por todas as partes via-se insurgentes com a bandeira da independência de 1951, anterior ao regime de Kadafi. Nas estradas, as pessoas faziam o sinal da vitória mostrando sua felicidade ante a certeza de que o líder líbio terminará caindo, comprovaram os jornalistas que deixavam de carro a cidade de Tobruk em direção a oeste. Os moradores da região contaram que o movimento contra Kadafi controlava a região que vai da fronteira egípcia a Ajdabiya, mais a oeste, passando por Tobruk e Benghazi.
Muitos moradores da cidade de Al-Baida também disseram que os milicianos leais a Kadafi tinham sido executados. Ainda segundo os moradores, os militares apoiam a rebelião na região do leste que o regime diz, no entanto, manter sob controle."Que Deus dê a vitória a nosso dirigente e a nosso povo!", dizia mensagem transmitida através da rede líbia de telefonia móvel, que prometia também tempo de comunicação grátis às pessoas que a enviassem a outros assinantes.
O ministro Franco Frattini, das Relações Exteriores da Itália, país que mantém fortes relações econômicas com a Líbia, informou na manhã desta quarta-feira que a província de Cirenaica (leste) já não está sob controle do governo líbio.
Mundo árabe em convulsão
A onda de protestos que desbancou em poucas semanas os longevos governos da Tunísia e do Egito segue se irradiando por diversos Estados do mundo árabe. Depois da queda do tunisiano Ben Alie do egípcio Hosni Mubarak, os protestos mantêm-se quase que diariamente e começam a delinear um momento histórico para a região. Há elementos comuns em todos os conflitos: em maior ou menor medida, a insatisfação com a situação político-econômica e o clamor por liberdade e democracia; no entanto, a onda contestatória vai, aos poucos, ganhando contornos próprios em cada país e ressaltando suas diferenças políticas, culturais e sociais.
No norte da África, a Argélia vive - desde o começo do ano - protestos contra o presidente Abdelaziz Bouteflika, que ocupa o cargo desde que venceu as eleições, pela primeira vez, em 1999; mais recentemente, a população do Marrocos também aderiu aos protestos, questionando o reinado de Mohammed VI. A onda também chegou à península arábica: na Jordânia, foi rápida a erupção de protestos contra o rei Abdullah, no posto desde 1999; já ao sul da península, massas têm saído às ruas para pedir mudanças no Iêmen, presidido por Ali Abdullah Saleh desde 1978, bem como em Omã, no qual o sultão Al Said reina desde 1970.
Além destes, os protestos vêm sendo particularmente intensos em dois países. Na Líbia, país fortemente controlado pelo revolucionário líder Muamar Kadafi, a população entra em sangrento confronto com as forças de segurança; em meio à onda de violência, um filho de Kadafifoi à TV estatal do país para tirar a legitimidade dos protestos, acusando um "complô" para dividir o país e suas riquezas. Na península arábica, o pequeno reino do Bahrein - estratégico aliado dos Estados Unidos - vem sendo contestado pela população, que quer mudanças no governo do rei Hamad Bin Isa Al Khalifa, no poder desde 1999.
Além destes países árabes, um foco latente de tensão é a república islâmica do Irã. O país persa (não árabe, embora falante desta língua) é o protagonista contemporâneo da tensão entre Islã/Ocidente e também tem registrado protestos populares que contestam a presidência de Mahmoud Ahmadinejad, no cargo desde 2005. Enquanto isso, a Tunísia e o Egito vivem os lento e trabalhoso processo pós-revolucionário, no qual novos governos vão sendo formados para tentar dar resposta aos anseios da população.