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Estados Unidos

Efeitos do vazamento de petróleo afetam cotidiano no Alabama

23 jun 2010 - 17h52
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John Leland
Do New York Times, em Orange Beach, Alabama

Quando a plataforma petroleira Deepwater Horizon explodiu, em 20 de abril, Nadejda Damian havia acabado de chegar ao Alabama vinda da Moldávia, uma antiga república soviética, a fim de passar o verão limpando apartamentos em condomínios a beira-mar. Mas, devido ao vazamento de petróleo, caiu o número de turistas, o que significa menos apartamentos a limpar - e, para Damian, 21 anos, um período de prejuízo, em lugar de formação de economias polpudas para levar de volta ao seu país.

Nadejda Damian, da Moldóvia, encontrou dificuldades para trabalhar com a queda no turismo
Nadejda Damian, da Moldóvia, encontrou dificuldades para trabalhar com a queda no turismo
Foto: The New York Times

Incapaz de encontrar um segundo trabalho, ela prevê que, computados os impostos, sofrerá prejuízo de US$ 1 mil nos meses do verão norte-americano.

"Pensei que voltaria com dinheiro para comprar um carro ou para sair à noite", diz. "Mas agora, quando voltar para a universidade, vou ter de encontrar emprego à noite".

O desastre já está em curso há nove semanas, e a história de Damian oferece uma indicação de que até onde se estende a sombra do vazamento. Para além das comunidades pesqueiras e da fauna devastada pela contaminação, seus efeitos atingem populações em toda a costa do Golfo do México. Todo mundo por aqui, ao que parece, tem uma versão pessoal de desastre a revelar.

O Conselho de Intercâmbio Educativo Internacional, uma organização sem fins lucrativos que encontrou trabalho para Damian junto a uma empresa que aluga apartamentos de férias, a Brett/Robinson, informa que 78 estudantes estrangeiros para os quais havia encontrado empregos os perderam devido ao vazamento. Deles, 65 conseguiram encontrar outros postos.

Mas a maioria dos estudantes depende de um segundo emprego para equilibrar ganhos e gastos, diz Judi Saxon, da Brett/Robinson, e estes também estão escassos. Um grupo de 11 estudantes de Hong Kong chegou ao Alabama e descobriu que os empregos que tinham arranjado estavam cancelados; um dia mais tarde, haviam conseguido encontrar trabalhos de verão em Mount Rushmore, Dakota, e fretaram um ônibus para a viagem.

Para Damian, que no ano passado passou suas férias de verão trabalhando em dois empregos no Texas, o vazamento significou limitações para as extravagâncias de verão.

"Fui ao Walmart e gastei US$ 1 em ovos, US$ 1 em feijão, US$ 1 em pão", disse. "Mas ainda assim estou no prejuízo. Se não fosse o vazamento de petróleo, voltaria para casa com US$ 3 mil".

No entanto, ela tenta encarar a situação de forma filosófica: "Sei falar o inglês do Texas", ela afirmou. "E agora sei o inglês do Alabama".

Paisagens marinhas e manchas oleosas

Como muitas outras cidades costeiras, Fairhope, na baía de Mobile, Alabama, abriga uma colônia de artistas que ganham a vida pintando paisagens costeiras, o mar, os alagadiços. Mas como retratar uma paisagem que se parece cada dia mais a um local de vazamento tóxico?

"Na tarde de ontem, quando saí, a cena era bonita na costa da baía, com a luz refletida nas águas", disse Ron Thomson, 34 anos, em pé ao lado de um cavalete que sustentava uma tela em progresso, na Lyons Share, uma das sete galerias de arte da cidade. "E saber que existe um desastre à espera é como um soco no estômago. Você encontra aquele espaço de criação em seu interior, mas de repente se vê lançado para fora dele e pensa, nossa, o desastre no Golfo do México".

Jo Patton, que pinta paisagens da baía desde 1978, afirma que ignora as barreiras de proteção flutuantes, quando desenha seus esboços.

GiGi Hackford, organizadora de uma coletiva com 40 artistas na Fairhope Artist Gallery, diz que agora está pintando melancias e alcachofras. "Fico imaginando que as pessoas provavelmente não querem ser lembradas da mancha, e que prefeririam comprar um quadro mostrando frutas do que imagens de uma praia antes da mancha", diz.

Thomson diz que tenta não pensar sobre o vazamento ao pintar, mas em um quadro recente que mostrava uma borboleta, desenhou manchas oleosas e escuras nas bordas. "Estava tentando escapar à realidade da baía e pintar formas belas", conta, "mas elas acabaram por tomar o controle".

Cuidado, surfistas

Em Pensacola Beach, Flórida, Bob Cramer vem acompanhando o progresso de um sistema tropical de tempestades identificado como Invest 92, e imagina se ele chegará ao Golfo do México.

Tempestades tropicais e furacões poderiam agravar ainda mais os danos causados pelo vazamento de petróleo. Mas, para surfistas como Cramer, tempestades podem oferecer algumas das raras ondas fortes vistas no golfo - horas ocasionais de ondas boas em uma semana de mar parado.

"Usualmente, a essa altura do ano começo a marcar meus dias de trabalho com uma semana de antecedência", diz Cramer. "Tivemos dias de bom surfe com o Katrina e o Rita. Mas agora não dá para dizer que vou entrar na água. De modo algum, se houver petróleo".

Para Kaipo Robello, 41 anos, também surfista, a situação deprime. "Vivo no pior lugar do mundo para o surfe", diz. "E agora até isso vai ser tirado de nós".

Ele pensaria em surfar no petróleo? "Vou ficar na água até começar a ver a mancha", diz. "Mas nem todo mundo pensa o mesmo. Eu sou um surfista veterano, afinal".

"Solução miraculosa"? Ainda não

Em Gulf Shores, Alabama, o prefeito Robert Craft está enfrentando outro tipo de onda: os inventores e empresários que chegam à costa com produtos como bactérias devoradoras de petróleo e feno absorvente que alegam capaz de bloquear ou remover o petróleo.

"Recebi de 30 a 50 e-mails e telefonemas de pessoas que oferecem produtos", disse Craft, também agricultor. "Há tantos deles que decidi me excluir da conversa. Não temos capacidade técnica na prefeitura para determinar se os métodos funcionam ou não".

Outros dirigentes e organizações locais recebem telefonemas semelhantes. Bethany Kraft, diretora executivas da Fundação Costeira do Alabama, um grupo ambientalista, diz que sua oferta preferida envolvia pedido de verba de US$ 15 mil e um helicóptero para demonstrar o produto.

"Creio que eles sejam todos oportunistas", afirmou Craft. "Ou viram maneira de ajudar a resolver o problema, o que apreciamos, ou de ganhar dinheiro com ele, o que compreendemos. Espero que alguém desenvolva uma solução milagrosa. Mas seria melhor que parassem de me ligar e procurassem a BP diretamente".

Tradução: Paulo Migliacci

The New York Times
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