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Mundo

"Likvidators", os heróis esquecidos de Chernobyl

20 abr 2011 - 13h36
(atualizado às 15h50)
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Cada vez mais diminui o número de "likvidators", os heróis que serviram de escudo humano em Chernobyl há 25 anos ao apagarem com camisas de manga curta o incêndio e taparem as brechas que lançavam radioatividade ao ar do quarto reator da usina nuclear.

"Os liquidadores são heróis, assim como os veteranos de guerra. Muitos deles foram submetidos durante dias a altas doses de radiação, o que causou invalidez e, mais tarde, morte", afirmou à Agência Efe Viacheslav Grishin, presidente da União Chernobyl da Rússia (UCR).

Ao contrário dos operários da central japonesa de Fukushima, os "likvidators" (liquidadores) soviéticos não dispunham de equipamentos à prova de fogo, máscaras, luvas ou botas especiais para se proteger da radiação.

"Essas dezenas de milhares de pessoas trabalharam na zona de exclusão de 30 quilômetros em volta da central de Chernobyl para salvar o mundo de uma catástrofe de grandes dimensões", disse Grishin.

O presidente da UCR aludia aos engenheiros, técnicos das companhias do setor atômico, militares, policiais, civis e universitários que foram mobilizados pela União Soviética para frear o avanço da radiação e apagar suas sequelas, muitas vezes utilizando pás e rastelos.

"Alguns construíram o sarcófago, outros se ocuparam de desativar os edifícios adjacentes, de limpar os povoados da região e alguns receberam como missão o extermínio de toda vida selvagem, desde ratos a coelhos, que pudessem transmitir a radiação", acrescentou.

Um deles foi Victor Birkun, um bombeiro ucraniano que trabalhou na usina entre 1976 e 1987, e que morreu há apenas dois meses, aos 61 anos de idade, após uma operação no coração.

"Na Ucrânia, nessa época do ano já faz bastante calor, por isso fomos apagar o incêndio vestindo camisas de manga curta. Não dispúnhamos nem de capacetes, nem de trajes à prova de fogo", relatou Birkun a Efe há cinco anos.

Ele e outros 27 bombeiros descansavam em um barracão a 150 metros do reator número quatro da usina nuclear ucraniana quando aconteceu a sequência de explosões, no fatídico dia 26 de abril de 1986.

Apesar de seu heroísmo, Birkun teve uma vida difícil e apenas conseguiu que o Estado reconhecesse seu direito a uma pensão por invalidez há menos de três anos.

"Meu marido não só acabou com o incêndio de Chernobyl, mas também conseguiu vencer o sistema. Demonstrou que o Estado não protege os liquidadores. O triste é que pouco depois de ganhar o julgamento, seu coração parou", desabafou à Efe sua esposa.

Grishin apontou que o Estado russo "reconhece os liquidadores de Chernobyl como um coletivo jurídico", como ocorre com os veteranos da guerra contra a Alemanha nazista ou da guerra do Afeganistão.

"No entanto, há muitas condições impostas. Se uma pessoa perdeu o documento que certifica que trabalhou como liquidador, deve apresentar um atestado médico e duas testemunhas, que devem ser antigos liquidadores. É muito complicado", acrescentou o presidente da UCR.

Recentemente, o Estado russo aprovou um programa para melhorar as condições de habitação dos liquidadores, mas diminuiu consideravelmente a ajuda econômica que os permitia custear seu tratamento médico.

"O nível de mortalidade entre os liquidadores é muito alto e o Estado é muito lento. A maioria quase não chega a desfrutar das pensões", relatou Grishin.

Por outro lado, a UCR acusa a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) de minimizar o número de mortes causadas pela radiação lançada por Chernobyl.

"A AIEA afirma que em torno de mil pessoas morreram devido ao impacto direto da radiação em seu organismo. No entanto, os exames médicos estabeleceram que mais de sete mil pessoas morreram devido aos vazamentos de Chernobyl", disse.

Grishin lembrou que até a queda da União Soviética em 1991 ninguém se preocupou com os mortos de Chernoby e foram 50 anos nos quais "muitos liquidadores sofreram infartos, embolias ou se suicidaram".

Além disso, estimou em mais de 62 mil o número de liquidadores que Chernobyl condenou à invalidez, seja por amputações ou problemas respiratórios.

"As sociedades russa, ucraniana e bielorrussa reconhecem a façanha dos likvidator. Mas o Estado não os recompensa na medida certa. As medalhas não garantem uma vida digna. É uma grande injustiça", sentenciou Grishin.

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), só na Ucrânia, Rússia e Belarus pelo menos cinco milhões de pessoas foram afetadas pela radiação de Chernobyl.

EFE   
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