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No mercado de vinhos, sinais de fraqueza e medo de colapso

3 abr 2009 - 19h10
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Quanto vale um vinho? Quando a elite dos críticos e comerciantes de vinhos chegar a Bordeaux esta semana para avaliar a safra 2008 dos melhores vinhos do planeta, a questão com certeza estará nos pensamentos de todos.

Os maiores conhecedores de vinho se reúnem para degustações no começo de abril desde os anos 70, em um evento conhecido como "campagne primeur", ou campanha de futuros. Mas jamais o haviam feito em meio a uma recessão tão forte e depois de um período de tamanho movimento no mercado.

Da mesma forma que os anos prósperos de salários inchados em Wall Street e crédito barato para os consumidores comuns ajudaram a criar uma bolha nos imóveis, ações e outros ativos, também criaram uma bolha no vinho.

O sistema "em primeur", ou de futuros de vinho, funciona para beneficiar os produtores, porque permite que recebam dinheiro por uma parte de sua produção enquanto ela ainda está nos bairros; para os investidores e consumidores, o atrativo é a chance de adquirir vinho a preços que apresentam potencial de substancial alta.

Os preços futuros do vinho por muito tempo variaram basicamente de acordo com a qualidade das safras. Mas isso parece ter mudado depois que um 2005 excepcional gerou uma disparada dos preços. As safras de 2006 e 2007 foram apenas médias, mas os preços não caíram, dada a chegada ao mercado de um contingente de novos ricos dispostos a gastar.

Agora, muitos dos especuladores que propeliram os preços a alturas extraordinárias desapareceram, ou se tornaram de compradores em vendedores, à medida que se esforçam por levantar dinheiro que permita cobrir suas arriscadas apostas. E os banqueiros e operadores financeiros que não se incomodavam em pagar centenas de dólares por uma garrafa agora estão preocupados com a perda não só de suas bonificações mas de seus empregos.

Como resultado, alguns compradores internacionais decidiram não ir às degustações este ano, se queixando de que os produtores mais importantes não aceitam que os preços devem cair, em um mercado fraco como o atual. Alguns dos comerciantes menores, que ganham a vida com a venda de vinho, entre os quais alguns dos intermediários de Bordeaux conhecidos como "négociants", aparentemente correm o risco de quebrar.

Os preços dos melhores vinhos mundiais subiram junto com a bolha financeira, e tanto fundos de investimento quanto investidores caseiros entraram no jogo. O índice da London International Vintners Exchange, que acompanha 100 vinhos de primeira linha, a maior parte dos quais Bordeaux tintos, quase triplicou, em termos de dólares, entre fevereiro de 2005 e agosto de 2008. De lá para cá, a queda acumulada foi de 43%.

As casas de leilões Christie's e Sotheby's dizem que as vendas continuam a ser fortes nos eventos que organizam, os quais em geral envolvem garrafas de marcas excelentes e nos momentos privilegiados para venda.

E os compradores não reduziram seu consumo geral de vinhos, de acordo com Lulie Halstead, presidente-executiva do grupo de pesquisa e consultoria Wine Intelligence. "Mas as pessoas estão optando por preços um pouquinho mais baixos", ela disse, cortando os gastos com o vinho que pedem em restaurantes ainda que ocasionalmente façam compras extravagantes para servir em casa.

Dados da Wine Australia, a organização setorial das vinícolas australianas, sustentam essa análise. As exportações de vinho australianas caíram em 5% em termos de volume nos 12 meses até fevereiro, mas a perda em termos de valor foi de 16%, o que sugere que há proporção maior de vinhos baratos sendo exportados.

Previsões baseadas no clima durante a temporada de cultivo do ano passado sugerem que o Bordeaux de 2008 ficará entre médio e muito bom. Os produtores devem divulgar seus preços para a nova safra pelo final de junho, com base em larga medida nas reações encontradas durante a degustação desta semana.

Simon Staples, diretor de vendas de vinho da Berry Bros. & Rudd, no Reino Unido, disse que se os grandes produtores decidirem que o mercado não aceita seus preços, dispõem de caixa suficiente para simplesmente manter fora do mercado a safra 2008, por até 10 anos se necessário, quando estaria pronta para venda aos distribuidores e restaurantes. Mas ele se declarou otimista quanto ao sucesso das negociações.

O crítico norte-americano de vinho Robert Parker disse o mesmo em novembro, prevendo em seu blog que haveria "muitas baixas". Em nota distribuída por e-mail na semana passada, ele parecia igualmente pessimista.

"Em termos de preços de vinho, mesmo os produtos de luxo estão frouxos, ainda que tenham caído menos que os imóveis, arte e ações", afirmou. "Mas a compra dos vinhos mais conhecidos se desacelerou consideravelmente, e aquilo que acontecerá nos próximos seis meses vai derrubar ainda mais os preços, desconfio".

Tradução: Paulo Migliacci ME

The New York Times
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