Milhares de jovens guerrilheiros chegaram a Manágua em 19 de julho, apoiados por centenas de milhares de nicaragüenses que sonhavam com democracia, igualdade e justiça social, depois de anos de ditadura da família Somoza. A revolução sandinista, que recebeu um forte apoio no mundo inteiro, prometia ajudar os mais pobres, dando-lhes terra, trabalho, educação, moradia e saúde.
Neste contexto, se inscreviam a reforma agrária e urbana da propriedade, a cruzada pela alfabetização, e a diminuição da mortalidade infantil. Estas mudanças se baseavam principalmente no controle do Estado sobre as formas de produção.
No entanto, a poucos meses do triunfo, apoiado inclusive pelo ex-presidente americano Jimmy Carter, os nove comandantes da Direção Nacional da Frente Sandinista de Libertação Nacional (FSLN) definiram um projeto estatal e socialista. Uma aliança com os empresários foi quebrada, a revolução entrou em conflito com a influente Igreja Católica, expropriou os camponeses e coletivizou as terras, e teve de enfrentar os Estados Unidos. Assim, começou a se desenhar a contra-revolução.
"Foi um processo intenso e contraditório, por tocar nas fibras mais sensíveis da sociedade", afirmou o ex-vice-presidente sandinista e escritor Sergio Ramirez. "O pior que fez a revolução foi ameaçar tomar a propriedade não somente dos grandes proprietários e fazendeiros, como também a de qualquer pessoa que possuísse algo. Foi este fato que dividiu o país ao ponto de atiçar a guerra civil", explicou Ramirez. "O que aconteceu foi uma guerra de camponeses, desatada pelo fator propriedade", sustentou o escritor.
A contra-revolução armada começou a surgir em 1981, alimentada por centenas de camponeses. O governo respondeu formando um enorme exército com maiores de 16 anos. A administração do então presidente americano Ronald Reagan não tolerou o alinhamento dos sandinistas nas posições de Cuba, e incentivou, financiou e armou a contra-revolução para derrotar o governo liderado por Daniel Ortega.
A economia começou a entrar em colapso, e a guerra civil a dizimar a juventude do país. Todos estes fatores levaram à derrota eleitoral da revolução, em 1990.
O escritor, agora retirado da vida política, considera que não se pode julgar a revolução com base em seus resultados materiais, já que a filosofia de livre mercado e privatização proclamada em seguida também não resolveu os problemas da Nicarágua. Vinte e cinco anos depois, 70% da população de 5,2 milhões de habitantes vivem na pobreza e sofrem com a fome, desemprego e desesperança que os leva a emigrar a outros países para tentar melhorar sua situação.
A revolução foi uma etapa de "luzes e sombras, acertos e erros". "É difícil afirmar se as coisas poderiam ter sido diferentes, porque estávamos então marcados pela arrogância do poder e pela inexperiência", declarou como autocrítica o comandante Tomás Borge.
O líder de 74 anos, único sobrevivente dos fundadores da FSLN e considerado um dos mais radicais dentro do Partido, rejeitou as críticas segundo as quais o comando revolucionário acabou com as esperanças despertadas pela revolução sandinista. "Fomos derrotados por um poder imenso, o dos Estados Unidos, e por nossos próprios erros", que limitaram as possibilidades de promover maiores transformações no campo econômico e social. Para Borge, a obra revolucionária "está inacabada". "Aquela revolução plantou uma semente, que ainda não deu seus frutos", sustentou.
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