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Mundo

Analistas: divergências podem inviabilizar governo britânico

12 mai 2010 - 15h25
(atualizado às 15h42)
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Lúcia Müzell
Direto de Paris

Um dia depois de os britânicos enfim saberem quem será o próximo primeiro-ministro - passados cinco dias das eleições gerais do Parlamento -, a pergunta que não quer calar na imprensa do Reino Unido é: até quando dura a coalizão David Cameron-Nick Clegg, que viabilizou a saída do impasse eleitoral? Embora um contrato de coalizão tenha formalizado que a união entre conservadores e liberais-democratas deve durar cinco anos, analistas não parecem convencidos de que os dois partidos conseguirão formar uma aliança firme e duradoura.

Brown renuncia, e Cameron é novo premiê britânico:

Uma das principais razões para a fragilidade do recém inaugurado governo de Cameron é o fato de que, mesmo depois da união com os liberais-democratas, a bancada governista não atingiu a maioria do Parlamento - conseguiu 315 cadeiras, 11 a menos do que o necessário. Outra razão é que que o LibDem aceitou a coalizão, mas tem visões diametralmente opostas aos dos conservadores em pontos vitais do novo governo, como o enfraquecimento da adesão da Grã-Bretanha à União Europeia, a imposição de um limite à imigração e o corte severo dos gastos públicos, necessário, segundo os conservadores, para reduzir o déficit recorde de 800 bilhões de libras.

"As diferenças entre os dois partidos são tão profundas que é impossível não se pensar em um governo de conveniência", afirmou Vernon Bogdanor, professor de Governo da Universidade de Oxford, ressaltando que as coalizões entre conservadores e liberais-democratas no passado nunca foram longas. "Nas duas vezes em que isso aconteceu, em 1886 e 1931, os conservadores acabaram tomando conta do governo e os liberais preferiram abandonar a união a abrir mão dos seus ideais".

Além disso, lembra o especialista, os governos de minoria - como este que acaba de ser formado - também não apresentam um bom retrospecto na política britânica: em 1924 e em 1974, dois governos de minoria liderados pelos trabalhistas duraram menos de um ano.

Apesar de apresentarem um discurso firme durante as negociações que levaram à coalizão com os conservadores, os liberais-democratas tendem a ceder mais durante os primeiros meses para se manterem no poder pelo maior tempo possível e, especialmente, para tentar fazer avançar a sonhada reforma do sistema eleitoral britânico. "O Partido Liberal-Democrata está em ascensão e não vai desperdiçar o momento para se autopromover, mesmo que às custas de uma ou outra contradição em relação aos seus próprios princípios", afirmou Bogdanor.

O jogo de interesses já apresentou os primeiros resultados favoráveis ao LibDem: em troca do apoio de Nick, Cameron se comprometeu a promover um plebiscito sobre a reforma eleitoral, um ponto crucial para Clegg. Na visão do liberal-democrata, a reformulação do sistema eleitoral é a única maneira de possibilitar a ascensão dos pequenos partidos ao poder, já que o sistema atual favorece o bipartidarismo entre trabalhistas e conservadores, os dois principais do país.

Essa é a primeira vez desde a Segunda Guerra Mundial que os britânicos precisam recorrer a uma coalizão para conseguir formar um governo após uma eleição que não elegeu nenhum partido por maioria. Enfraquecido, o trabalhista Gordon Brown renunciou ontem ao cargo de primeiro-ministro e cedeu espaço para os conservadores, pondo um ponto final a 13 anos de governo de centro-esquerda.

Para Patrick Dunleavy, cientista político da London School of Economics (LSE), a coalizão deve desfrutar de uma curta estabilidade enquanto os trabalhistas não completarem a "profunda reforma interna" de que necessitam até reunirem novamente a força necessária para brigar pelo poder. "Essas eleições foram um verdadeiro fracasso para os trabalhistas, e no fundo eles já estavam estavam esperando por isso", afirmou Dunleavy, apontando a entrada do Reino Unido na guerra contra o Iraque como um ponto-chave para o início da crise do trabalhismo. "Agora, eles terão o tempo que precisam para acertar os próprios problemas e estarão em condições de retornar a 10 Downing Street o endereço dos primeiros-ministros em Londres com a legitimidade que não tinham, nem de longe, conseguido na votação da semana passada".

Além da rejeição ao trabalhismo, avalia Dunleavy, as urnas também mostraram que nenhum outro partido está suficientemente forte. "É verdade que os britânicos queriam dar o recado de que desejam qualquer um, menos Brown no poder. Mas os eleitores também deixaram claro que não apoiam massivamente nenhum outro candidato que se apresentou, o que torna o novo governo bastante limitado em termos de suporte popular".

Fonte: Especial para Terra
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