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América Latina

Visita do papa "força" reaproximação entre Igreja Católica e Evo Morales

3 jul 2015 - 17h29
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O presidente da Bolívia, Evo Morales, é um confesso admirador do papa Francisco, mas, por razões políticas, sempre bateu de frente com a cúpula católica boliviana: embora se declare católico de base, foi o responsável por revitalizar o ancestral culto politeísta indígena andino, que também pratica.

Desde que chegou ao poder em 2006, Morales polemizou e foi ofensivo com a hierarquia católica local, à qual acusou de direitista, aliada de oligarquias, de medieval, de agir como a inquisição e inclusive de estar vinculada a roubos nos templos.

O confronto aberto foi motivado pelo olhar crítico com o qual os bispos analisaram problemas como o crescimento do narcotráfico, o autoritarismo e a perseguição judicial a opositores.

Toda vez que a disputa se aqueceu, o governo alegou que os bispos deveriam se preocupar com a "salvação das almas", e não influir na política, ao que a hierarquia católica respondeu ressaltando que não deixará de dizer o que pensa sobre o país.

Mas, apesar destas tensões, o anúncio da visita do papa à Bolívia entre os dias 8 e 10 de julho permitiu que o governo dialogasse pela primeira vez em muito tempo com a cúpula católica para coordenar a recepção, mas sem tocar em temas controvertidos.

Trata-se da primeira aproximação em cinco anos entre a igreja e o governo, segundo destacou o secretário-geral adjunto da Conferência Episcopal Boliviana, o sacerdote espanhol José Fuentes, coordenador da visita papal.

O sacerdote disse que os contatos com o governo se desenvolveram de forma muito positiva e relevou seu desejo de que seja "uma real reconciliação" acompanhada de uma renovação para ambas as partes.

No entanto, as tensões aumentaram recentemente devido ao confronto do governo com o sacerdote espanhol Mateo Bautista, a quem Morales e seus ministros desqualificaram por pedir maior orçamento para a saúde por meio de mobilizações.

Morales, que é indígena aimara, também reprova habitualmente que a Igreja Católica tenha acompanhado com a cruz "a dominação e submissão" de índios do continente durante a conquista espanhola.

Apesar de sua visão crítica para com a igreja de Roma, o governante visitou o papa Bento XVI em 2010 e se reuniu no Vaticano em 2013 e 2014 com Francisco, com quem também se encontrou no Brasil durante a Jornada Mundial da Juventude.

Para Bento XVI, Morales pediu a abolição do celibato e a aprovação do acesso da mulher ao sacerdócio, enquanto sobre Francisco opinou que é um papa "comprometido com seu povo, com pensamento revolucionário".

Antes do governo Morales, a Igreja Católica exercia um papel central como mediadora no conflito político e social do país, mas agora perdeu influência política perante o Estado.

Em 2009, Morales promulgou a Constituição de "refundação" da Bolívia, na qual o catolicismo deixou de ser o culto oficial do país e se declarou que o Estado é "independente da religião", mas garante a liberdade de todas as crenças.

Segundo defendeu o líder indígena, "o Estado laico é a melhor garantia da democracia religiosa".

Uma recente pesquisa publicada na imprensa local assinalou que 74% dos bolivianos são católicos e 22% cristãos não católicos.

No entanto, na Bolívia também há uma forte presença dos cultos ancestrais pré-hispânicos misturados com o catolicismo, devido à importância demográfica das culturas indígenas.

À primeira vista, parece contraditório que Morales se declare católico e pratique os rituais que reconhecem a Terra, o Sol e as montanhas como deidades, e participe de cerimônias de sacrifícios de lhamas, que são frequentes na área rural boliviana.

No entanto, Morales e os bolivianos da região andina em geral têm "incorporadas de forma muito natural as práticas religiosas antigas de conjunto de raízes indígena e o catolicismo", opinou a pesquisadora em temas culturais, Carmen Beatriz Loza.

"Pareceria esquizofrênico passar de uma prática à outra, mas não é contraditório porque ao longo de 500 anos as duas práticas foram se mesclando", declarou Loza à Efe.

O governo organiza regularmente atos oficiais religiosos com representantes de vários cultos, entre eles os dedicados à Pachamama (Mãe Terra), muitos deles liderados por Morales e dos quais nem sempre participou a Igreja Católica.

EFE   
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