PUBLICIDADE

América Latina

Cúpula de Montevidéu evidencia Mercosul em crise

A aparente harmonia engana: entre os numerosos problemas da aliança comercial sul-americana, falta de coesão interna é possivelmente o mais grave. Nenhuma das metas foi alcançada, enquanto Aliança do Pacifico avança

14 jul 2013 - 12h04
(atualizado às 12h07)
Compartilhar
Exibir comentários
Da esquerda para a direita: Evo Morales, Cristina Kirchner, Pepe Mujica, Dilma Rousseff e Nicolás Maduro
Da esquerda para a direita: Evo Morales, Cristina Kirchner, Pepe Mujica, Dilma Rousseff e Nicolás Maduro
Foto: EFE

Para quem olha de fora, parece um encontro entre grandes amigos. O anfitrião, o chefe de Estado uruguaio, José Mujica, é apelidado "Presidente Pepe". Todos se tratam entre si de "hermana" e "hermano". E não se cansam de assegurar que sua aliança regional, o Mercosul, é, por assim dizer, a única alternativa possível para seus próprios países, assim como para o resto da América Latina e Caribe.

Foi assim, harmônico, que o Mercado Comum do Sul se apresentou na conferência de cúpula realizada no imponente Edifício Mercosur, o secretariado da aliança em Montevidéu, diretamente à margem do Rio da Prata.

Perdido em disputas internas

No entanto, a realidade do Mercosul é bem diferente. Ele foi iniciado em 1991, como mercado interno, união alfandegária e zona de livre comércio, pelo Brasil, Argentina, Uruguai e o Paraguai (atualmente suspenso). Mas, no momento, o ambicioso projeto encontra-se estagnado pelas "lutas de trincheira" entre seus Estados-membros.

Não há como negar: a meta comum não foi alcançada, deplorou o vice-presidente do Uruguai, Danilo Astori, em entrevista recente à agência de notícias EFE.

"Nunca conseguimos formar o mercado comum, a união alfandegária está totalmente derrotada, e a zona de livre comércio não funciona em absoluto, porque não há livre circulação de bens e serviços. O Mercosul se encontra num estado de paralisia quase total", declarou Astori.

Um dos principais motivos para tal estado de coisas é a conduta dos dois maiores membros do bloco comercial. Há um bom tempo o Brasil e a Argentina vêm se hostilizando mutuamente em todos os campos possíveis da política econômica, com restrições comerciais, proibições de importações ou taxas alfandegárias.

Oficialmente, as duas presidentes, Dilma Rousseff e Cristina Fernández de Kirchner, reúnem-se com regularidade, incentivam e prometem transparência e abertura. Por trás dos bastidores, no entanto, as damas não param de se digladiar.

No episódio mais recente desse conflito binacional, a mineradora brasileira Vale retirou-se de um projeto bilionário de exploração de potassa, devido às ingerências por parte da política econômica argentina.

História e psicologia

Ex-guerrilheiro pragmático, o presidente uruguaio, José Mujica, tentou, pouco antes do início da conferência de cúpula, mais uma vez explicar por que nem o mercado comum nem a abertura de fronteiras estão funcionando como desejado.

"Cada um de nós está tão enraizado no próprio Estado nacional e em sua cultura que os defende a qualquer preço. Cada um desconfia dos outros, olhando-os de soslaio, e calculando como pode tirar uma vantagem." Mas isso não significa que Mujica queira abrir mão inteiramente da ideia do Mercado Comum do Sul.

No entanto, há outros que não se satisfazem com explicações psicológicas. Já ligeiramente nervosa com os atuais sinais de debilitação da economia, há seis semanas a Confederação Nacional da Indústria (CNI) brasileira divulgou um documento marcado pela preocupação.

Segundo este, o Brasil e o Mercosul estariam resvalando para o isolamento, enquanto o resto do mundo busca avidamente formar alianças de comércio. "O país corre o perigo de perder ainda mais espaço em seus mercados de exportação, se não se dedicar mais intensivamente à procura de novas alianças no comércio internacional", alertaram os líderes industriais do Brasil.

Presidência venezuelana

Entretanto, abertura internacional é a última coisa que se pode esperar da nova presidência do Mercosul. Nos próximos seis meses ela cabe a Nicolás Maduro, o recém-eleito chefe de Estado venezuelano. O imitador do falecido Hugo Chávez luta, desde já, pela sobrevivência política, e espera que a presidência da aliança comercial venha a ajudá-lo nessa luta.

Maduro promete transformar o Mercosul num "motor do desenvolvimento e união da América Latina". Para o venezuelano, isso vai muito além de economia e comércio: suas novas metas incluem movimentos sociais e direitos fundamentais, como educação, saúde e alimentação garantida.

Justamente esse último tópico é um enorme problema para a Venezuela, que espera contar com a ajuda dos parceiros do Mercosul. E Maduro procura, naturalmente, alinhar essa ajuda a seu curso político populista de esquerda e antiamericano. Neste sentido, tanto o escândalo de espionagem pela Agência Nacional de Segurança dos Estados Unidos (NSA), desencadeado pelo whistleblower Edward Snowden, quanto a escala forçada do avião do presidente boliviano, Evo Morales, vieram bem a calhar.

Apesar de tudo, o Mercosul não está tão paralisado assim. O cofundador Uruguai flerta bem abertamente com outro bloco comercial, a Aliança do Pacífico, criada há pouco mais de um ano. Ao país – pequeno, porém economicamente bem-sucedido – não faltam motivos para tal interesse: os Estados-membros da nova aliança, Chile, Colômbia, México e Peru, apresentam um crescimento econômico de 5%, enquanto o Mercosul não alcança nem a média latino-americana de 3%.

Deutsche Welle A Deutsche Welle é a emissora internacional da Alemanha e produz jornalismo independente em 30 idiomas.
Compartilhar
Publicidade
Publicidade