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Morte de Hugo Chávez

Legado de Chávez oscila entre avanços sociais e indústria fragilizada

Redução da miséria e falta de incentivo à indústria nacional compõem, ao lado do estilo centralizado, a complexo herança do chavismo

6 mar 2013 - 16h15
(atualizado às 16h33)
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Chávez, durante o lançamento de uma linha estatal de alimentos: legado econômico ambíguo
Chávez, durante o lançamento de uma linha estatal de alimentos: legado econômico ambíguo
Foto: AFP

Homem de extremos, Hugo Chávez deixa um legado complexo. A redução da miséria e do abismo social entre pobres e ricos contrasta com a falta de incentivo à indústria e uma estrutura econômica dependente do petróleo estatal.  Estes opostos desafiam a avaliação dos 14 anos de governo individualista e centralizador do comandante bolivariano. Mas, incisivos na sociedade venezuelana do século XXI, eles moldam o fenômeno hoje conhecido como chavismo, que, de um modo ou de outro, será herança dos próximos governos da Venezuela.

"Foi o governo que mais deu atenção aos pobres. Por isso que as imagens que chegam da Venezuela hoje mostram milhares de pessoas chorando nas ruas. Antes de Chávez, a Venezuela vivia um paradoxo, porque o governo ganhava rios de dinheiro com o petróleo, mas não dividia com a população, só com as elites", lembra o pesquisador americano David Fleischer, professor de ciência política da Universidade de Brasília (UnB).

Segundo o Censo 2011 do Instituto Nacional de Estatística da Venezuela, entre 2001 e 2011, o número de pessoas em extrema pobreza (situação de miséria) caiu de 11,36% para 6,97%, e o total de pobres (não em situação de miséria) diminuiu de 21,64% para 17,60%, no mesmo período. Outros dados, citados pelo jornal inglês Guardian com base em dados oficiais, fala em uma diminuição ainda mais radical da extrema pobreza: de 23,4% para 8,5%, entre 1999 e 2011.

"Existe muita incompreensão em relação ao que foi o governo do presidente Hugo Chávez. (...) Ele foi um populista clássico: promoveu crescimento econômico, distribuição de renda, incorporação dos trabalhadores no processo político, e deu um novo status ao cidadão comum do país. Ao dar essas respostas aos setores populares, ele faz o chavismo ser uma força política que irá marcar as próximas décadas", avaliou o historiador Carlos Eduardo Vidigal, doutor em relações internacionais e também professor da UNB.

"O investimento em programas sociais e sua figura pessoal o tornaram muito popular. Se ele não tivesse morrido, teria ficado 20 anos no poder, cumprindo seu quarto mandato. Teríamos uma era Chávez", afirmou Regiane Nitsch Bressan, doutora pela Universidade de São Paulo (USP) em América Latina e professora de relações internacionais das Faculdades Rio Branco.

Abastecido pelo dinheiro do petróleo - principal fonte de riqueza da Venezuela -, o governo Chávez foi capaz de diminuir os índices de analfabetismo no país; melhorar a qualidade dos serviços de saúde pública e ampliar o acesso a moradias populares de qualidade. Para os analistas ouvidos pela reportagem, apesar da indiscutível centralização de seu governo, da distribuição de cargos entre militares em postos de confiança e do conhecido autoritarismo, não é possível classificar o governo Chávez como ditatorial.

"As classes médias e altas não foram favorecidas pela política chavista. Em seu governo, a indústria praticamente não tinha incentivos. O resultado foi uma economia fragilizada e baseada no petróleo, que é um bem finito. Também não houve um crescimento econômico organizado, o que onerou muito o próprio Estado", avalia Regiane.

Inflação e indústria enfraquecida

Se por um lado o presidente Hugo Chávez foi capaz de diminuir as desigualdades sociais, por outro, foi ineficaz em proteger a indústria nacional das crises internacionais. Ao se posicionar como inimigo dos Estados Unidos, até então maior consumidor do petróleo venezuelano e maior cliente da indústria nacional, Chávez colocou a economia local em situação delicada no cenário de longo prazo apostando no uso desenfreado dos recursos energéticos.

Outro problema a ser enfrentado pelo sucessor são as altas taxas de inflação, que há cerca de cinco anos oscilam entre 25% a 30% ao ano. Na avaliação de analistas, quem assumir o poder em Miraflores terá o desafio de cortar os gastos do governo e reaquecer a economia, o que implica em adotar medidas que podem ser antipopulares.

Se por um lado o carisma de Chávez o blindava dessas situações, nenhum dos dois políticos conseguirá adotar tais medidas duras sem prejuízo à popularidade do governo. "Esse é o problema do chavismo sem Chávez: Maduro não é Chávez, e é muito difícil assumir essa liderança forte que seu antecessor tinha. No longo prazo, isso é uma incógnita", avalia Fleischer.

Relações internacionais

Ao se pronunciar sobre a morte do líder venezuelano, a presidente Dilma Rousseff o classificou como um "amigo do Brasil". Na visão dos especialistas ouvidos pela reportagem, trata-se de um acerti: durante o governo Chávez, a indústria e as empresas brasileiras conquistaram maior entrada no país vizinho - o que poderia mudar caso a oposição vença as eleições.

Na equação da atuação externa venezuelana entram os Estados Unidos. Henrique Capriles já declarou que, se eleito, pretende se reaproximar dos Estados Unidos, demonstrando sintonia com o presidente americano Barack Obama. Já Maduro deixou claro que manterá a mesma postura de Chávez e, pouco antes de confirmar a morte do presidente, anunciou a expulsão de um funcionário da embaixada dos EUA.

"Nós não precisamos gostar um político 'A' ou 'B'. Mas o fato é que o chavismo é favorável ao Brasil. A oposição mantém uma relação muito estreita com os EUA e, se eleita, voltaria a priorizar investimentos de empresas norte-americanas, em detrimento às brasileiras", pondera Vidigal.

Fonte: Terra
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