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Estados Unidos

Escolha de Paul Ryan ignora poder político de latinos nos EUA

20 ago 2012 - 10h52
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Patrick Brock
Direto de Nova York

A escolha do deputado Paul Ryan para vice na chapa do candidato republicano à presidência Mitt Romney pode ser uma boa estratégia para convencer eleitores conservadores e preocupados com a economia a derrotar o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, mas também ignora os eleitores latinos, um bloco demográfico em franca expansão, que especialistas afirmam ter assumido importância crucial nesta eleição.

Paul Ryan é autor autor de vários planos para reformar as contas públicas, alguns consideradas irreais
Paul Ryan é autor autor de vários planos para reformar as contas públicas, alguns consideradas irreais
Foto: AFP

Antes de Ryan, também circulou o nome do jovem senador Marco Rubio, de ascendência cubana, como possível alternativa para ajudar os republicanos a retomar o voto dos latinos, perdido para Obama na última eleição. Romney e seus assessores acabaram optando por outra estrela em ascensão no partido, de um Estado vencido por Obama em 2008 e com aspirações de ideólogo neoliberal.

A escolha do vice na chapa presidencial americana é um acontecimento em que se coroam novos talentos políticos. O ritual culminou quatro anos atrás na ascensão de Sarah Palin, a ex-governadora do Alasca, muito menos consistente politicamente que Ryan, autor de vários planos para reformar as contas públicas americanas. Elogiados por alguns como possíveis soluções para problemas orçamentários, esses planos também já foram criticados como vagos demais e politicamente irreais, a exemplo da proposta para eliminar o atual seguro de saúde universal para os idosos, o Medicare, que consumiu em 2010 o equivalente a 3,6% do PIB americano de US$ 14,6 trilhões daquele ano.

Mas nos últimos anos a posição de Ryan sobre imigração, um tema crucial nos Estados Unidos e para sua massa crescente de eleitores latinos, se alinhou cada vez mais com a da direita nativista, embora especialistas em pesquisa de opinião digam que ele é mais conhecido pela bandeira econômica do que como contrário à imigração.

Em 2005, Ryan apoiou um projeto de lei na Câmara americana que facilitaria a trabalhadores agrícolas conseguir permissão para viver no país, com o argumento de que a natureza agrária de Estados como o seu (Wisconsin) precisa do trabalho dos mexicanos. Foi o mais próximo que ele jamais chegou do lado moderado da questão. Depois disso, Ryan se declarou a favor de transformar a imigração ilegal em crime e reforçou que é veementemente contrário a uma anistia ampla. O candidato também votou contra a lei DREAM, que criaria um caminho para a cidadania por meio da educação, voltado a ilegais que entraram no país quando eram menores de idade. A DREAM já perdeu vários votos no Congresso, o último deles em 2010.

Apesar de medidas que o aproximaram da comunidade latina nos EUA, Obama, que é advogado, manteve a fiscalização severa dos imigrantes ilegais que tem resultado em blitze a abatedouros e deportações em massa. Depois da deportação dos trabalhadores, os abatedouros muitas vezes lutam para encontrar substitutos, já que os americanos consideram o trabalho cansativo demais e o salário oferecido, baixo.

Só que, numa medida surpreendente que aumentou suas chances de reeleição, Obama decretou em 15 de junho que esses menores que entraram no país ilegalmente poderão estudar em escolas e universidades e tirar carteira de motorista, documento crucial nos EUA. Calcula-se que a medida beneficiará 1,7 milhão de jovens.

O decreto não cria um caminho para a legalização, evitando incitar polêmicas sobre anistia, mas foi bem recebido pela comunidade latina e motivou uma multidão de jovens imigrantes a formar filas quilométricas em várias cidades do país na última quarta-feira, em busca de informações do governo e de ONGs sobre como apresentar os pedidos de deferimento da deportação e de permissão de trabalho permitidos pelo decreto. Mostrando como o Partido Democrata está mais afinado com os latinos que os republicanos, um dos participantes de um evento em Chicago voltado a orientar esses imigrantes foi o senador Richard J. Durbin, autor da primeira proposta da lei DREAM, apresentada 11 anos atrás. Outros políticos democratas também participaram do evento.

Sylvia Manzano, analista sênior da consultoria política americana Latino Decisions, especializada em pesquisas de opinião com latinos, disse em entrevista ao Terra que as informações coletadas até agora indicam que o voto dos latinos será crucial nesta eleição, especialmente no Estados de Colorado, Flórida e Nevada, onde a diferença entre Obama e Romney é menor e o eleitorado latino é considerável. Dados recentes da Latino Decisions apontam também que o decreto de Obama para os jovens ilegais aumentou o entusiasmo dos eleitores latinos com o candidato.

Sylvia diz que a escolha de Ryan não devem afetar muito o que já é um cenário desfavorável para os republicanos. "Não há como Ryan piorar um quadro já ruim" disse Sylvia, que é doutora em ciência política pela Universidade do Arizona e pesquisadora das relações entre latinos e política estadual americana.

Todas as pesquisas de opinião atuais mostram Obama com ampla margem de vantagem no voto latino em relação a Romney, diz ela. A última pesquisa realizada pela consultoria com 504 eleitores latinos em 50 Estados americanos, em meados de julho, mostrou que Obama tem 70% das intenções de voto, enquanto Romney tem apenas 22% e popularidade baixa em cinco Estados vitais para a eleição.

Sylvia diz que Ryan é virtualmente desconhecido do eleitorado latino, que também já mostrou em algumas pesquisas preferir políticas diferentes das defendidas pelo deputado. Um exemplo disso é que os latinos são favoráveis à reforma da saúde aprovada por Obama, a aumentar impostos dos ricos para cobrir o déficit e culpam o ex-presidente republicano George W. Bush (66%) pelos problemas econômicos. Sylvia também nota que Ryan já votou contra o embargo a Cuba e o questionou publicamente, indo de encontro a um grupo de leais eleitores republicanos, o chamado lobby cubano-americano.

A peruana Delia Urbizagastegui, 41 anos, oito deles nos EUA, diz que o decreto de Obama para ajudar os menores de idade a se legalizarem eletrizou os jovens latinos, abrindo uma perspectiva de evolução por meio do estudo e uma oportunidade de sair das sombras. Delia diz que a imigração e a economia são as principais preocupações dos seus conhecidos. ¿Estou indo bem, mas gostaria de ter mais trabalho,¿ diz Delia, que oferece serviços de limpeza.

O curitibano André Bodowski mora há 12 anos em Nova York, se naturalizou ano passado e vai votar para presidente nos EUA pela primeira vez este ano. "Você se sente americano mesmo quando participa do processo político", diz ele, que já doou dinheiro para a campanha de Obama duas vezes. Ele se diz um tanto desiludido com o democrata, mas vai votar nele para fazer oposição aos republicanos. A chegada de Paul Ryan ao cenário político, contudo, é motivo de apreensão para André, que antes disso estava certo da vitória de Obama. "Acho que ele pode ser até presidente em 2016," opina André sobre Ryan.

Fonte: Especial para Terra
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