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Mundo

Crescem indícios de que Hezbollah ajuda governo sírio em conflito

2 mai 2013 - 09h04
(atualizado às 09h05)
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O grupo militante xiita libanês Hezbollah há tempos vinha sendo suspeito de enviar combatentes para ajudar o regime de Bashar al-Assad, na vizinha Síria.

Inicialmente, os únicos indícios dessa colaboração eram funerais de membros do Hezbollah realizados na Síria, mas era impossível saber ao certo quanto combatentes xiitas libaneses estiveram no país ou qual seria exatamente o seu papel.

Agora, pela primeira vez, a BBC pode testemunhar o envolvimento do Hezbollah em alguns dos combates-chave com os quais o regime Assad diz estar reconquistando o controle de determinadas áreas.

E o indicativo mais claro do envolvimento do Hezbollah vem do próprio grupo.

Em um raro discurso transmitido na terça-feira, o líder do grupo, Hassan Nasrallah, declarou que "a Síria tem amigos verdadeiros que não a deixarão cair (perante) os EUA, Israel ou radicais islâmicos".

Alegando que grupos armados de oposição são fracos demais para derrubar Assad, Nasrallah afirmou que, ante a ameaça de rebeldes de capturar aldeias sob controle do governo, "é normal oferecer toda a ajuda possível e necessária para o Exército sírio".

Apoio militar e treinamento

Sabe-se que o Hezbollah vinha provendo ajuda médica, logística e prática para refugiados sírios que tentam escapar da guerra civil em seu país.

Mas, na últimas semanas, a BBC viu, em algumas áreas, combatentes do Hezbollah cruzando livre e abertamente a fronteira sírio-libanesa, dando apoio militar e treinamento para seus aliados na Síria.

No norte do Líbano, no vale Bekaa, a fronteira tradicional significa pouco para moradores locais, que há séculos fazem trocas comerciais e casam entre si. Mas, passando a fronteira, na crucial cidade síria de Quseir, estão ocorrendo algumas das mais duras batalhas da guerra civil.

Imagens e depoimentos colhidos em Quseir sugerem que o Hezbollah está cada vez mais envolvido no combate e na coordenação de milícias pró-governo, que são pouco organizadas e inexperientes.

O Exército sírio, ainda que amplo e bem equipado, está em seu limite, tentando conter uma rebelião em vários pontos do país que já dura dois anos.

Por isso, o que o Hezbollah conseguir conquistar em Quseir, na cidade próxima de Homs e nos subúrbios de Damasco, será vital para a estratégia militar síria.

Controle de fronteira

A situação do conflito está claramente em mudança. Em partes do noroeste do Líbano, ambos os lados da fronteira são controlados pelo Hezbollah e seus aliados sírios. E eles dizem estar ganhando terreno.

Com a ajuda de "comitês populares locais", a equipe da BBC conseguiu cruzar a fronteira com a Síria para conversar com Abu Mohammed, miliciano pró-governo.

Durante o breve e tenso encontro, cercado por homens armados com fuzis AK-47, ficou claro que, ao menos nesta área, o Hezbollah, o Exército sírio e as milícias ligadas a Assad operam como se fossem um só.

Ainda assim, Mohammed insistiu que o Hezbollah não está diretamente envolvido no conflito.

"Eles nos dão apoio logístico e médico e nos ajudam a reconquistar território, mas não estão combatendo", diz o miliciano, com seu rosto coberto.

Questionado quanto à preocupação de que o envolvimento de grupos libaneses como o Hezbollah desestabilizariam ainda mais as relações na frágil fronteira, ele disse: "Estamos defendendo nossa terra de rebeldes que bombardeiam nossas aldeias."

Ampliação do conflito

O temor é de que o envolvimento do Hezbollah e outras facções façam com que o conflito sírio se espalhe para o outro lado da fronteira. E isso parece já estar acontecendo.

No Líbano, a cidade xiita de Hermel tem sido constantemente alvejada por foguetes de rebeldes sírios, já que a cidade apoia o regime Assad e é acusada de enviar combatentes ao lado sírio da fronteira.

No país, nem todos apoiam o papel do Hezbollah na Síria. Abu Alawa é um idoso da aldeia que fala com carinho das relações sírio-libanesas na região antes de a guerra civil começar.

"Há mais vozes moderadas na comunidade xiita que deveriam ter um papel na resolução do conflito", diz ele. Mas sua voz é cada vez mais solitária numa região com cada vez mais tensões sectárias.

Radicalização

Assim, quanto mais o conflito sírio se prolonga, mais expostas ficam as diferenças entre sunitas e xiitas nos dois países.

Em mesquitas sunitas libanesas, jovens estão sendo radicalizados. Sobretudo em cidades como Trípoli, onde as divisões sectárias espelham as da Síria, clérigos estimulam seus seguidores com chamados à jihad (guerra santa).

Nas últimas semanas, diversos imãs fizeram chamados públicos para que jovens se alistem para o combate.

Em conversa com a BBC em Trípoli, o xeique Salem Rafii disse que a iniciativa é uma resposta necessária ao papel do Hezbollah no conflito vizinho. "Há pessoas oprimidas lá (na Síria). Mulheres e crianças estão sendo estupradas, mortas e expulsas. Então qualquer libanês deveria ir ajudá-los, e será recompensado por Deus", diz.

Com isso, o futuro do Líbano fica ameaçado pelas turbulências na Síria. Geograficamente cercado e historicamente dominado pelo vizinho maior, talvez fosse querer demais que o Líbano e suas divisões sectárias ficassem alheias aos desdobramentos sírios.

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