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Morte de Hugo Chávez

Da miséria à política, venezuelana descreve trajetória sob Chávez

11 mar 2013 - 09h37
(atualizado às 11h29)
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Marisol Aponte, 49 anos, posa para foto com o filho em sua casa
Marisol Aponte, 49 anos, posa para foto com o filho em sua casa
Foto: BBC News Brasil

Marisol Aponte, 49 anos, conta que deve muito a Hugo Chávez. No período em que o presidente, morto na terça-feira passada, esteve à frente da Venezuela, ela se transformou de dona de casa em dirigente comunitária.

Ela conta ter se formado politicamente graças a Chávez. "Antes minha preocupação eram as coisas de casa, nunca me interessei pela política, até que chegou a revolução", diz. Há quatro anos atrás, Marisol engrossava o índice do déficit habitacional de quase 2 milhões de moradias.

"Não sabia o que fazer, mas cada vez que deitava com meus filhos, pensava: Meu Deus, quando vou poder ter uma casa pra tirar meus filhos desse chão?", conta Marisol, mãe de cinco filhos. Ela morava em um cômodo com a família em Petare, oeste da capital Caracas, uma das maiores favelas da América Latina. O quarto era tão diminuto, conta, que mal cabia uma cama. Todos dormiam no chão.

A situação mudou quando Marisol decidiu, junto a outras famílias, ocupar um terreno baldio que pertencia ao hipódromo, no sul da cidade. Ela conta que foram os discursos de Chávez que a "despertaram" para batalhar por uma moradia. Os proprietários do terreno pretendiam construir um hotel cinco estrelas no local, de frente para a montanha Ávila, que cerca o vale de Caracas.

"Morávamos nos barracos ali, na esperança de poder construir nossas casas", conta. Uma ordem de despejo, emitida por um prefeito chavista, em 2002, abalou a esperança das famílias. Os barracos foram queimados e as famílias ficaram desabrigadas. "Sentei com meus filhos numa pedra, eles choravam muito de susto, tentava consolá-los e pensava: e agora?". 

Ela conta ter reunido coragem para reorganizar as famílias e voltaram a ocupar a propriedade, meses depois. A repercussão do violento despejo, demorou, mas trouxe resultados. Em 2005 o governo desapropriou o terreno e Chávez decidiu que ali seria construída uma "cidade socialista" com 8 mil apartamentos, de 74 metros quadrados cada um, para alojar as famílias que viviam em situação de risco.

Ela se tornou uma líder comunitária durante o regime chavista
Ela se tornou uma líder comunitária durante o regime chavista
Foto: BBC News Brasil

Marisol realizaria o sonho de colocar os filhos para dormir numa cama. O apartamento está divido em três quartos, sala, cozinha e dois banheiros. A cozinha está equipada com produtos da China, vendidos a crédito a preços reduzidos.

Críticas

A política de desapropriação de terras urbanas e rurais adotada a partir de 2001 foi alvo de duras críticas de setores opositores e empresariais, por considerá-la uma medida que afastava os investimentos estrangeiros no país e desrespeitava o direito à propriedade privada.

Com a moradia garantida, os filhos mais velhos de Marisol voltaram à estudar. Foram formados por técnicos cubanos - que participam da cooperação entre Havana e Caracas - para desenvolver próteses ortopédicas que são entregues gratuitamente pela missão José Gregório Hernandez, programa social que atende a deficientes físicos. "Quando eles eram pequenos, muitas vezes eu tinha que escolher entre a comida e o material escolar. Agora eles estudam e têm trabalho", conta.

A líder comunitária também voltou a estudar e conclui o segundo grau na missão Ribas - programa de educação para jovens e adultos. Ela e o marido conseguiram trabalho na manutenção da escola primária que foi construída dentro do conjunto habitacional Cidade Socialista Cacique Tiúna. "Como não sofrer com a partida dele (Chávez)?. Ele nos ensinou a lutar, a buscar nossa independência", afirma.

Marisol enfrentou uma maratona de 25 horas na fila do velório para tentar se despedir do "comandante". Ela passou toda a quinta-feira sob um forte sol e, desprotegida de abrigo, enfrentou o sereno da madrugada da sexta-feira. Afônica, Marisol conta que não conseguiu vê-lo. "Esperamos todo esse tempo, mas a fila estava enorme, não conseguimos entrar ", contou, frustrada, com lágrimas nos olhos.

O governo decidiu estender o velório por mais uma semana para que a multidão que aguarda do lado de fora da Academia Militar possa prestar sua última homenagem ao líder venezuelano. Seu corpo será embalsamado e exposto em uma urna de cristal. "Dizem que ele está igualzinho, vestido de uniforme e com a boina vermelha. Não vou desistir, tenho que me despedir dele", diz.

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