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Oriente Médio

Livro conta divórcio de menina de 10 anos no Iêmen

2 nov 2009 - 06h35
(atualizado às 08h53)
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A jornalista e escritora franco-iraniana Delphine Minoui conta em um livro a história de Nojoud Ali, uma menina iemenita de 10 anos que foi a um tribunal e obteve o divórcio do marido, mais de 20 anos mais velho que ela, com a ajuda e determinação do juiz.

Nujood Ali (esq.) e Shada Nasser (dir.), advogada da menina, recebem o prêmio Glamour Women of the Year de 2008, em Nova York
Nujood Ali (esq.) e Shada Nasser (dir.), advogada da menina, recebem o prêmio Glamour Women of the Year de 2008, em Nova York
Foto: Getty Images

Em entrevista, a autora explica que a história contada no livro Moi Nojoud 10 Ans Divorcee (Eu Sou Nojoud, 10 Anos e Divorciada, em tradução livre) é a prova de que, apesar da permanência destas práticas, que atentam contra os direitos mais elementares da infância e das mulheres, "há esperança" para as meninas que são obrigadas a se casar.

"Apesar de seu caso ser trágico, assim como, infelizmente, da metade das meninas do Iêmen, a coragem da pequena" foi o que incentivou Minoui a escrever o livro, conta.

A menina "quebrou um tabu e foi se refugiar em um tribunal para pedir o divórcio, depois que a casaram com um homem 30 anos mais velho, que abusava sexualmente dela".

"Teve a sorte de encontrar um juiz que aceitou ouvi-la, que se comoveu com sua história e prometeu ajudá-la, advertindo, no entanto, que a vitória não era certa", conta a escritora, cujo pai é iraniano e que vive no Líbano.

Cumprindo o prometido, "o juiz se mobilizou, contratou uma advogada especialista em direitos das mulheres, que divulgou o caso à imprensa e pressionou para que Nojoud recebesse o divórcio".

"Segundo estatísticas que encontrei na Universidade de Sana (capital do Iêmen), mais da metade das meninas no Iêmen se casa antes dos 18 anos e é comum ver menores de 11, 12 ou 13 anos carregando os filhos nos braços", narra.

De acordo com a jornalista, "isso faz parte da normalidade, não só no Iêmen, mas também em países como Afeganistão, Egito e outros da região", onde muitas vezes se impõe a lei do silêncio e transforma o tema em tabu.

No entanto, afirma que "o fabuloso por trás da tragédia de Nojoud é que há esperança, porque ela ousou fazer o que nunca ninguém tinha feito antes", como conta o livro, já traduzido para mais de 20 idiomas.

Para a jornalista, as dificuldades da vida das mulheres nesta região do mundo são devido a vários fatores, "entre eles, o religioso, já que, em muitos países, as leis são inspiradas na lei islâmica, ou sharia".

"Mas é um clichê atribuir a situação da mulher apenas à religião, já que existe também o fator tribal, onde prevalece a questão da honra, principalmente nas aldeias, onde e mal visto que uma menina cresça sem se casar", explica.

"Temem que brinque com outras crianças, que seja sequestrada por um homem, que tenha relações - não necessariamente sexuais - antes do casamento, por que estas coisas sujariam a honra da família, da tribo e do bairro", afirma a jornalista.

Outro fator para explicar os casamentos com meninas menores de idade é a pobreza.

"Tomemos o caso de Nojoud. Seu pai está desempregado, casou-se duas vezes e tem 16 filhos. Para ele, casá-la é livrar-se de uma carga, é uma boca a menos para alimentar", diz.

A educação também tem papel crucial e Minoui ressalta que o fenômeno acontece no Afeganistão ou no Egito, mas não no Irã - por exemplo -, onde a mulher tem acesso à educação.

"Mais de 90% das mulheres são escolarizadas e, com isso, já conseguiram a primeira etapa para sua liberdade e emancipação", opina.

Assim, "inclusive jovens de meios tradicionais, que vão ao colégio e à universidade, aprendem a refletir e a reivindicar seus direitos".

"Sem educação e sem consciência de seus direitos, quando um pai diz à filha que esta se casará amanhã, ela não sabe que tem direito de dizer não. A mulher é submetida e vê que a mãe e as irmãs maiores tiveram o mesmo destino", conta.

Mas há pessoas que lutam ativamente contra esta prática, mas, às vezes, a um preço muito alto.

"As mulheres que trabalham nas ONG são ameaçadas de morte, são emitidas fatwas (éditos religiosos) contra elas, acusam-nas de serem manipuladas pelo Ocidente e muitas acabam por abandonar", conta.

Além disso, a jornalista fala que, muitas vezes, "as autoridades não fazem fada para que as meninas tenham acesso à educação ou aos serviços de saúde. A maioria delas dá à luz em casa e o planejamento familiar é nulo".

No entanto, "o caso de Nojoud, que apareceu na imprensa local e nas televisões, contribuiu para que as coisas comecem a mudar, mas de modo muito lento".

Depois de Nojoud, outras menores de entre 10 e 11 anos no Iêmen obtiveram o divórcio.

"Isso é encorajador. Na Arábia Saudita, uma menina era casada com um homem 50 anos mais velho, mas a mãe soube do caso de Nojoud e pediu o divórcio para a filha, e conseguiu", afirma Minoui.

EFE   
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