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Mundo

Egito aposta em mapa para conter assédio sexual no país

29 set 2010 - 10h05
(atualizado às 10h17)
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A cada vez que uma mulher for assediada nas ruas do Egito, a vítima só precisará do seu telefone para denunciar e registrar o incidente em um mapa virtual que assinalará, a modo de prevenção, os "pontos vermelhos" onde os ataques são mais recorrentes.

"HarassMap" (ou mapa do assédio) é o nome do projeto elaborado pela ativista Rebecca Chiao que permitirá a qualquer mulher que seja objeto de olhares lascivos, comentários obscenos ou qualquer outro tipo de assédio na rua, enviar uma mensagem SMS com a localização e a descrição do fato, para que este seja registrado em um mapa situado na internet e de acesso público.

"Vamos usar os pontos vermelhos para criar consciência. Não queremos dar a impressão de que as mulheres não devem ir a esses lugares, mas fazer saber que há um problema aí e que é necessário reunir a comunidade para solucioná-lo", disse Rebecca à Agência Efe, que assegura que seu projeto estará funcionando dentro de dois meses.

De acordo com um estudo elaborado em 2008 pelo Centro Egípcio para os Direitos das Mulheres (CEDM), 83% das 1.010 egípcias indagadas e 97% das 109 estrangeiras que viviam no país tinham sofrido algum tipo de assédio sexual, sendo que a metade delas afirmou vivê-lo todos os dias.

Embora o grupo de voluntários dirigido por Rebecca aposte na denúncia anônima, o convencimento para a denúncia é especialmente difícil em um país no qual a mulher é a primeira a assumir sua culpa por incitar o homem.

Para a professora de sociologia da Universidade do Catar Layachi Anser, "não vai ser fácil convencê-las de que é uma medida para sua própria proteção", sobretudo porque o assunto é "um problema estrutural" que tem a ver com a ordem patriarcal do Egito.

O professor da Universidade do Cairo Ian Douglas concorda com Layachi em que esse não é um assunto que possa ser resolvido facilmente.

"O assédio sexual no Egito é um sintoma de problemas mais profundos no social, no econômico e no político. Não é fácil erradicá-lo, porque para isso tem que haver uma transformação da sociedade como um todo", diz Douglas.

É um problema estrutural que, no entanto, segundo Rebecca, não faz parte da cultura egípcia. "É algo novo. Se uma mulher era acossada há 20 anos, alguém cruzava a rua para repreender o perseguidor. Era visto como algo vergonhoso", diz a especialista americana em desenvolvimento e economia internacional.

A explicação da drástica mudança, diz Rebecca, deriva de uma combinação de diferentes fatores. Por uma parte, tanto os grupos conservadores islâmicos como os meios de comunicação ocidentais reproduzem uma imagem de mulher-objeto, que anula seus direitos, decisões e sentimentos.

Por outro lado, foram acumuladas pressões na vida cotidiana do povo, que "responde a elas com agressões em direção aos grupos mais vulneráveis da sociedade, e as mulheres são um deles", diz Rebecca.

Para combater o problema, não bastará apenas torná-lo visível com o mapa, mas resolvê-lo com outras atividades, para modificar, por exemplo, os motivos que os homens têm para assediar as mulheres.

De acordo com o levantamento do CEDM, 62,4% dos 1.010 homens ouvidos confirmaram que costumam assediar as mulheres porque "satisfaz seus desejos sexuais" e "os faz sentir másculos".

Segundo explica Layachi, o assédio "não tem nada a ver com o modo de vestir das mulheres, mas com a fome de sexo profundamente arraigada e os desejos sexuais reprimidos pelas normas morais e sociais".

Para Rebecca, se trata de um fator muito simples: a aceitabilidade, já que "o assédio é socialmente aceitável para os homens".

"Frequentemente vejo meninos que acossam as mulheres já não pela mulher em si, mas para sentirem-se integrados em seu grupo de amigos. Isso não seria visto como algo positivo se apenas um deles dissesse ''que estúpido'', e o comportamento do grupo seria mudado pouco a pouco", assegura.

"Não acho que seja tão difícil", diz Rebecca sorrindo. "Se vivemos em uma cultura midiática tão intensa, é preciso aproveitá-la e criar um mercado para que o assédio se transforme em algo inaceitável".

EFE   
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