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Especialista holandês diz que pessoas preferem comidas com insetos

O entomologista (estudioso de insetos) holandês Arnold van Huis é um dos pesquisadores que contribuíram para o estudo da FAO recomendando o aumento do consumo de insetos

21 mai 2013 - 16h42
(atualizado às 16h43)
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A produção de insetos para a alimentação humana precisa ser incrementada. Quando for, não soará tão exótico como atualmente. É o que disse o especialista Arnold Van Huis ao Terra. Segundo ele, apesar de parecer estranho ao mundo ocidental, diversas culturas ao redor do mundo já adotam esta prática e é necessário que a produção seja barateada e aumentada para que possa se tornar uma alternativa viável à carne convencional. Ele diz, inclusive, que em um teste cego conduzido por sua equipe com almôndegas convencionais e outras feitas a partir de um tipo de inseto moído, nove em cada dez testados preferia as últimas. 

Na semana passada, a Organização para a Agricultura e a Alimentação da ONU (FAO, na sigla em inglês) divulgou em Roma um relatório incentivando a produção em largar escala de insetos como uma das alternativas para combater a fome do mundo. Após o caso ter grande repercussão, o holandês Van Huis, professor da Universidade de Wageningen e um dos principais estudiosos da entomofagia (ação de comer insetos) no mundo, conversou com Terra por Skype sobre as vantagens e os riscos envolvidos na prática. 

O professor holandês Arnold van Huis
O professor holandês Arnold van Huis
Foto: TEDxEde / Divulgação

Van Huis, que participou da conferência da FAO em Roma, afirma que, se produzidos em ambientes higiênicos, os riscos de intoxicação no consumo de insetos são mínimos. Mas faz um alerta: "não vá até o seu quintal e colete insetos".

Ele também é coautor de um livro de receitas com insetos chamado Het Insectenkookboek (O Livro de Receitas de Insetos, na tradução aproximada do holandês), atualmente disponível apenas em holandês na internet, mas que deve ganhar versão em inglês até o fim de 2013.

Leia a entrevista abaixo:

Terra - Quando você começou seus estudos na área?

Arnold van Huis - Eu tive um ano sabático na África e, entre 1995 e 2000, cerca de 400 pessoas de 22 países do continente e com frequência falávamos sobre aspectos culturais dos insetos, mas também sobre a ingestão deles. Foi nesse momento em que eu me interessei.

Terra - Qual foi a sua primeira experiência de comer insetos?

Arnold van Huis - Durante o meu estudo, eu provei tipos diferentes de insetos. Cupins, gafanhotos, etc.

Terra - E você gostou?

Arnold van Huis - Sim. Para a maioria das pessoas a primeira vez é difícil. Mas a segunda normalmente não é um problema.

Terra - O gosto é muito diferente de carne de gado?

Arnold van Huis - O gosto depende muito.  Atualmente há 1,9 mil espécies listadas (para o consumo) em nosso site. Elas são diferentes em valor nutricional, são diferentes em gosto. Eu não posso dizer que há um gosto geral para insetos. Realmente varia a cada espécie.

Terra - Quais sãos as vantagens do consumo de insetos na alimentação?

Arnold van Huis - Em primeiro lugar, nós precisamos de alternativas para a carne convencional. É uma necessidade. Porque a pecuária atual ocupa 70% de toda a terra agrícola. Há previsões de que o consumo de carne vá dobrar até 2050, então não podemos continuar só com a pecuária. As vantagens estão em uso da terra: você precisa de muito menos terra para produzir insetos do que na pecuária convencional. Você pode criá-los à base de material orgânico, até com estrume. Os insetos emitem muito menos gases de efeito estufa. Se você olhar para a produção de amônia, que vem causando a acidificação do meio ambiente, dois terços dela é produzida pela pecuária, e insetos produzem muito, muito menos. Na nutrição, é muito similar à carne convencional.

Terra - O consumo de carne vai aumentar por necessidade ou porque o padrão de vida das pessoas melhorará?

Arnold van Huis - A população mundial vai aumentar de 7 para 9 bilhões. Mas o consumo de carne não vai aumentar apenas porque teremos mais bocas para alimentar, mas também porque pessoas que melhoram de vida passam a comer mais carne. Você vê isso especialmente na China. Há 20 anos, um chinês comia 20 kg por ano. Agora come 50 kg, e provavelmente subirá para 80 kg. Então, a melhoria na qualidade de vida levará às pessoas a comer mais carne, seja pela proteína ou por questões de bem-estar.

Terra - Quais são os maiores desafios para o aumento do consumo de insetos?

Arnold van Huis - Há alguns. Ao redor do mundo, a maior parte dos insetos ingeridos é colhida na natureza. Mas se você quer promover isso, tanto como comida para humanos como para animais, você precisa de muito mais. É preciso criá-los.  O problema é a criação. Nós fazemos aqui na Holanda e é muito caro. Atualmente, eu acho que os custos trabalhistas são dezesseis vezes mais caros do que para a pecuária convencional. Então o sistema todo precisa ser mecanizado. Mas estão trabalhando nisso e acredito que os custos podem cair enormemente com a mecanização.

Outro desafio é gastronômico. Precisamos fazer os insetos serem deliciosos, especialmente no Ocidente. Há exemplos como restaurante Noma, em Copenhagen, que por três vezes seguidas foi declarado o melhor do mundo. Eu estive lá há alguma semanas e todo o cardápio tem insetos, então todo mundo que vai comer lá consome insetos.

Terra - Mas esse tipo de restaurante também não é caro?

Arnold van Huis - Esse restaurante é caro, mas é porque os insetos atualmente são muito caros. Isso significa que você pode vender apenas como iguarias, ainda não como alimentos de primeira necessidade. Para isso os preços precisam cair. Mas você também pode usar insetos para alimentar animais. E isso é um pouco diferente, porque nessa área você não precisa ter padrões muito altos para a produção. Atualmente há problemas de legislação, a União Europeia não permite que insetos sejam utilizados para alimentar animais, mas a partir de 1º de junho deste ano será permitido na criação de peixes (a aquicultura), que é uma área que está crescendo muito - 50% de todos os peixes que comemos já são criados em cativeiro. Eles são alimentados com ração para peixe e com óleos, que são encontrados nos oceanos, e isso está ficando muito caro e precisamos de uma alternativa.

Terra - Você tem alguma previsão de quando os preços cairão para a produção em larga escala?

Arnold van Huis - Eu acho que é uma questão de atenção. O que eu vejo aqui na Holanda é um crescimento exponencial no interesse. O livro que nós publicamos, Het insectenkookboek, foi baixado 2,3 milhões de vezes em 24h. É realmente incrível este interesse ao redor do mundo por esse novo 'item culinário'.

Terra - Após a divulgação o programa da FAO para a promoção do consumo de insetos, a organização foi criticada por pessoas dizendo que a fome é uma questão mais financeira do que de falta de alimentos. O que o senhor tem a dizer sobre isso?

Arnold van Huis - Eu acho que é completamente ridículo. Eu acho que esse é o maior mal-entendido no mundo ocidental, pensarmos que as pessoas nos trópicos comem insetos porque têm fome. É completamente sem sentido. Um palestrante da Tailândia disse: 'Nós simplesmente gostamos, achamos delicioso'. Até nos trópicos, até mesmo na África, eu descobri que insetos são mais caros que carne bovina, mas as pessoas preferem os insetos.

Terra - Você acredita que é possível incrementar e acelerar a produção de insetos para alimentação em países afetados pela fome em um futuro próximo?

Arnold van Huis - Na Tailândia estão trabalhando nisso. Também estão trabalhando na criação de grilos no Quênia. Então, está começando a prática de criar insetos em vez de coletá-los da natureza.

Terra - Qual o seu inseto favorito?

Arnold van Huis - Aqui na Holanda nós produzimos bichos-da-farinha, gafanhotos e larvas de besouros. Do que eu comi nos trópicos, gafanhotos e grilos sãos os meus preferidos. Mas depende muito de como são produzidos e preparados.

Terra - Você tem alguma receita especial?

Arnold van Huis - Uma delas é moer bichos-da-farinha e colocá-los em almôndegas. Nós descobrimos que as pessoas preferem almôndegas com estes insetos.

Terra - Quais você prefere?

Arnold van Huis - Bom, nós fizemos um teste em que demos almôndegas normais e outras com insetos, sem dizer que tinham insetos, e perguntamos a elas qual era a melhor. Nove em cada 10 preferiram a com insetos.

Terra - E você também pode fazer com hambúrgueres, não?

Arnold van Huis - Algumas vezes nós brincamos que um hambúrguer em 20 anos vai custar 100 euros e o BugMac, como nós chamamos, vai custar 4 euros, então as pessoas vão preferir o de insetos.

Terra - Quais são os riscos envolvidos?

Arnold van Huis - Nós fizemos um estudo sobre isso. Em primeiro lugar, os riscos são mínimos especialmente porque os insetos são taxonomicamente mais distantes dos humanos do que a carne convencional. As possibilidades de intoxicação alimentar estão mais ligadas à contaminação. Se você não criar os insetos higienicamente, eles podem pegar germes do meio-ambiente. Então você tem que ter linhas de produção com padrões de higiene. Outro risco que estamos analisando no momento são as alergias. Mas isso também não é um motivo para proibir um tipo de comida, é preciso apenas colocar na embalagem que há risco de alergia.

Terra - Quais são os riscos de coletar os insetos da natureza?

Arnold van Huis - Se você não tem experiência, não vá até o seu quintal e colete insetos. Alguns deles são venenosos. Você realmente tem que saber o que está fazendo.

Fonte: Terra
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