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RS: movimento de alunos explica por que renega o Sisu na UFRGS

Vinda de alunos de outros Estados, falta de conteúdos regionais no Enem e fraudes em edições anteriores embasam as críticas à seleção do MEC

23 jul 2013 - 15h41
(atualizado às 15h50)
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<p>Mudanças no vestibular da UFRGS ainda são vistas com resistência por estudantes</p>
Mudanças no vestibular da UFRGS ainda são vistas com resistência por estudantes
Foto: UFRGS / Divulgação

Criado há três anos pelo Ministério da Educação (MEC), o Sistema de Seleção Unificada (Sisu) contou com mais de 1,9 milhão de inscrições apenas no primeiro semestre deste ano, alunos de todo o País que buscavam uma das 129 mil vagas em 101 instituições de ensino superior. Entre as 59 universidades federais, porém, o assunto é controverso, embora a adesão à plataforma digital seja alta, de 80%. Na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), um grupo de estudantes chegou a protestar contra o sistema.

Realizado em 4 de julho, o ato ocorreu em resposta à proposta que vem sendo estudada por uma Comissão de Avaliação da Pró-reitoria de Graduação da UFRGS de reservar 30% das vagas do vestibular para candidatos do Sisu. Mais de 3,8 mil estudantes de ensino médio, de cursos pré-vestibulares e da própria universidade confirmaram presença no evento no Facebook, mas menos de 300 compareceram. Entre os motivos, questionam a eficiência do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) e a possibilidade de que com o novo sistema de avaliação as vagas deixem de ser dos estudantes locais.

Para o presidente do Diretório Acadêmico da Ciência da Computação (Dacomp) da UFRGS, Lucas Jones, o vestibular da universidade é um guia para os ensinos médio e fundamental. "Com a adoção do Sisu, este modelo se perderia", afirma. Outro ponto contestado é o Enem ignorar regionalidades. No próximo vestibular da UFRGS, serão cobrados livros como O Centauro no Jardim, de Moacyr Scliar, e Contos Gauchescos, de João Simões Lopes Neto. Caso o Enem fosse adotado, este tipo de leitura não apareceria nas provas.

Estes motivos são duramente criticados pela professora da Faculdade de Educação e da pós-graduação em Geografia da UFRGS Roselane Zordan Costella. Segundo ela, nem o vestibular deve cobrar temas regionais, nem as escolas devem preparar os alunos em um modelo que sirva apenas para fazê-los passar em uma prova. "Estes conteúdos precisam ser conhecidos, mas não porque vão cair no exame, e sim porque acreditamos que sejam importantes para a formação do estudante. Não devem pautar a educação básica", diz. 

Outro ponto lembrado pelo presidente do Dacomp se refere à credibilidade do Enem. Por ser aplicada em todo o território nacional, em um País de dimensões continentais, a prova ficaria mais sujeita a fraudes, como foram noticiadas nas edições passadas. Além disso, o próprio modelo de avaliação é questionado. "O Enem acabou virando um grande vestibular. Nós estaríamos trocando um vestibular que funciona muito bem por um que ainda busca uma maneira de funcionar", aponta Jones. 

Neste ponto, Roselane concorda em parte. Para ela, o Enem é uma prova jovem, com 15 anos, enquanto o vestibular da UFRGS tem pelo menos 40 anos, portanto seria natural ainda ter pontos a amadurecer. Porém, lembra que há denúncias também contra vestibulares de instituições de renome no País, especialmente em fraudes para o ingresso no curso de medicina. "O Enem precisa de um tempo de maturação", afirma. 

Apesar disso, Roselane vê potencial no exame. Embora ela ache que o método de seleção defasado - um mais eficiente poderia levar em conta o desempenho ano a ano na educação básica e no ensino médio -, deposita sua confiança sobre o Enem, em detrimento do vestibular. Isso porque o primeiro cobra competências sobre os conteúdos, interpretação e coerência, enquanto o segundo está focado apenas em conteúdos. "O Enem não foi feito para reprovar, apenas classifica por pontuação, já o vestibular foi feito para reprovar", afirma.

Migração de alunos e mudança de perfil

Um ponto polêmico se refere ao perfil do estudante da UFRGS. Ao mesmo tempo em que está sediada no Rio Grande do Sul, portanto mais acessível aos estudantes gaúchos, a instituição é federal e não pode nem quer barrar estudantes de fora. Caso o Sisu fosse adotado pela universidade, haveria maior ingresso de estudantes de fora do Estado. 

Segundo o presidente do Dacomp, o movimento não quer, de forma alguma, se mostrar xenófobo. Para ele, a questão é estrutural. "Temos também uma preocupação com os gaúchos que iriam para outros Estados, com a estrutura para recebê-los, porque sabemos, pelo exemplo da UFRGS, que não há estrutura para acolher os alunos de fora", afirma.

Sobre isso, Roselane afirma que o MEC, de fato, precisa se preocupar com os tentáculos que o aumento da migração interna de estudantes dentro do País geraria, como bolsas de pesquisa, incentivos a estudantes e facilidade para moradia e alimentação. O ponto positivo é que estas trocas de região, comuns no ensino superior nos Estados Unidos, podem ser produtivas para o desenvolvimento do aluno e para a qualificação inclusive das instituições de ensino e da pesquisa.

Para ela, o Rio Grande do Sul precisa melhorar o ensino para ocupar as suas vagas e as de outros Estados, em vez de querer resguardá-las. "Se não temos um bom ensino, os outros vão tomar as vagas", diz. Além de participar de discussões dentro da universidade, e que no seu tempo serão levadas a toda a comunidade acadêmica, Roselane ainda reforça que o foco continua sendo a luta pela qualidade da educação básica ou da escola pública. "Ou manteremos sempre o mesmo perfil de aluno da UFRGS: o que fez cursinho. O Sisu é uma grande possibilidade de alunos que talvez nunca tivessem a oportunidade de passar no vestibular de ter acesso à universidade pública".

Governo deseja a adesão das federais

A primeira proposta de adoção do Sisu foi apresentada no início de julho pela Pró-reitória de Graduação e pretendia implantar as mudanças em 2014 na UFRGS. A Comissão de Avaliação está analisando o cenário e deve entregar, até o final de agosto, o seu parecer ao Conselho Universitário, que irá deliberar sobre o tema. “Existe uma proposta circulando e um desejo do governo para que as universidades federais façam esta adesão”, explica a vice-presidente da Comissão, Luciene Simões. Ainda de acordo com a universidade, as reivindicações dos alunos, no começo de julho, serão discutidas no mesmo Conselho.

Infográfico: Enem ou vestibular?

Saiba como é o processo de seleção nas principais universidades públicas brasileiras

Além da UFRGS, a Unicamp e a USP - ambas instituições estaduais paulistas - também não aderiram ao Sisu. Na Unicamp, já há um grupo de trabalho para estudar a situação. “Ainda não avaliamos o Sisu. Após a devida análise deste sistema e de outras formas de inclusão, tais como cotas e Pimesp (Programa de Inclusão com Mérito no Ensino Superior Público Paulista), a Unicamp terá um posicionamento condizente”, diz o pró-reitor de graduação, o professor Luis Alberto Magna.

Hoje, a Unicamp trabalha com o Programa de Formação Interdisciplinar Superior (ProFIS) como iniciativa de inclusão que seleciona, com base na nota do Enem, 120 alunos de escolas públicas do município de Campinas (SP). Estes estudantes fazem um curso de formação superior presencial de dois anos, para depois serem absorvidos, com base no rendimento obtido durante este período, nos cursos de graduação da universidade.

Onde o Sisu foi aceito

Na outra ponta está a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), que aderiu 100% ao sistema, abolindo o vestibular de seu calendário. A decisão foi tomada em março deste ano, pelo Conselho Universitário. Segundo o reitor, Clélio Campolina, o fim do concurso foi fruto de estudos que duraram ao menos três anos. “O Brasil estava atrasadíssimo em relação a países como Estados Unidos e os da Europa, que há muito adotam sistema de avaliação do ensino médio”, afirma.

A Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) também se rendeu ao Sisu, mas de forma parcial. Coordenadora do vestibular da instituição, Jaqueline Luz afirma que um dos motivos foi a universidade ainda estar em processo de expansão. “Temos seis cursos com avaliação mista, que é o vestibular próprio e o uso da nota do Enem. E todos são da área de saúde, como medicina, biomedicina, engenharia química, ciências biológicas, fonoaudiologia e enfermagem”.

Mesmo com grande parte das universidades públicas utilizando o Sisu, ainda é cedo para analisar o sistema como um todo, conforme Jaqueline. Para o MEC, a partir da adesão integral de todas as instituições federais e estaduais é que será possível perceber a real eficiência. “Ambos os sistemas (vestibular e Sisu) têm prós e contras, mas temos que analisar mais para optar pela melhor forma de avaliação”, diz. 

Cartola - Agência de Conteúdo - Especial para o Terra Cartola - Agência de Conteúdo - Especial para o Terra
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