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América Latina

ONG holandesa faz campanha para Mujica receber o Nobel da Paz de 2014

Campanha impulsionada por ONG holandesa vai até 1º de fevereiro; para oposição, única premiação possível seria a do “absurdo”

1 out 2013 - 14h35
(atualizado às 14h38)
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O Comitê Nobel da Noruega começou a receber em setembro cartas de legisladores, juízes, reitores, especialistas e acadêmicos que estão de acordo com a indicação do presidente uruguaio José "Pepe" Mujica ao Nobel da Paz.

<p>Com mate na mão: José Mujica, presidente uruguaio</p>
Com mate na mão: José Mujica, presidente uruguaio
Foto: AFP

A campanha teve início em 1º de maio e foi lançada pela ONG holandesa Drugs Peace Institute, presidida por um ativista da descriminalização das drogas, Frans Bronkhorst, que esteve em Montevidéu no final de fevereiro com o objetivo de propor pessoalmente ao presidente uruguaio a sua postulação - os candidatos devem expressar sua concordância com a participação no prêmio.

Mujica é o mentor do projeto de lei que estabelece a regulação estatal da produção, do armazenamento e da venda de maconha no Uruguai. A proposta já passou pela Câmara dos Deputados e deve ser votada até novembro pelo Senado. 

"Como São Jorge, que enfrentou o dragão que comia crianças, José Mujica surgiu como defensor da sociedade civil mundial, aterrorizada pela guerra às drogas", escreve a organização em sua justificativa da campanha em prol do mandatário (mais informações podem ser obtidas na página da Drugs Peace Institute, em inglês).

Até agora, diz Bronkhorst ao Terra, a entidade recebeu alguns apoios de políticos e de lideranças de entidades vinculadas à defesa da paz pelo mundo. Como o projeto ainda não é lei, a estratégia da ONG é esperar o desenlace nos próximos meses para, a partir daí, intensificar a divulgação da campanha, principalmente em universidades.

Os vencedores dessa postulação serão conhecidos em outubro de 2014 e, em 10 de dezembro do próximo ano, será realizará a cerimônia de premiação. Mujica não vem se pronunciando sobre o tema e se limitou, no início deste mês, a dizer que a candidatura “não vai lhe tirar o sono”.

Entre 1994 e 1995, o Drugs Peace Institute também havia trabalhado pela indicação de Evo Morales, mas já sabia “que ele não tinha chances reais de ganhar”, conta Bronkhorst. A razão impulsora havia sido a defesa do consumo e da produção de coca por parte do líder boliviano. 

<p>Mujica concede entrevista em sua chácara, em Montevidéu</p>
Mujica concede entrevista em sua chácara, em Montevidéu
Foto: AFP
"Bob Marley do século XXI"

A candidatura de Mujica, considera o holandês, é mais promissora. "Não só na América Latina, mas também em alguns Estados norte-americanos há governos que estão a favor da legalização da maconha. A geopolítica mudou completamente, e há uma chance de que o presidente uruguaio efetivamente ganhe o prêmio", avalia. "De toda forma, estamos muito felizes de que o debate no mundo, hoje, esteja sobre a mesa."

Para Bronkhorst, se laureado, o uruguaio pode se transformar em uma referência na defesa da legalização das drogas como uma política de combate ao crescimento do seu uso e da criminalidade a que está associada. "Seria uma espécie de Bob Marley do século XXI", considerou, em tom de brincadeira, durante sua passagem por Montevidéu.

Além do seu projeto de regulação da cannabis, que passou com sucesso pela Câmara dos Deputados do país, Mujica vem ganhando terreno no exterior e em outras searas espinhosas do âmbito internacional, como as negociações entre a guerrilha colombiana do Exército de Libertação Nacional e o governo de Juan Manuel Santos, que devem ser retomadas na próxima semana e ter o Uruguai como mediador, segundo informam jornais da Colômbia. A proposta também partiu de Mujica.

"Coerência" e "caos"

Seu capital político presente, sua atuação dentro e fora do Uruguai e seu passado de guerrilheiro tupamaro eleito presidente democraticamente fazem com que Mujica seja um candidato "coerente" com a tônica dos prêmios Nobel, que é a de "premiar vidas, mais do que pessoas", na opinião de Julio Calzada, diretor geral da Junta Nacional de Drogas, órgão do governo atualmente responsável pelo combate ao uso de entorpecentes no Uruguai. Calzada recebeu Bronkhorst em Montevidéu e seu pedido formal de inscrever Mujica na premiação sueca.

"O prestígio que tem Mujica no mundo tem muito a ver com o modo como vive, por uma coerência do ser. Há vários aspectos que o fariam merecedores do prêmio, por sua coerência, pela postura de toda uma trajetória política", disse Calzada, em entrevista ao Terra

"A questão da maconha é um entre os vários aspectos de um conjunto de ações e políticas que realizam esse governo e o presidente Mujica, o que faz com que possa ser reconhecido por diferentes atores em nível mundial. Mas o presidente foi muito claro e enfático na Rio+20, por exemplo, tem uma fatura intelectual que transcende enormemente esse aspecto da maconha", afirmou. "Nos próximos anos, vai ser valorizada muito mais essa figura, que o que mais tem de relevante na construção da sua legitimidade é que ele trabalha a partir do ser, de como é, mais de como se diz que se deve ser. Acho que isso é o importante da vida de Mujica. O que premia o Nobel são as vidas das pessoas dedicadas a algo."

A oposição uruguaia, no entanto, não vê de forma favorável a possibilidade de que o presidente -conhecido como "o mais pobre do mundo" pelo fato de viver em uma chácara, dirigir um fusca velho e doar 90% do seu salário para projetos sociais - seja reconhecido com um Nobel. 

Em sua página no Facebook, o ex-presidente Jorge Batlle (que governou o Uruguai entre 2000 e 2005), pertencente ao opositor Partido Colorado, escreveu, em uma coluna intitulada "O caos", que "o Prêmio Nobel que vão dar (a Mujica) é o do absurdo". E finalizava com a história de que “uma vez, um amigo argentino me disse: 'Vem cá, vocês estão ficando parecidos a nós', e eu lhe disse: 'É verdade, mas o caos vai nos redimir'. Aí vamos".

Fonte: Especial para Terra
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