PUBLICIDADE

Mundo

Possível reação por resultado da eleição eleva tensão na Venezuela

4 out 2012 - 17h29
(atualizado em 12/4/2013 às 16h36)
Compartilhar
DANIEL CASSOL
Direto de Caracas

O dono do hotel em Caracas vê a movimentação de jornalistas brasileiros e se apresenta: é argentino, foi professor de teoria marxista e até esteve preso por sua participação na guerrilha dos montoneros, mas odeia Hugo Chávez. Prevê que o candidato opositor, Henrique Capriles, vai ganhar a eleição presidencial do próximo domingo por menos de um milhão de votos. Cita a violência urbana, a ineficiência do Estado e problemas na economia do país para justificar a derrota chavista. Depois que o dono do hotel sai, um funcionário se aproxima e desfaz a tese do patrão.

Fiscais da oposição fazem juramente durante ato da campanha de Capriles em Caracas: tensão pré-eleitoral
Fiscais da oposição fazem juramente durante ato da campanha de Capriles em Caracas: tensão pré-eleitoral
Foto: Daniel Cassol / Especial para Terra

"Chávez é quem vai ganhar, com mais de dez pontos de diferença."

Especial
Opositor aposenta discurso neoliberal para tentar derrotar Chávez
Chávez aposta em programas sociais para tentar reeleição

Acompanhe a campanha eleitoral na Venezuela em imagens
Conheça os candidatos que desafiam a hegemonia de Chávez

A situação ilustra a divisão social entre chavistas e antichavistas, mas expõe aquela que é a principal discussão em Caracas nos últimos dias, entre militantes políticos e eleitores em geral: quem vence a eleição e, mais do que isso, o que irá fazer a candidatura derrotada. Cerca de 18 milhões de venezuelanos estão aptos a decidir se mantêm Chávez no poder até 2021 ou interrompem a "Revolução Bolivariana".

Apesar de as pesquisas de intenção de voto darem vantagem para Chávez, a oposição vem demonstrando otimismo. Porém, não declara abertamente que pretende reconhecer o resultado a ser divulgado pelo Conselho Nacional Eleitoral (CNE), lançando suspeitas de que o governo pode fraudar a eleição. Por outro lado, Chávez diz que a melhor vacina contra supostas tentativas de desestabilização por parte da oposição é uma votação massiva no próximo domingo, para que não fiquem dúvidas.

"Este é um tema importante, porque se trata de uma eleição muito acirrada. Por isso, discute-se se haverá o reconhecimento por parte de quem for derrotado", afirma o presidente do instituto Datanaliis, Luis Vicente Leon. "O governo diz que não está disposto a entregar a revolução. O que acontecerá caso Chávez perca a eleição? Vai reconhecer? Por outro lado, se Chávez vencer por poucos pontos, a oposição estará certa de que foi derrotada e aceitará o resultado? Certamente dirá que houve fraude, o que pode gerar conflitos", completa.

Pesquisas dão vitória a Chávez
Os institutos de pesquisa mais conhecidos da Venezuela divulgaram pesquisas de intenção de voto que apontam vitória de Chávez. O Datanalisis, apontado como próximo a Capriles, indicou 49,4% das intenções de voto para o atual presidente e 39% para o opositor. O levantamento, no entanto foi realizado entre 25 de agosto e 4 de setembro. Uma pesquisa mais recente, realizada entre 14 e 20 de setembro pelo GIS XXI, de propriedade do ex-ministro de Comunicação do governo, Jesse Chacón, apontou 56,2% para o presidente contra 43,8% para Capriles. Desde o último domingo, não é permitido divulgar pesquisas de intenção de voto na Venezuela. Entre os dez institutos que divulgaram pesquisas nas últimas semanas, seis deram vitória a Chávez, dois a Capriles e dois apontaram empate técnico.

A estratégia da campanha oposicionista vem sendo não declarar que confia nos resultados do CNE, mas em uma vitória de Capriles. "Temos certeza de que, no próximo domingo, quando sair o resultado, o CNE vai anunciar a vitória de Henrique Capriles", disse ao Terra na quarta-feira o coordenador da campanha de oposição, Leopoldo López, durante um ato de juramentação dos fiscais que irão atuar nas mesas de votação em Caracas. O próprio Capriles, questionado em coletiva da imprensa no começo da semana se reconheceria o resultado oficial das urnas, se limitou a dizer que reconheceria o "resultado do povo".

"Há um jogo de palavras", acredita o presidente do Datanalisis. "O que Capriles está dizendo basicamente é que não confia na institucionalidade do CNE, por sua ligação com o governo. A oposição vai checar as atas de votação e não vai respeitar uma decisão do CNE que não coincida com as suas contagens", diz Leon.

A oposição diz contar com 136 mil "testigos" para fiscalizar 100% dos 13.810 centros de votação. O juramento prestado pelos fiscais, sob o comando de Leopoldo López, dizia que eles "dariam a própria vida" caso seja preciso. Milhares de militantes chavistas também atuarão na fiscalização dos centros de votação.

"Não há razão para questionamentos", diz CNE
A suspeita de fraude na eleição venezuelana tem mais a ver com uma estratégia da oposição do que com uma possibilidade concreta. Para votar, o eleitor venezuelano faz identificação biométrica, vota na urna eletrônica, deposita um comprovante impresso numa "caixa de resguardo", assina uma lista e ainda mancha os dedos com tinta indelével. Em visita a Caracas em setembro, o ex-presidente dos Estados Unidos, Jimmy Carter, que dirige um instituto de monitoramento de eleições, disse que o sistema venezuela era um dos mais seguros e modernos do mundo.

"Não existem razões válidas para se pôr em questionamento o resultado da votação", diz a vice-presidente do CNE, órgão criado pela Constituição de 1999 que funciona como "Poder Eleitoral" na Venezuela.

De acordo com o CNE, o sistema de votação recebeu ao todo 17 auditorias, desde os registros eleitorais até a transmissão de dados pelas urnas, que contaram com a participação de técnicos de todas as coligações que disputam a eleição. Todos os fiscais posicionados nos centros de votação acompanharão a montagem das urnas eletrônicas, que começa nesta sexta. Técnicos dos órgãos eleitorais de diversos países foram convidados para acompanhar o dia da votação.

Os centros de votação ficarão abertos das 6h às 18h de domingo, sendo que não fecharão se ainda houver eleitores na fila. O resultado será divulgado pelo CNE somente quando não houver mais chances de alteração.

Campanha disputada
A polêmica e a tensão sobre o resultado das urnas são a ponta de uma campanha disputada, na qual a oposição venezuelana conseguiu reunir-se em torno de um candidato e equilibrar a disputa. Uma demonstração de força foi dada no último domingo, quando a oposição realizou um comício que tomou toda a avenida Bolívar, palco das manifestações de Caracas, tarefa que sempre foi mais fácil para o chavismo. Nesta quinta-feira, será a vez de Hugo Chávez realizar seu último comício da campanha na avenida Bolívar.

Candidato pela Mesa da Unidade Democrática, uma aliança entre partidos de oposição, Henrique Capriles é herdeiro do grupo Capriles, que atua no ramo de comunicação, entretenimento, imóveis e indústria. Já foi prefeito, governador do Estado de Miranda e presidente da Câmara de Deputados quando tinha 28 anos. Aos 40 anos, "El Flaco", como é chamado, critica o governo Chávez pela ineficiência da administração pública, o envio de recursos do petróleo para outros países e pela violência na Venezuela. Filho de uma família rica, tentou afastar-se da imagem de neoliberal: para conquistar votos de eleitores descontentes com o governo mas que aprovam as políticas sociais, Capriles afirma que irá manter programas importantes do governo, como as "Missões Bolivarianas", nas áreas de saúde, educação, habitação e emprego.

Em seus últimos comícios, Chávez vem admitindo a necessidade de atacar a ineficiência e a burocracia na administração pública, e prometendo ser um "melhor presidente" no próximo período. Contra Capriles, afirma que o candidato irá aplicar um "pacotaço neoliberal" na Venezuela. Seu grande trunfo, que lhe dá amplo apoio nas classes populares, são as políticas sociais, que reduziram a desigualdade na Venezuela para o menor patamar entre países latino-americanos, além de erradicar o analfabetismo. A mudança na Constituição permitiu a criação de estruturas como os conselhos comunais, associações de moradores que geram recursos e serviços do Estado.

Eleito em 1998, Chávez enfrentou duas eleições, um referendo revogatório e uma tentativa de golpe. Sempre afirmou que seu projeto para transformar a Venezuela era de 20 anos, o que poderá conseguir caso vença a eleição. "O que ocorrer na Venezuela nos próximos 100 anos dependerá do que ocorrer no pródimo domingo. Saberemos se nossos filhos terão pátria ou se roubarão a pátria de nossos filhos", disse Chávez em um de seus comícios desta semana.

Fonte: Especial para Terra
Compartilhar
Publicidade