Por que o Dia Internacional do Livro Infantil é em 2 de abril?
Saiba as origens da literatura infantil e veja como chegamos a Chapeuzinho amarelo e lobo do bem
Dia 2 de abril é o Dia Internacional do Livro Infantil. Cumprindo a missão de introduzir as crianças aos encantamentos das letras, essas obras servem também para transmitir juízos de moral e valores da sociedade em que se inserem. Por isso, tantas adaptações de diversos clássicos já foram feitas. Na primeira, por exemplo, Chapeuzinho Vermelho acabava na barriga do lobo, devorada, assim como sua vovozinha.
O dia 2 de abril foi escolhido em homenagem ao nascimento de Hans Christian Andersen, em 1805. O escritor dinamarquês é considerado o primeiro autor a romancear as fábulas voltadas especialmente para crianças. Assim como as histórias antigas, Andersen também se preocupava com a transmissão de moral e valores, ressaltando a disputa entre poderosos e figuras mais fracas. Calcula-se que o dinamarquês tenha escrito mais de 150 histórias, entre elas O Patinho Feio, A Pequena Sereia, A Roupa Nova do Rei e A Polegarzinha.
No Brasil, grandes nomes como Monteiro Lobato, Ana Maria Machado, Lygia Bojunga, Ruth Rocha, Ziraldo e Bartolomeu Campos de Queirós são responsáveis, ao lado de tantos outros, pelo gosto de muitas crianças pelo mundo dos livros. Por aqui, contudo, celebramos em 18 de abril o Dia Nacional do Livro Infantil. A data lembra o nascimento de Monteiro Lobato, o pai do gênero no País. Além de suas obras, o autor também traduziu e adaptou clássicos mundiais como Alice no País das Maravilhas e Robin Hood.
As escolas também têm um papel importante nessa jornada. É lá que os pequenos têm o primeiro contato com muitos livros e histórias, ampliando as percepções e impressões de mundo. Contudo, Edna Bueno, especializada em Literatura Infantil e Juvenil pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), enxerga falhas na atuação dos colégios. "Considero que um bom trabalho com a literatura é oferecer um cardápio variado de livros para que a criança faça sua escolha. É preciso experimentar e sentir-se livre. Não acho uma boa ideia usar a leitura de livros para nota", critica.
Era uma vez...
Era uma vez um francês que nasceu em Paris em 1628. De todos os muitos franceses nascidos em Paris em 1628, esse tinha algo especial: poeta e escritor, veio a ser reconhecido como o Pai da Literatura Infantil. Charles Perrault também foi advogado e exerceu algumas atividades como superintendente do Rei Luís XIV, mas isso é menos interessante. O que realmente importa em sua vida são suas obras literárias.
Tudo começou quando, já idoso, resolveu registrar as histórias que ouvia de sua mãe e também nos salões parisienses. Absorvendo e transcrevendo esses relatos, criou o gênero do conto de fadas. Essa compilação de histórias folclóricas foi publicada em 1697 com o título de Histórias ou contos do tempo passado com moralidades, mas ficou célebre com seu subtítulo Contos da mamãe gansa. Na obra estão as famosas histórias Chapeuzinho Vermelho, A Bela Adormecida, O Pequeno Polegar, Cinderela, Barba Azul e O Gato de Botas, entre outras.
Antes dos contos de fadas
Ainda antes das histórias de fadas já existiam os contos. O pai desse gênero é outro francês, mas este nascido fora de Paris e sete anos antes, em 1621. Assim como Perrault, Jean de La Fontaine também atuou em funções burocráticas (inspetor de águas, por exemplo, cargo herdado do pai), mas foi no mundo das letras que se realizou.
Suas primeiras fábulas foram publicadas em 1668, em um volume intitulado Fábulas Escolhidas, uma coletânea de 124 histórias. Com o tempo, novas edições foram lançadas e novos contos, acrescentados. Os mais famosos são A Lebre e a Tartaruga, O Homem, O Menino e a Mula, O Leão e o Rato e O Carvalho e o Caniço, todas envolvendo personagens animais e trazendo um fundo moral. Algumas das obras são creditadas ao grego antigo Esopo.
E os Irmãos Grimm?
Na história da literatura, os irmãos alemães Jacob e Wilhelm Grimm são tão importantes quanto os franceses. Eles dedicaram a vida ao registro das memórias e lendas populares da Alemanha, que até então eram transmitidas somente por via oral. Porém, quando contadas, essas histórias nem sempre eram voltadas para o público infantil. Coube aos Grimm alterar (ou descartar) aquelas que não passavam uma mensagem positiva ao final. Clássicos como Chapeuzinho Vermelho, Cinderela, Rapunzel, Bela Adormecida e João e Maria foram adaptados por eles.
O que poucos sabem é que, além da compilação dessas histórias infantis, eles também fizeram significativas contribuições à gramática alemã: elaboraram, conjuntamente, o Grande Dicionário da Língua Alemã, primeiramente publicado em 1854.
Em 2005, eles foram parar no cinema com o filme Os Irmãos Grimm, que misturou um pouco da história dos irmãos com o mundo fantástico das histórias exploradas por eles.
Mas que boca grande, vovozinha!
Amplamente difundida, provavelmente toda criança ocidental já ouviu a história de Chapeuzinho Vermelho: uma menina vestida com capa vermelha atravessa a floresta para levar uma cesta de doces para sua avó, que está doente. Na floresta, ao chegar a uma bifurcação, ela tem de escolher entre um caminho longo e seguro ou um curto e perigoso. Chapeuzinho escolhe o segundo e, assim, encontra um lobo, que a aconselha a voltar e tomar o outro caminho. A menina segue o conselho e, enquanto isso, o lobo corre até a casa da avó, a devora, veste suas roupas e aguarda a chegada de Chapeuzinho. Quando a menina chega, eles trocam o célebre diálogo onde ela estranha a aparência da avó. Quando Chapeuzinho pergunta sobre a boca da vovozinha, o animal mostra quem realmente é e a devora também. Fim.
Sim, acabou. A história original, de Charles Perrault, acaba com a vovozinha e Chapeuzinho Vermelho devoradas pelo Lobo Mau. Foram os Irmãos Grimm que introduziram o caçador no conto, que mata o animal e abre sua barriga para retirar as duas com vida lá de dentro. Uma versão ainda mais leve conta que o lobo prende a avó em um armário enquanto espera a Chapeuzinho.
Chapeuzinho amarelo?
Além de serem devoradas pelo Lobo Mau ou salvas no último minuto pelo caçador, Chapeuzinho Vermelho e sua vovozinha também ganharam diversas outras versões: Andrew Lang, escritor escocês, substituiu o vermelho por dourado e disse que a menina, na verdade, foi salva pelo capuz de ouro que usava, que queimou a boca do lobo. Os brasileiros Guimarães Rosa, Dalton Trevisan e Maurício de Sousa também criaram versões do clássico. Chico Buarque escreveu Chapeuzinho Amarelo, releitura sem avó ou caçador, mas com uma Chapeuzinho que tem medo do medo. Ao fim, o medo vira companheiro e o lobo, bolo. Até lobo do bem já foi inventado. Deonísio da Silva recontou a história invertendo papeis: um lobo que não é mau e um caçador que não é herói. A versão moderna propõe a discussão de relações familiares e respeito às pessoas e aos animais.
Era uma vez, no Brasil...
O nascimento da literatura infantil brasileira se deu em um duelo de xadrez entre Monteiro Lobato e Toledo Malta. Durante a partida, Malta contou uma fábula na qual um peixe sai do mar, desaprende a nadar e, ao retornar às águas, morre afogado. Lobato perdeu a partida, mas o Brasil ganhou muitas boas histórias: a partir do relato do amigo, escreveu A História do Peixinho que Morreu Afogado, conto que originou A Menina do Narizinho Arrebitado, lançado em 1920. A obra deu início ao gênero no País e é também o princípio das histórias do Sítio do Pica-Pau Amarelo. Edna Bueno, especialista em literatura infantil, define: "Monteiro Lobato inaugurou uma literatura infantil preocupada com uma linguagem própria para as crianças, antenada com seu universo; não um olhar de cima para baixo, mas um olho no olho".
O Brasil tem diversos outros autores célebres na área, destacando-se Ana Maria Machado, Lygia Bojunga, Ruth Rocha, Ziraldo, Bartolomeu Campos de Queirós, Tatiana Belink, Cecília Meireles, Pedro Bandeira e Mary França, entre incontáveis outros nomes relevantes.
As brasileiras premiadas
A literatura infantil tem uma espécie de "Prêmio Nobel": é o troféu Hans Christian Andersen, concedido a cada dois anos para os destaques do gênero pela International Board on Books for Young People, órgão filiado à Unesco, a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura. A primeira edição do prêmio foi em 1956, e Eleanor Farjeon, escritora britânica, foi a agraciada.
Somente em 1982 o troféu saiu do eixo Europa-Estados Unidos, premiando a brasileira Lygia Bojunga. Ela é considerada uma espécie de sucessora de Monteiro Lobato. Em 2000, Ana Maria Machado repetiu o feito e trouxe o troféu mais uma vez para o Brasil. Na próxima premiação, em 2014, concorrerão os brasileiros Joel Rufino dos Santos (escritor) e Roger Mello (ilustrador).