PUBLICIDADE

Mundo

IDH melhora em 2014, mas crise longa ameaça avanço

14 dez 2015 - 06h40
(atualizado às 08h09)
Compartilhar
Exibir comentários

Apesar da piora da economia nos últimos anos, o Brasil continuou melhorando seu Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) ─ indicador calculado anualmente pela ONU (Organização das Nações Unidas) que serve como um parâmetro de bem estar da população.

No entanto, um dos componentes do índice deu seu primeiro sinal de piora em 2014 – após anos consecutivos de alta, a renda média do brasileiro teve uma queda de 0,74% na comparação com 2013, passando de US$ 15.288 para US$ 15.175 (entenda ao final da matéria o cálculo que é feito pelo princípio de "paridade de poder de compra").

O IDH é medido a partir de quatro indicadores: esperança de vida ao nascer; expectativa de anos de estudo ; média de anos de estudo (da população até o momento); e renda nacional bruta per capita (toda a renda do país dividida pelo número total da população).

Como os três primeiros indicadores continuaram melhorando, o IDH brasileiro passou de 0,752 em 2013 para 0,755 no ano passado.

Quanto mais perto de 1, melhor. No topo do ranking de 188 países, está a Noruega (0,944), e na lanterna, o Níger (0,348).

Já o Brasil caiu no ano passado uma posição no ranking ─ da 74ª para a 75ª ─ ao ser ultrapassado pelo Sri Lanka, um país insular ao sul da Índia. Isso aconteceu porque o Sri Lanka melhorou seu IDH em 2014 num ritmo um pouco mais veloz, passando de 0,752 para 0,757.

A coordenadora do Relatório de Desenvolvimento Humano (RDH) no Brasil, Andrea Bolzon, observa que a variação de uma posição em um ano não é relevante, pois a diferença entre países com pontuação muito próxima é bem pequena.

No entanto, trata-se da reversão de tendência, já que o país vinha subindo no ranking. Na comparação com 2009, o Brasil ainda ganha três posições, pois ultrapassou no período Azerbaijão, Jamaica, Jordânia e a República da Macedônia ─ que na ONU é oficialmente chamada de Antiga República Iugoslava da Macedônia.

O bom desempenho que o Brasil acumula nos últimos anos pode ser ilustrado na comparação com seus vizinhos: o país teve o maior crescimento de IDH da América do Sul entre 1990 e 2014.

Mas a crise afetou o IDH do Brasil?

A coordenadora do Relatório de Desenvolvimento Humano (RDH) no Brasil, Andrea Bolzon, avalia que a crise ainda não teve impacto significativo no IDH do país, mas avalia que é possível que isso aconteça caso a recessão econômica se agrave e perdure por mais anos.

Ela explica que o IDH é um índice estrutural, ou seja, que capta mais mudanças de longo prazo. Isso ocorre principalmente por causa dos indicadores de expectativa de vida e educação. Já o indicador de renda é o que apresenta mais variação de um ano para outro, respondendo mais rápido a mudanças de curto prazo na economia.

"Quem sabe até onde vai essa crise? Ninguém sabe ainda. Pode afetar (o IDH), mas não se for uma crise de um ano ou dois (apenas). Nenhum país dorme numa posição e acorda na outra. É um processo mais lento", explica Bolzon.

"Se a economia se recupera desse ano para o próximo, vamos supor, a tendência é que não afete (o índice) porque não vai dar tempo de afetar a expectativa de vida das pessoas ou quanto as pessoas vão estudar", acrescenta.

Bolzon explica como uma crise econômica mais prolongada pode ter impacto de reduzir o IDH. A média de anos de escolaridade pode cair, por exemplo, se mais jovens pararem de estudar cedo para começar a trabalhar e complementar a renda da família. Esse tipo de fenômeno pode acontecer caso a renda caia muito e os pais não consigam mais sustentar a família apenas com seus salários.

"Se a crise se prolonga e se acentua por mais tempo, como o que ocorreu nos anos 80, aí nós podemos ter uma modificação no IDH. Se um país tem dez anos de recessão econômica, por exemplo, é claro que vai afetar a expectativa de vida das pessoas, porque a pobreza vai provocar piores níveis de nutrição, pior (serviço de) atenção de saúde. Aí você vai ter aumento da mortalidade infantil e de toda as taxas de moralidade".

Mas nada disso é imediato, lembra Bolzon, ressaltando que não é prudente relacionar a atual crise política com variação do IDH em 2014.

"O que a gente fica preocupada é de as pessoas fazerem um ligação muito direta com contexto de crise política, com as pedaladas fiscais, com esse tipo de coisa que é muito conjuntural e muito pontual agora".

Bolsa Família

A coordenadora da ONU destacou a importância dos programas de transferência de renda para proteger os mais pobres do impacto da crise. O Brasil é um dos países mais citados no relatório, tendo recebido dez referências, sendo três sobre o Bolsa Família.

O programa vem sendo preservado dos cortes de gastos, mas o relator do Orçamento de 2016, deputado Ricardo Barros (PP-PR), defende uma redução de R$ 10 bilhões na previsão de recursos para o próximo ano, sob a justificativa de que há fraudes no Bolsa Família e de que é preciso diminuir despesas para voltar a ter saldo positivo nas contas federais. Este ano de 2015 será o segundo seguido de déficit, ou seja, em que o governo gasta mais do que arrecada e acaba se endividando mais.

O corte proposto representa uma redução de 35% da previsão original do governo, diminuindo os recursos reservados para o Bolsa Família de R$ 28,2 para R$ 18,2 bilhões.

O Ministério do Desenvolvimento Social diz que, caso se confirme, esse corte vai provocar a saída de 23 milhões de pessoas do programa, levando 8 milhões de volta à pobreza extrema.

"O relatório reconhece esses programas de proteção social, de transferência de renda como importante para aumentar a resiliência das famílias (em momentos de crise)", observou Bolzon.

A ONU também divulgou no relatório do IDH o dado mais recente para o Índice de Pobreza Multidimensional, que é calculado apenas para países em desenvolvimento. No caso do Brasil, esse índice vem recuando nos últimos anos e ficou em 0,011 em 2013, dado mais recente que acaba de ser divulgado. Esse nível está abaixo do de países como México (0,024), China (0,023), África do Sul (0,041) e Índia (0,282).

Nesse caso, quanto menor o índice, menor a pobreza multidimensional, que é calculada usando indicadores de educação, saúde e acesso a serviços básicos (banheiro, eletricidade, água, etc).

Renda

A ONU não divulgou suas estimativas para renda dos países em todos os anos desde o início do cálculo do IDH, por isso não é possível saber desde quando não havia uma queda como a registrada em 2014.

Em todo caso, é possível dizer que o resultado acumulado nas últimas décadas é de crescimento.

A renda que a ONU estima em "paridade de poder de compra" para o ano passado, de US$ 15.175, é 5% maior que a de 2010 (US$ 14.420), 36% superior que a de 2000 (US$ 11.161) e 45% acima do primeiro dado disponível, de 1980 (US$ 10.457).

Para comparar a renda média de todo os países, a ONU utiliza o dólar internacional em paridade de poder de compra. Esse dólar é estimado fazendo uma comparação entre preços de produtos e serviços em diferentes países e nos Estados Unidos. É uma outra moeda, diferente da cotação comercial do dólar.

"O objetivo é ter uma moeda que reflete melhor o bem estar da sociedade, pois um dólar americano, em geral, compra mais coisas em países pobres do que nos países desenvolvidos, onde os serviços costumam ser mais caros", explica o economista José Mácio Camargo, professor da PUC-Rio.

BBC News Brasil BBC News Brasil - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização escrita da BBC News Brasil.
Compartilhar
Publicidade
Publicidade