O jornal francês Le Monde publicou neste sábado parte das escutas telefônicas ordenadas pela justiça que levaram os instrutores do caso a acusar o ex-presidente da França Nicolas Sarkozy (2007-2012) por corrupção.
A publicação divulga uma série de conversas gravadas entre Sarkozy e seu advogado, o também acusado Thierry Herzog, nas quais falam de promover um alto magistrado, em troca de filtragens sobre as instruções que pesam sobre o ex-chefe do Estado.
Os juízes ordenaram que o telefone habitualmente usado pelo ex-presidente fosse grampeado, mas Sarkozy também adquiriu posteriormente um novo usando um pseudônimo e com o qual se comunicava com seu advogado de maneira mais aberta sobre um possível empurrão à carreira do magistrado Gilbert Azibert, também acusado.
Este último, segundo é possível deduzir nas conversas, informava a Sarkozy e seu entorno de instruções sob segredo de justiça em troca que facilitassem sua aposentadoria em um posto em Mônaco.
"Ajudarei", disse em 5 de fevereiro o ex-presidente ao advogado na linha que utilizava com um nome falso, a quem Sarkozy acrescentou: "Me liguem para me ocupar disso porque vou a Mônaco e verei o príncipe".
Duas semanas depois, Sarkozy disse a seu advogado que podia telefonar ao magistrado e avisar que se reuniria "com o Ministro de Estado amanhã ou depois de amanhã".
Um dias depois, o político conservador voltou a chamar advogado e a polícia gravou Sarkozy citando diretamente o magistrado. "Queria dizer, para que avise Gilbert Azibert, que tenho uma reunião ao meio dia com Michel Roger, o ministro do Estado de Mônaco".
Em 26 de fevereiro, e pela linha "oficial" do ex-presidente, à qual os juízes instrutores acham que Sarkozy sabia que era grampeada, Sarkozy deu marcha à ré.
"Me dei conta de que seria um pouco ridículo, portanto prefiro não falar disso", disse em conversa que ambos repetem minutos depois através da segunda linha telefônica, sempre segundo o jornal.
O Le Monde acrescenta que o ministro do Estado de Mônaco confirmou aos juízes instrutores que Sarkozy ligou para ele em 25 de fevereiro, mas que não citou o nome do magistrado.
O chamado "caso das escutas", pelo qual Sarkozy é acusado e que pode ser condenado a uma pena máxima de dez anos de prisão, deriva de uma investigação sobre um suposto financiamento ilegal da campanha que o levou à presidência em 2007 com dinheiro negro do deposto ditador líbio Muammar Kadafi.
Após passar 15 horas prestando depoimento, Sarkozy concedeu uma entrevista na qual qualificou como "grotescas" as acusações que pesam contra ele, por corrupção ativa, tráfico de influência e encobrimento da violação do segredo de justiça.
O ex-presidente da França Nicolás Sarkozy foi detido pela polícia nesta terça-feira, perto de Paris, para ser submetido a um interrogatório por um caso relacionado a tráfico de influência e violação do sigilo da investigação. A detenção de Sarkozy é uma medida inédita para um ex-chefe de Estado francês. Veja a seguir outras polêmicas envolvendo o ex-presidente:
Foto: Ben Stansall / AFP
Em 2013, Nicolas Sarkozy foi acusado de ter recebido dinheiro do ditador líbio Muamar Kadafi para sua campanha à presidência da França em 2007. Segundo uma fonte do regime deposto, o ex-presidente teria embolsado US$ 50 milhões. Logo após ter sido eleito, Sarkozy defendeu Kadafi, afirmando que ele não era considerado um ditador no mundo árabe. "Kadafi é o chefe de Estado há mais tempo no poder na região, e, no mundo árabe, isso é importante", disse o presidente à época. Mais tarde, Sarkozy apoiou a ação militar que culminou com a queda e morte de Kadafi
Foto: Eric Ryan / Getty Images
Sarkozy também foi acusado de abuso de incapaz por ter supostamente se beneficiado da fortuna da herdeira da gigante mundial dos cosméticos L'Oreal, Liliane Bettencourt. Um tribunal concluiu que o marido de Carla Bruni tirou proveito, em 2007, da saúde frágil de Bettencourt, que sofre de demência, para conseguir doações em dinheiro feitas por ela para sua campanha à presidência na mesma época. De acordo com os dados do processo, a bilionária teria feito doações ilegais de altas somas em espécie para ele
Foto: Eric Feferberg / AFP
Logo que Sarkozy assumiu o poder, os franceses passaram a ver o presidente em revistas de fofocas exibindo seu gosto pelo luxo. Em 2009, uma viagem de Sarkozy com Bruni ao México levantou uma polêmica sobre o excesso do presidente. Antes de iniciar a visita oficial ao país, o casal passou o fim de semana em Manzanillo, no sul do México, hospedado no hotel El Tamarindo, pertencente ao milionário Robert Hernandez Ramirez, suspeito de ligações com o narcotráfico. Diversos sites e revistas francesas questionaram quem havia bancado o fim de semana presidencial, avaliado em 50 mil euros. O governo francês afirmou que o convite foi feito pelo presidente do México à época, Felipe Calderón que por sua vez, informou que a visita foi promovida por empresários locais
Foto: Nasser Nasser / AP
Em 2010, o governo francês enfrentou uma onda de críticas externas e internas pela compra excessiva de vacinas contra a gripe suína (H1N1). O caso motivou, inclusive, uma demanda de investigação parlamentar. Na época, Sarkozy comprou 10% das vacinas de todo o mundo. Apesar de a França encomendar 94 milhões de doses de vacinas, somente 5 milhões de cidadãos foram vacinados no país, que teve de lidar com problemas logísticos. A oposição afirmou que Sarkozy ajudou os laboratórios farmacêuticos a lucrar
Foto: Benoit Tessier / AFP / Getty Images
Em 2012, Sarkozy e a mulher, Carla Bruni, compraram, por 5 milhões de euros, um palácio na cidade marroquina de Marrakech. A residência possui oito suítes de luxo, um spa, uma piscina de 21 metros e um jardim com 600 espécies diferentes de rosas. A operação de compra, no entanto, levantou dúvidas. Alguns dizem que o palácio seria um presente do rei rei Mohammed ao casal, que se hospedou na casa do monarca por duas vezes em visitas durante o mandato de Sarkozy. Outros afirmam que a residência seria um presente de um rico empreendedor imobiliário do Catar
Foto: Benchris / AP
Outra polêmica que rondou Sarkozy após a saída do governo foi em torno do seu patrimônio. Em uma declaração que assinou ao oficializar sua intenção de concorrer novamente ao cargo, o francês afirmava ter patrimônio de US$ 3,3 milhões, US$ 814 mil a mais do que tinha quando entrou na Presidência. Sarkozy, no entanto, se adiantou e explicou que o aumento dos bens se deu principalmente por meio de investimentos feitos antes de ser eleito, em 2007
Foto: Yves Herman / Reuters
Nicolas Sarkozy já era presidente de França quando, em 2007, se divorciou de Cecilia Ciganer-Albéniz, em um conturbado processo. Eles eram casados desde 1996. Em 2005, quando Sarkozy era ministro do Interior da França, os jornais publicaram notícias de que Cécilia teria abandonado o marido por um produtor marroquino e que o presidente teria um caso com uma jornalista. Mas o casal continuou junto até as eleições, em maio de 2007. Sarkozy foi o primeiro presidente francês a se divorciar enquanto ocupando o cargo
Foto: Francois Mori / AP
Ainda em dezembro de 2007, surgiram rumores na imprensa francesa afirmando que a modelo e cantora Carla Bruni estaria namorando o presidente da França. Em janeiro de 2008, os dois assumiram o namoro oficialmente, e o casal passou a viver sob os holofotes da mídia mundial. Em fevereiro de 2008, Bruni e Sarkozy se casaram em Paris. Três anos mais tarde, nascia a primeira filha do casal, Giulia
Foto: Remy de la Mauviniere / AP
Em discurso no início de 2010, Sarkozy defendeu a cassação da nacionalidade de delinquentes de "origem estrangeira", após incidentes violentos envolvendo imigrantes no sul da França - onde a morte de um homem de origem árabe que fugia da polícia provocou a revolta da população estrangeira. O presidente declarou, à época, que "a nacionalidade é adquirida e deve ser merecida". "Estamos sofrendo pelos 50 anos de regulação frouxa da imigração, que levaram a uma ausência da integração, disse, provocando a ira de intelectuais e juristas, que alertaram que a Constituição francesa garante a igualdade diante da lei de todos os cidadãos, sem distinção de origem, raça ou religião"
Foto: Gonzalo Fuentes / Reuters
No mesmo ano, a polêmica envolvendo imigrantes na França continuou. Após intensificar a expulsão de ciganos durante o verão, cercando famílias em acampamentos ilegais e oferecendo a elas incentivos financeiros para deixar o país, Sarkozy envolveu a Alemanha no debate. Para justificar suas ações, o presidente francês afirmou que o governo alemão também pretendia desmantelar acampamentos de ciganos. A chanceler da Alemanha, Angela Merkel, negou que tenha feito tais declarações e refutou os comentários de Sarkozy, causando tensão entre os dois governos. O tema dos ciganos é historicamente sensível na Alemanha, que perseguiu este povo durante o regime nazista