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África

Município sul-africano obriga negros a usar identificações

Polícia e agentes do Fórum de Polícia Comunitária podem interrogar suspeito e pedir a carteira verde que confirma que pessoa está empregada

13 mar 2015 - 06h11
(atualizado às 08h02)
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A entrega a trabalhadores negros e mulatos de identificações que os distinguem dos delinquentes em uma zona branca da África do Sul provocou acusações de racismo contra os responsáveis por uma iniciativa que lembra uma das medidas segregacionistas do apartheid.

"É uma forma de fazer com que os negros não entrem em regiões 'brancas', como ocorria no antigo regime", disse à Colin Wilschut, vereador do município de Worcester, onde os serviços privados de segurança iniciaram este sistema em colaboração com a polícia.

Com este sistema, a polícia e os agentes do Fórum de Polícia Comunitária (CPF) podem interrogar qualquer um que considerem suspeito e pedir a carteira verde que testemunha que a pessoa está empregada ou procura trabalho em uma das casas deste bairro.

Seu funcionamento se assemelha à chamada lei de passes do apartheid, que obrigava os não-brancos a usar credenciais que provavam que trabalhavam na região para poder circular por espaços reservados para brancos.

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"É uma maneira inaceitável de tentar acabar com o crime, e priva os portadores das identificações de sua dignidade", acrescentou Wilschut, que denuncia também o envolvimento da polícia.

Tanto o governante Congresso Nacional Africano (CNA) como o maior partido da oposição, a Aliança Democrática (AD), condenaram a medida.

A África do Sul é um dos países com maiores taxas de criminalidade do mundo, frequentemente associada com a maioria negra, menos educada e mais pobre que a minoria branca, aproximadamente 10% da população.

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Segundo estatísticas oficiais, os negros representam 79% da população penitenciária, seguidos por brancos (2%) e "coloureds" ou mulatos (18%), que representam 9% do total da população sul-africana.

Um morador anônimo de Worcester declarou ao jornal "Times" que o bairro sofreu cinco roubos nas últimas duas semanas, quatro deles durante o dia.

"Me incomoda que o povo nos chame de racistas. Protegemos a nós mesmos e ajudamos a polícia a identificar os criminosos", explicou, ao ser questionado sobre este novo sistema de identificação.

Também citado pelo Times, o jardineiro Denzel Charlies negou que o caso se trate de uma reedição da "lei de passes", e afirmou que os cartões verdes ajudam a manter os criminosos fora do bairro.

"Dou graças a Deus por ter este trabalho. O povo daqui é muito bom comigo", acrescentou.

Para o vereador Wilschut, este tipo de atitude mostra que estes trabalhadores - na maioria negros ou mulatos - precisam desesperadamente de seus empregos e não estão em condições de se opor às identificações.

Em artigo sobre o caso, o analista em Direito Constitucional Pierre de Vos classifica a medida de "claramente inconstitucional e ilegal", ao atingir "o direito de todo cidadão de entrar, permanecer e viver em qualquer lugar da República".

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O professor recolhe as palavras de outro jardineiro, segundo o qual o cartão verde é necessário para buscar trabalho em casas da região. Os que são interrogados e não possuem tal documento devem abandonar o bairro.

O sargento Julian Plaatjies, da delegacia de polícia local, negou que os cartões verde (ou rosa, no caso de faxineiras) possam ser comparados com os passes do "apartheid".

"As pessoas eram detidas quando não usavam as credenciais. Não tem nada a ver com o que ocorre aqui", declarou Plaatjies à imprensa.

Tanto o governo da província do Cabo Ocidental - onde fica Worcester - como a Comissão Sul-Africana de Direitos Humanos (SAHRC) pediram que seja investigada a situação urgentemente, que ocorre há um ano e foi denunciada agora pelo jornal local "Daily Voice".

Apoiados e organizados por escolas, igrejas e outras instituições comunitários, grupos de segurança como o CPF protegem muitos subúrbios - majoritariamente brancos - de classe média e alta da África do Sul.

Com uma população de cerca de 100 mil pessoas e situada a 120 quilômetros da Cidade do Cabo, Worcester tem uma população preponderantemente "coloured" (cerca de 60%), com 25% de negros e 14% de brancos.

EFE   
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