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Europa

Estuprado aos 6 anos, britânico escreve livro sobre abuso

Após trinta anos sem poder falar nada, James Rhodes escreverá sobre anos de abuso cometidos por professor

24 mai 2015 - 14h11
(atualizado às 14h51)
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Britânico vence batalha legal com ex-mulher e publica memórias sobre abuso sexual
Britânico vence batalha legal com ex-mulher e publica memórias sobre abuso sexual
Foto: BBC Mundo / Copyright

Entre os 6 e os 10 anos, o hoje pianista James Rhodes foi vítima de abuso sexual cometido por um professor e não pôde falar nada. Trinta anos mais tarde, resolveu escrever um livro contando sua história - mas a Justiça também o impediu de falar.

Foram 14 meses de batalha judicial até que, nesta semana, ele conseguiu autorização para publicar suas memórias. A disputa ocorreu porque sua ex-mulher disse que o livro - que relata não apenas os abusos como também os problemas psiquiátricos que se seguiram - poderia traumatizar o filho do casal, de 12 anos.

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"Vítimas de abuso sexual e de doenças psiquiátricas, como eu, não têm que ter vergonha de falar. Se uma pessoa como eu, com um perfil semi-público e vários amigos famosos, levou 14 meses para contar a verdade sobre sua história, imagina as outras pessoas?", disse à BBC o aclamado músico após a decisão.

Entre os famosos que deram apoio a Rhodes está o ator Benedict Cumberbatch, indicado ao Oscar pelo filme "O Jogo da Imitação", que é amigo de infância do pianista.

"Esse homem sofreu abuso quando era uma criança e não pôde falar nada (...) e, como adulto, ao tentar contar o que sofreu, ter que experimentar de novo esse véu de silêncio, essa impossibilidade de gritar por ajuda, é estarrecedor", disse Cumberbatch.

O livro de Rhodes, cujo título em inglês é "Instrumental: A Memoir of Madness, Medication and Music", deve ser lançado no Reino Unido na semana que vem.

Abuso

Na obra, o pianista conta, com detalhes, que foi estuprado repetidas vezes por seu professor de educação física e boxe em uma escola particular de elite em Londres.

A isso seguiram-se anos de uso de drogas e álcool, comportamentos autodestrutivos, tentativas de suicídio e uma temporada de internação em um hospital psiquiátrico.

O problema piorou quando o filho de Rhodes nasceu, já que ele temia que o mesmo tipo de abuso ocorresse com a criança.

"Eu sabia que o que havia acontecido comigo foi apenas por ser criança. Parecia inevitável que coisas semelhantes acontecessem com ele. Era assim a infância: uma zona de guerra cheia de perigo, terror e dor", diz no livro, seguindo relatado pelo jornal britânico Daily Mail.

"Aquele momento - que deveria, poderia ter sido o mais feliz da minha vida - foi o início de uma descido para um tipo de loucura que eu não podia ter imaginado", completa.

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A vida de Rhodes só sofreu uma reviravolta quando ele, que havia deixado de tocar piano havia dez anos, procurou um dos maiores agentes do mundo para propor uma parceria. O agente perguntou se ele tocava e pediu que mostrasse. Fascinado, decidiu que não se tornaria seu sócio, mas faria com que Rhodes voltasse a tocar.

Ele voltou a ter aulas, com um dos mais reconhecidos professores da Itália, e se recuperou por meio da música.

Denúncia

Já conhecido, ele mencionou o abuso sexual em uma entrevista e foi procurado pela diretora da parte de ensino infantil da escola à época.

Segundo Rhodes, ela disse que sabia que "algum tipo de abuso" estava ocorrendo, mas não imaginava que era sexual. Ela contou que costumava vê-lo chorando, com sangue nas pernas, implorando para não participar das aulas de educação física.

A mulher, segundo ele, disse que procurou o diretor geral da escola, que afirmou que "o pequeno Rhodes precisava ser mais durão" e que ela deveria ignorar o caso.

Depois disso, ele foi à polícia e denunciou o professor Peter Lee. À época, ele dava aulas de boxe para crianças de dez anos.

O suspeito, que tinha cerca de 70 anos, chegou a ser preso e indiciado por abuso sexual, mas morreu antes que fosse julgado.

Liberdade de expressão

"Muitos livros e grupos de apoio sugerem que se escreva uma carta para a pessoa que nos machucou, principalmente se ela não está mais viva. De muitas maneiras, é isso que o livro é", diz Rhodes no Daily Mail.

Apesar de usar nomes fictícios para a ex-mulher e para o filho na obra, ela acabou conseguindo uma decisão judicial impedindo não apenas a publicação de partes da obra como a identificação dele na imprensa ou em redes sociais.

A ex-mulher temia que a publicação causasse "sérios prejuízos" ao filho do casal, de 12 anos, que tem síndrome de Asperger.

No julgamento na Suprema Corte, os juízes decidiram que o livro era de interesse público.

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"Uma pessoa que sofreu o que ele sofreu, e lutou para lidar com as consequências disso, tem o direito de contar ao mundo sobre isso. Há interesse público em outras pessoas poderem ouvir sobre sua história de vida com todos os detalhes", afirmaram.

Rhodes disse ao jornal britânico The Guardian que o filho não vai ler o livro agora e que acredita que o relato possa ajudar outras pessoas que passaram pela mesma situação.

"Eu nunca machucaria meu filho intencionalmente. É importante dar seu testemunho, mas também é importante passar a mensagem que coisas ruins acontecem e que nós não mentimos sobre ela, nós não escondemos, não fingimos que não aconteceu, não fazemos de tudo para apagar todas as evidências de que ocorreu, para apagar o passado", disse.

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