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Oriente Médio

Quais seriam as consequências de um ataque ao Irã?

7 mar 2012 - 19h32
(atualizado às 20h38)
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Jonathan Marcus
Da BBC Brasil

O Irã deixou claro que, se atacado por Israel ou EUA, responderá à altura. Mas como seria uma represália iraniana? E quais seriam as consequências, na região e no próprio Irã? Os resultados potenciais de um ataque israelense seriam sérios a ponto de tornar a ação militar a pior opção para interromper o programa nuclear iraniano?

Mulheres cobertas por véu integral procuram nomes de candidatos em lista e preenchem cédulas em estação eleitoral de Teerã. Os iranianos vão às urnas nesta sexta-feira para eleger 290 novos deputados, em uma eleição considerada como um teste de popularidade para o regime islâmico
Mulheres cobertas por véu integral procuram nomes de candidatos em lista e preenchem cédulas em estação eleitoral de Teerã. Os iranianos vão às urnas nesta sexta-feira para eleger 290 novos deputados, em uma eleição considerada como um teste de popularidade para o regime islâmico
Foto: AP

"A capacidade iraniana de atacar diretamente Israel é limitada", diz Mark Fitzpatrick, diretor do Programa de Desarmamento e Não-Proliferação do Instituto Internacional para Estudos Estratégicos (International Institute for Strategic Studies ou IISS na sigla em inglês). "Sua Força Aérea ultrapassada é completamente superada pela dos israelenses e possui apenas um pequeno número de mísseis balísticos que poderiam chegar em Israel", afirma.

Fitzpatrick diz que o arsenal balístico iraniano inclui "uma versão modificada do Shahab-3, o Ghadr-1, que tem alcance de 1,6 mil km, mas o Irã tem só seis equipamentos do tipo transportador eretor lançador (TEL na sigla em inglês) para os mísseis". "O novo míssil, o Sajjil-2, também poderia atingir Israel, mas este não está ainda totalmente pronto", afirma.

Fitzpatrick argumenta ainda que "ambos os mísseis são muito imprecisos para terem qualquer efeito em alvos militares quando armados com armas convencionais". "Eles também não são formas muito eficientes de transportar armas químicas ou biológicas e o Irã não tem armas nucleares."

Resumindo, ele acredita que "um ataque iraniano com mísseis seria apenas um gesto simbólico". Fitzpatrick acredita que é mais provável que o Irã responda a Israel "assimetricamente" e por meio de aliados como os grupos Hezbollah e o Hamas. O também xiita Hezbollah tem mais de 10 mil lançadores de foguetes no sul do Líbano, muitos deles fornecidos pelo Irã.

"A maioria é de Katyushas com alcance de 25 km, mas também Fahr (alcance de 45 km), Fajr-5 (75km), Zelzal-2 (200km) e potencialmente Fath 110 (alcance de 200 km), além de cerca de 10 mísseis Scud-D que carregam cerca de 750 kg de munição e atingiriam qualquer parte de Israel." Ele diz que o grupo palestino Hamas, que controla a Faixa de Gaza, poderia também atacar Israel com mísseis de curto alcance. O maior perigo seria a deflagração de um conflito com qualquer um destes dois grupos.

Com tanta instabilidade no Oriente Médio, incluindo a crise na Síria, há um risco real de que um ataque israelense dê início a um conflito regional mais amplo.

Mar

A Marinha iraniana e especialmente o braço naval de sua Guarda Islâmica Revolucionária são bem equipados com pequenos barcos capazes de depositar minas ou atacar embarcações maiores. O Irã tem ainda eficientes mísseis contra embarcações, baseados em solo. Eles poderiam ser usados para fechar uma artéria vital para o suprimento de petróleo, o estreito de Hormuz.

A Marinha americana tem confiança de que poderia reabrir o estreito, mas isso poderia dar início a um conflito entre EUA e Irã e, a curto prazo, teria um impacto significativo no preço do petróleo. Daniel Byman, especialista em contra-terrorismo no Instituto Brookings de Washington disse que há ainda "uma preocupação considerável de que o Irã e grupos como o libanês Hezbollah possam se dedicar a ataques terroristas após um ataque israelense".

"O Irã tem por vezes usado esse tipo de ataque contra inimigos", diz ele. Já existe, diz ele, uma guerra clandestina em andamento. "Israel e o Irã já estão se atacando (Israel com mais sucesso e foco)", explica Byman, se referindo ao assassinato de cientistas nucleares iranianos. "Não tenho certeza se Israel aumentaria esses ataques se fosse alvejado, mas o Irã sim", completa.

"Os ataques que, acredita-se, teriam sido feitos pelo Irã na Índia e Tailândia mostram que o país (persa) permanece determinado a atingir Israel, presumidamente em retaliação por Israel ter assassinado chefes do Hezbollah como Imad Mughniyeh e os ataques contra cientistas nucleares iranianos." "No entanto, esses ataques recentes não foram bem executados, sugerindo que o profissionalismo dos serviços iranianos é desigual", diz ele.

Especialistas acreditam que, de toda forma, o governo iraniano teria que medir bem sua resposta a qualquer ataque. Para Karim Sadjadpour, especialista em Irã do Instituto Carnegie Endowment for International Peace, "se a resposta for insuficiente, eles seriam humilhados, se for demasiada, seriam aniquilados".

"O Irã vai querer responder o suficiente para inflamar o ambiente de segurança regional e ter um impacto negativo na economia global, para atrair condenação internacional para Israel e os EUA, mas não fariam nada que pedisse uma resposta americana forte."

Legalidade

Após sofrer qualquer ataque, o Irã poderia obviamente buscar algum tipo de condenação na ONU. Isso levanta uma série de questões legais sobre a operação militar. Uma coisa é clara, em termos de leis internacionais, um ataque israelense ao Irã seria ilegal.

A invasão americana do Iraque gerou um conflito que custou milhares de vidas e bilhões de dólares. A professora de direito internacional na Universidade de Notre Dame, Mary Ellen O'Connell, diz que para ser considerado legal "seria necessária a autorização do Conselho de Segurança da ONU já que o Irã não lançou um ataque armado contra Israel ou os EUA".

"O regulamento da ONU deixa claro que o uso da força é proibido a não ser que um Estado aja em defesa própria em caso de ataque armado ou tenha a autorização do Conselho de Segurança". Israel, claro, alegaria estar agindo de forma preventiva contra um futuro ataque nuclear do Irã (embora ninguém ainda acredite que o Irã já tenha uma bomba nuclear), mas O'Conell diz que ainda assim um ataque israelense não seria legítimo.

"Há um intenso debate entre advogados internacionais sobre até que ponto um Estado pode responder a um ataque armado: ele deve estar acontecendo ou poderia ser iminente?" "Não há praticamente apoio nenhum de especialistas para um ataque para prevenir um hipotético ataque futuro."

Mas os países fazem o que acham que devem fazer quando seus interesses vitais estão em risco? A Otan por exemplo atacou a Sérvia e as forças sérvias no Kosovo e os EUA e seus aliados invadiram o Iraque, em ambos os casos sem a aprovação do Conselho de Segurança. O'Connell diz que em ambos os casos o uso de força custou caro. "Compare esses dois conflitos com o uso legal da força para libertar o Kuwait após a invasão iraquiana, quando os EUA saíram do conflito com ganhos morais e financeiros."

Muitos vão ainda levantar a questão das mortes causadas por um ataque israelense, sobretudo se a operação não seria sancionada por leis internacionais. Há apoio generalizado dentro do Irã ao seu controverso programa nuclear. Sem saber quais seriam o salvos, qual o momento do ataque e se eles seriam atacados mais uma vez, é difícil calcular o número de vítimas em potencial.

Especialistas dizem que o reator nuclear de Bushehr, em atividade, não deve ser um alvo militar porque ele não tem relação com o programa militar e o vazamento de radiação causaria muitas vítimas civis. Mas, obviamente que aviões podem ser derrubados e bombas ou outros disparos podem ser feitos.

Dentro do país

Há ainda as reações iranianas a um ataque. Como os iranianos responderiam? Qual o impacto sobre o programa nuclear e quais as implicações para o regime?

Atualmente, não está claro se o Irã está decidido a ir em frente com seu programa de armas nucleares. Para Trita Parsi, autor do livro que analisa a postura da administração Obama frente ao Irã (A Single Roll of the Dice - Obama's Diplomacy With Iran), se Israel atacar, a postura do Irã vai mudar consideravelmente.

"Não encontrei nenhum analista que não acreditasse que a determinação do governo iraniano e seu desejo por armas nucleares não fossem aumentar consideravelmente se o Irã for atacado", diz ele. E um ataque militar pode aumentar o apoio ao aiatolá Ali Khamenei. Ele diz que o governo americano acredita que após um ataque israelense "os iranianos vão empurrar seu programa nuclear ainda mais clandestinamente, sair (ou ameaçar sair) do Tratado de Não-Proliferaçao, chutar os monitores da Agência Internacional de Energia Atômica e se dedicar a conseguir uma bomba".

"Como dizem alguns comandantes militares americanos, bombardear o Irã é o meio mais rápido de assegurar a bomba iraniana", diz ele.

Parsi, que preside também o Conselho Iraniano Americano Nacional, diz que um evento do gênero teria implicações dentro do Irã. "O regime é muito impopular e as feridas causadas pelas violações de direitos humanos desde as eleições de 2009 ainda estão abertas e sangrando." "Mas um ataque ao Irã, especialmente se tiverem muitas vítimas civis, deve unir facções contra um agressor externo. Isto já aconteceu em 1980 com a invasão de Saddam Husseim ao Irã," diz.

Este pensamento deve inspirar cautela nos políticos ocidentais e israelenses, que de tempos em tempos flertam com a ideia de mudança de regime no Irã. Tudo sugere que mesmo um ataque militar israelense bem-sucedido contra o Irã apenas atrasaria o programa nuclear do país em alguns anos. O ataque pode ainda consolidar no Irã o desejo por armas nucleares. Pode unir a população em torno do regime. E as consequências regionais de qualquer ataque seriam consideráveis. Na pior das hipóteses, precipitaria um conflito no Golfo e nas fronteiras de Israel.

Não surpreende portanto que a administração Obama pareça tentar dissuadir Israel de qualquer ataque, pelo menos agora. Muitos analistas acreditam que as sanções ainda podem funcionar no sentido de levar o Irã a buscar uma solução diplomática.

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