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Sala de aula invertida tem aula em casa e tema na escola

25 mar 2014 - 15h57
(atualizado às 16h00)
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Buscando um método que valorize mais o aprendizado no ritmo de cada estudante, alguns educadores passaram a modificar o papel do professor em sala de aula. Em vez de apresentar o conteúdo a todos os alunos e mandar tarefas de casa para fixação, esses professores passaram a gravar vídeos com o material expositivo. Assim, em sala de aula, ele está completamente disponível para tirar dúvidas e realizar atividades para compreensão. Dessa forma, o estudante pode aprender em seu próprio ritmo, com atenção mais individualizada do professor.

Um dos pioneiros da sala de aula invertida (ou flipped classroom, em inglês) é Jon Bergmann. Após dar aulas de ciências por 24 anos, para middle e high school (o equivalente aos últimos anos do ensino fundamental e ensino médio), tornou-se chefe em tecnologia de uma escola em Chicago. Atualmente, ele é referência quando se fala no método e mantém uma ONG, junto a outros professores, que promove recursos e pesquisas sobre o assunto.

Ele explica que viu o método funcionar em diversas áreas de ensino, de grandes universidades como Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT) e Harvard a educação infantil. “No começo, achei que era melhor para disciplinas como matemática e ciências. Mas agora vejo exemplos de professores de artes, que mostram as técnicas através de vídeos, e depois realizam exercícios práticos em sala de aula. Até Educação Física já vi acontecer”, conta.

Sobre as motivações para criação da proposta de utilizar as possibilidades das mídias digitais em sala de aula, ele afirma que, desde o começo, buscavam o melhor para os estudantes. “Os alunos passaram a participar ativamente em sala de aula e aplicando seus estudos. Vimos resultados em que os alunos estudam mais, vão melhor nas provas e os professores estão mais satisfeitos. Faz sentido”, define.

Bergmann escreveu o livro Flip Your Classroom: Reach Every Student in Every Class Every Day, em parceria com seu colega e também pioneiro da metodologia Aaron Sams. A obra conta sobre a experiência com o modelo. “Não é o único método. Mas é uma maneira que funciona”, afirma. “Eu e Aaron não gostamos da palavra revolução, pois lembra, historicamente, ações que são impostas. Preferimos o termo transformação, de baixo para cima”, diz.

Tendência no Brasil

Esta transformação está chegando ao Brasil com exemplos como o Instituto Superior de Educação de São Paulo, conhecido como Singularidades, que forma e capacita educadores. A partir deste ano, a entidade passa a ensinar seus professores utilizando esta metodologia.

O diretor geral do instituto, Cláudio Oliveira, conta que sempre busca acompanhar o que acontece no mundo em relação a processos de inovação na educação. Após comparecer à Conferência Internacional de Educação: Inovação Acadêmica, em Salvador, onde professores de diversas universidades dividiram suas experiências com o método, decidiu começar a implementar. “Eles mostraram resultados interessantes. É uma possibilidade de melhorar a aprendizagem”, conta.

Ele acredita que o grande benefício dessa inovação é a mudança de cultura. “A capacidade de se inteirar dos conteúdos fora da sala de aula e depois fazer exercícios práticos”, afirma. Mas o diretor explica que a mudança é gradativa e “não acontece num estalar de dedos”. Por isso, apenas as turmas ingressantes vão começar o curso utilizando a sala de aula invertida e vão avançar usando o modelo.

“Precisamos criar motivação. Tanto para os alunos, quanto para os professores”, diz. Ele afirma que as crianças já estão ligadas às questões tecnológicas e isso deve ser refletido nos professores também. Ele acredita que utilizando a  sala de aula invertida na formação desses educadores, a tendência seja que eles passem a usar em suas próprias salas também.

"A educação ainda é muito conservadora”

O diretor da empresa especializada em educação online Aquifolium Educacional, Wilson Azevedo, viu potencial na metodologia e, no ano passado, coordenou um curso a distância com Jon Bergmann. A turma uniu mais de cem alunos e resultou em uma rede de professores brasileiros interessados na sala de aula invertida, que segue em contato pelo Facebook.

O doutor em Antropologia Social afirma que este é um movimento que tende a se intensificar. “É um dos afluentes no grande rio da educação”. Contudo, ele explica que ainda há uma distância de gerações, em termos de utilização de tecnologia. “Temos um magistério muito conservador no Brasil. A educação ainda é muito conservadora”.

A sala invertida na prática

Professora de Ciências do Colégio Albert Sabin, em São Paulo, Thaís Arten fez o curso da Aquifolium no ano passado e, desde então, começou a introduzir o modelo em suas aulas. Descrita por seus alunos como uma “professora muito tecnológica”, ela logo começou a gravar e editar pequenos vídeos para utilizar em suas aulas.

No final do ano letivo, Thaís experimentou usar os vídeos com os estudantes do 6º ano do ensino fundamental, e os resultados foram positivos. Ela descreve uma turma com dificuldade cuja metade dos alunos teve notas abaixo da média na primeira prova, antes de usar a técnica em sala de aula. Depois dos vídeos, a média dos resultados ficou acima de oito pontos.

Após essa primeira experiência, a professora teve apoio da escola para continuar usando a metodologia e seguir com as suas turmas para o 7º ano. Neste ano letivo, já começou as aulas nessa lógica invertida. Utilizando uma ferramenta chamada Edmodo, ela posta o conteúdo e tem controle de quando seus alunos assistem aos vídeos. Além disso, os estudantes respondem um pequeno questionário para melhor entendimento do conteúdo e a partir do qual a professora pode ver onde os estudantes têm mais problemas.

Apesar do trabalho de fazer os vídeos - a professora conta que uma pequena gravação de 2,5 minutos pode levar até 10 horas de montagem -, Thaís explica que ganhou tempo em sala de aula. “Posso focar em questões pontuais e ainda realizar atividades práticas, que são tão importantes para área de ciências”, diz. Além disso, ela acredita que o tempo é um investimento inicial, pois o material não é efêmero, ele fica disponível em seu canal no YouTube (Prof Thaís Arten).

“Acredito que esta seja uma estratégia muito interessante e visual, mas não é única maneira de ensinar”, opina. A professora explica que essa motivação que percebe nos alunos pode ser resultado da novidade, mas acredita que é uma linguagem promissora para essa geração. Ela adiciona que existem muitas maneiras, além de vídeos, para virar a sala de aula, como investigação em textos, na leitura, e podcasts.

QMágico: uma ferramenta para inverter a sala

A curiosidade em relação a inovações digitais também motivou a educadora Deborah Calácia, que trabalhava com treinamento de professores com lousa digital, quando conheceu a empresa QMágico, que oferece uma plataforma para inverter a sala de aula ou para outras tarefas. O encantamento foi tanto que logo se mudou de Ribeirão Preto para São José dos Campos e, atualmente, pratica a sala de aula invertida para treinamentos de professores na ferramenta.

Deborah participou do curso online da Aquifolium, com Jon Bergmann, no ano passado e afirma que aprendeu muito. A experiência foi muito positiva, pois além do aprendizado sobre o método, fez descobertas sobre a própria educação a distância (EAD). “O professor fez do computador algo transparente e conseguiu passar emoção pela tela do computador. Percebi que o sucesso de um curso EAD é a postura que o professor adota”, conclui.

A educadora acredita que esse é o caminho para educação. “Hoje em dia, não dá mais para falar com 30 alunos como se estivesse falando com um”. Ela acredita que o ideal é buscar uma personalização, pois cada um aprende de uma maneira, e que a educação precisa enxergar que as habilidades mais importantes são individuais. A professora afirma que, quando o aluno se forma e vai para o mercado de trabalho, o empregador não quer alguém comum. Por isso, questiona: “Por que educamos nossas crianças para que todas elas sejam iguais?”

Cartola - Agência de Conteúdo - Especial para o Terra Cartola - Agência de Conteúdo - Especial para o Terra
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