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Robótica, programação e EaD: evento traz ideias e soluções para a educação

22 dez 2013 - 10h11
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Construir sistemas, desenvolver códigos, criar jogos. Assistir a uma aula por computador, conhecer as possibilidades culturais em torno de uma escola por georreferenciamento. Enfim, mostrar que as escolas não estão alheias ao processo de inclusão digital e chamá-las para a discussão. A 12ª Oficina para Inclusão Digital e Participação Social, realizada pela Associação Software Livre.Org na semana passada, em Brasília, trouxe estes e muitos outros temas que buscam apontar ideias e soluções possíveis para a educação no século 21.

Coordenador da Associação Software Livre.Org, Ricardo Fritsch afirma que, durante a organização do evento, contemplar temas ligados à educação foi uma prioridade. A inclusão do ensino da programação no currículo escolar também esteve em pauta. "Todo mundo sabe ler e escrever e não necessariamente vai escrever um livro. Código é assim. É aquela máxima: quem não programar será programado", disse, durante coletiva de imprensa, o coordenador geral de Novas Mídias e Outras Linguagens de Participação da Secretaria-Geral da Presidência da República, Ricardo Poppi.

Diego Aguilera, coordenador de programas da Secretaria de Inclusão Digital do Ministério das Comunicações, garantiu que a inclusão de temas como esses no currículo escolar já está sendo pensada em parceria com o Ministério da Educação. Como exemplo, ele cita a criação do curso de agente de inclusão digital no Pronatec. "Vamos traduzir inclusão digital como projeto pedagógico", afirmou. Para Beá Tibiriçá, diretora geral da ONG Coletivo Digital, o Brasil ainda vai assistir às escolas virarem protagonistas nesse processo.

Conheça, a seguir, algumas iniciativas voltadas para a educação apresentadas e debatidas durante o evento.

Para perder o medo

Marcelo Simba da Cruz mostrou como usar o GCompris, software de aplicações educacionais recomendado para crianças de 2 a 10 anos, em sala de aula
Marcelo Simba da Cruz mostrou como usar o GCompris, software de aplicações educacionais recomendado para crianças de 2 a 10 anos, em sala de aula
Foto: Cartola - Agência de Conteúdo / Divulgação

Uma criança portadora de agenesia do corpo caloso, malformação congênita que pode comprometer o desenvolvimento psicomotor, ficava ansiosa ao usar lápis e papel, pois não conseguir ler e escrever como os colegas. Em uma escola particular, que já contava com uma psicopedagoga, alguns estudiosos fizeram uma proposta: utilizar computador e softwares livres para auxiliar o aluno no processo de aprendizagem. Funcionou. Dois meses depois, o aluno, que antes reconhecia apenas as letras de seu próprio nome, voltou à escola com maior coordenação motora, percepção visual, espacial, auditiva, raciocínio lógico e concentração.

"Precisamos pulverizar isso, fazer com que não seja necessário um cenário tão específico (uma escola particular com uma psicopedagoga e um aluno com necessidades especiais) para isso acontecer", defende Marcelo Simba da Cruz, 32 anos, estudante de Sistemas de Informação no Mackenzie. Ele conta essa história para dar uma ideia do que o GCompris, um dos softwares utilizados na experiência, pode fazer. Ele é uma suíte de aplicações educacionais recomendado para crianças de 2 a 10 anos.

O software traz mais de 100 atividades lúdicas com diversas finalidades. Pode aproximar o aluno do computador, acostumando-o a utilizar o mouse e o PC, ajudar na alfabetização ou ajudá-lo a aprender os números. Por essa variedade, é possível usar o GCompris como apoio em praticamente todas as disciplinas, com uma interface mais atraente do que os materiais tradicionais de sala de aula. Essa diversidade tem outra vantagem imprescindível para que os alunos se apropriem das ferramentas computacionais: mostra que o computador é uma representação do mundo. "Em uma escola que visitei, combinei com a professora de matemática que ela daria o Tangram em aula, e eu também. Assim, o aluno consegue ver aquilo de forma tangível, concreta, e passa a dominar o equipamento", explica. O software fornece ainda um relatório, com informações de quanto tempo o aluno levou para resolver cada exercício, o que permite observar sua evolução.

Cruz sabe por experiência própria como um sistema de ensino que ignora ferramentas e habilidades que fujam do padrão pode ser excludente para alguns alunos. Ele próprio não escapou de ter conflitos na escola. Cansou de ouvir que era inteligente, mas que, por ser preguiçoso, não se saía bem nas disciplinas. Passou, então, a procurar alternativas para quem não se encaixava nas atividades previstas em sala de aula. Em 2008, conheceu o GCompris.

O trabalho começou como voluntário em um centro infantil de São Paulo. Cruz ajudou na construção de um laboratório de informática e passou a dar aulas – a ideia, porém, não era dar aula de informática, mas sim usar o ambiente para desenvolver os temas tratados nas outras disciplinas. "A ideia é mostrar a continuidade do conteúdo, e é uma forma de mostrar que o computador está submetido à criança, e não o contrário. Queremos que os alunos se tornem produtores de tecnologia, não apenas consumidores", afirma. A partir do trabalho em três centros, Cruz emplacou o projeto na Eusébio de Paula Marcondes, em São Paulo.

Se tudo correr como programado, em 20 horas os professores perderão o medo do computador, assumirão o controle em sala de aula e darão continuidade ao projeto – se tornarão multiplicadores. Na escola, outras professoras também já assumiram as aulas, e a ideia é que, em breve, a iniciativa se expanda para outras escolas. "Pode haver resistência dos educadores em entrar no laboratório, muitas vezes por uma questão de idade. É difícil para um professor errar em sala de aula, e precisamos quebrar esse receio", aponta Cruz.

Para aqueles que usam Linux, o GCompris está disponível com todas as funções abertas, mas para usuários de Mac e Windows, apenas algumas tarefas estão disponíveis.

Para aprender a programar

Primeiro passo para quem quer aprender a programar, o Scratch também é uma ferramenta que pode ajudar o professor a criar novas formas de ensinar em sala de aula, como jogos de perguntas e respostas
Primeiro passo para quem quer aprender a programar, o Scratch também é uma ferramenta que pode ajudar o professor a criar novas formas de ensinar em sala de aula, como jogos de perguntas e respostas
Foto: Cartola - Agência de Conteúdo / Divulgação

Programar sem perceber que está programando: o Scratch, linguagem desenvolvida pelo Massachussetts Technology Institute (MIT) é uma ferramenta cheia de possibilidades para professores e alunos. Com uma interface simples, ele estimula a desenvolver o raciocínio lógico que a programação exige. Além disso, pode ser usado para mudar a cara dos trabalhos em sala de aula, sendo possível desenvolver um jogo de perguntas e respostas no lugar de uma prova, por exemplo.

"O Scratch permite que você trabalhe praticamente com todos os conteúdos do currículo escolar. Dentro de sala de aula, as possibilidades estão limitadas pela criatividade do professor, que muitas vezes é freada pelo medo de interagir com a máquina", diz Jocemar do Nascimento, coordenador do Núcleo de Tecnologia Educacional Municipal de Cascavel (SC), que atua na formação de professores no uso da tecnologia no cotidiano na escola. Em três anos, 1.280 professores foram capacitados, totalizando 3.800 horas de formação.

Para o aluno, o contato com a ferramenta costuma ser natural, e basta estar alfabetizado para que ele possa começar a programar. "Você possibilita que a criança compreenda como funcionam as máquinas e aprenda qualquer recurso tecnológico", afirma o professor. E programar não é uma atividade solitária. Como nas escolas nem sempre é possível ter um computador por pessoa, é normal que os estudantes façam as atividades juntos. E, ao ensinar os colegas, verbalizam o que aprenderam e aprendem ainda mais.

Aproximando realidades

A plataforma CulturaEduca foi oficialmente lançada no início do mês. Ela traz a identificação de territórios educativos, mostrando os equipamentos culturais e de saúde disponíveis no entorno de escolas
A plataforma CulturaEduca foi oficialmente lançada no início do mês. Ela traz a identificação de territórios educativos, mostrando os equipamentos culturais e de saúde disponíveis no entorno de escolas
Foto: Cartola - Agência de Conteúdo / Divulgação

Em volta da Escola Estadual Orestes Guimarães, em São Paulo, há cinco museus, três unidades de saúde, um Centro de Referência de Assistência Social. Não tem nenhum cinema, nem teatro. O número de moradores da região chega a 31.486. Na instituição, são 25 as salas de aula, e não há bibliotecas. Reunir esses dados (e muitos outros) em um só lugar pode parecer uma meta difícil de atingir, mas foi concretizada no começo de dezembro, quando o portal Cultura Educa foi oficialmente lançado.

Realizada pelo Instituto Lidas por meio de uma parceria entre os ministérios da Cultura (MinC) e da Educação (MEC), a iniciativa se propõe a cruzar dados científicos, levantados por órgãos de pesquisas, como o Censo Escolar, com o saber popular – aquela roda de samba que ocorre no seu bairro todo domingo, por exemplo. Até o momento, foram mapeadas as escolas que fazem parte do Programa Mais Educação, do MEC. As zonas ao redor das escolas são chamadas de Territórios Educativos, e podem variar de um a cinco quilômetros, dependendo da região.

"Os estudantes vão à escola para ter formação, mas a gente não aprende e ensina só na instituição. Aprendo quando vou ao supermercado, ao posto, quando frequento um terreiro, quando danço", afirma Inaê Batistoni, presidente do Instituto Lidas, que define o projeto como "uma forma de escutar as vozes silenciadas". Um dos usos possíveis para o portal pode ser aproximar a realidade do aluno da sala de aula. Por exemplo: por que estudar geografia comparando as pirâmides etárias de Estados Unidos e Brasil se também se pode comparar a do seu bairro com outro da mesma cidade? "Muitos alunos dizem que não tem sentido o que está sendo estudado. A atribuição de sentido pode acontecer quando você baixa os muros da escola e parte do que ocorre no entorno dela", explica Inaê.

Nas próximas fases do projeto, o portal será aberto para quem quiser se cadastrar, e o público poderá acrescentar novos pontos e comentários no mapa correspondente ao seu território. Além disso, também está prevista a interação entre os usuários. "A ideia é provocar a participação, não chegar com método definitivo", destaca Ari Vieira, um dos diretores do Lidas. A expectativa é de que a plataforma esteja em permanente construção e seja assumida como política de governo. O portal conta com dados abertos e linguagem e conteúdo livres.

A experiência de Bauru

Wagner Antonio Jr. apresentou a experiência de Bauru (SP), no desenvolvimento de um ambiente de aprendizagem virtual para capacitar professores
Wagner Antonio Jr. apresentou a experiência de Bauru (SP), no desenvolvimento de um ambiente de aprendizagem virtual para capacitar professores
Foto: Cartola - Agência de Conteúdo / Divulgação

Pesquisador em Educação e Novas Tecnologias de Informação e Comunicação na Universidade de São Paulo e colaborador na Secretaria Municipal da Educação de Bauru (SP), Wagner Antonio Jr. deu um exemplo de como a educação a distância pode funcionar. Depois da implantação do Plano de Cargos, Carreiras e Salário no município, no final de 2010, a demanda semestral por formação profissional cresceu: de 700 docentes, até 2011, para 2.300.

Constatando a impossibilidade de formar esse número de pessoas em aulas presenciais, por falta de infraestrutura e pessoal, a secretaria viu na educação a distância uma solução. Wagner conta que foi necessário superar alguns entraves: precisavam entregar um plano de aula em duas semanas e não havia sequer um ambiente virtual de aprendizagem – apenas processamento de dados. Antes de investir em uma plataforma era preciso provar que valeria a pena e haveria procura. Criaram, então, um curso piloto, usando ferramentas gratuitas do Google. O professor montou uma página com o Google Sites, postou material no Docs e falava com os alunos por Hangouts.

As ferramentas foram usadas por três semestres, até que se verificou a necessidade de um novo meio, pois precisavam formar mais professores. Passaram a usar o eFront, plataforma aberta de elearning. Ela foi adaptada para as necessidades do município, e um novo piloto foi montado para treinar os usuários. Hoje, a plataforma ainda passa por melhoramentos constantes, mas já oferece conteúdos como relatórios para acompanhar progressão do aluno, uma secretaria online, tutorial e plano de aula, e mesmo os cursos presenciais a utilizam como repositório. "O maior desafio talvez tenha sido cultura digital, mostrar que ser professor de ensino a distância não é bicho de sete cabeças", afirma Wagner.

EaD para inclusão

O Serviço Federal de Processamento de Dados (Serpro) apresentou durante a OID o programa de educação a distância desenvolvido pela instituição. A empresa oferece cursos gratuitos em sua plataforma, disponíveis para o público em geral. A Escola de Inclusão Sociodigital existe desde 2003, mas ganhou outra cara a partir de 2011, quando começou a usar o Moodle, software livre de aprendizagem virtual. Nesses dois anos, 8 mil pessoas já passaram pela escola, que dissemina o conteúdo educacional da Universidade Corporativa do Serpro. O serviço também funciona como um parceiro para os telecentros, por meio da doação de computadores. Os cursos são interativos, e há opções com ou sem tutoria. Eles podem ser acessados no site https://inclusao.serpro.gov.br.

Robótica livre em sala de aula

Durante a oficina, os monitores Rodrigo (E) e Michel mostraram como criar novos equipamentos a partir de lixo eletrônico
Durante a oficina, os monitores Rodrigo (E) e Michel mostraram como criar novos equipamentos a partir de lixo eletrônico
Foto: Cartola - Agência de Conteúdo / Divulgação

Tratar a robótica como prática pedagógica, e não como uma matéria isolada das outras no currículo escolar. Essa foi a ideia trazida pelos monitores de informática da ONG Movimento Pró-Criança de Recife Michel Souza, 18 anos, e Rodrigo de Oliveira, 26. Eles usam a definição da robótica livre, que utiliza softwares livres e sucatas em projetos, de forma a se adaptar às necessidades e possibilidades de cada instituição. Os jovens se aproximaram do conceito quando o educador Danilo Rodrigues esteve em Recife e articulou a formação de um grupo para implementar a ideia. Hoje, os educandos dão oficinas ao ar livre, e o grupo já conversa com escolas públicas para atuar também dentro das instituições.

"Os estudantes criam a partir de equipamentos usados, eles têm que entender o processo, saber que o consumo gera lixo eletrônico. Além disso, aprendem a programar e podem aprender matemática, física, biologia, sem um professor na frente de um quadro falando", explica Rodrigo. Mostrando um capacitador, os monitores aproveitam para explicar como ele é carregado, e já falam em energia estática. Os alunos têm liberdade para mexer, desmontar e fundir peças, perder o medo de experimentar. "É um jeito divertido de aprender", resume Rodrigo.

Escolas na internet

"Esqueçam o resto, nos deem boa internet e equipamentos e deixa que o resto a gente faz", afirmou o professor da Faculdade de Educação da UFBA Nelson Pretto, durante a mesa Educação online e recursos abertos
"Esqueçam o resto, nos deem boa internet e equipamentos e deixa que o resto a gente faz", afirmou o professor da Faculdade de Educação da UFBA Nelson Pretto, durante a mesa Educação online e recursos abertos
Foto: Cartola - Agência de Conteúdo / Divulgação

"Não precisamos de internet nas escolas, o que queremos é escola na internet". Para Nelson Pretto, professor da Faculdade de Educação da Universidade Federal da Bahia, essa frase define bem a expectativa dos movimentos ligados à educação quanto às possibilidades trazidas pela tecnologia. Durante a mesa Educação online e recursos abertos, o professor falou em crise dos intermediários e no potencial da internet de levar à democratização da produção cultural. Para ele, essa crise é benéfica e dá poder àqueles que estão produzindo conteúdo. "Agora minha bandeira de luta é: esqueçam o resto, nos deem boa internet e equipamentos e deixa que o resto a gente faz", disse o professor, defendendo que o princípio fundamental para a inclusão digital está na participação e compartilhamento.

Para os recursos educacionais abertos, isso é fundamental, pois favorece a produção regional a partir do conhecimento local. "As redes possibilitam ser local e planetário ao mesmo tempo, e o conteúdo é produzido no momento em que o professor e o aluno são fortalecidos para isso. (...) Com boa infraestrutura, todos os docentes podem se apropriar do conhecimento universal para produzir mais conhecimento", defendeu.

A pesquisadora da UnB Cristina Moreira, também presente na mesa, apontou que a quebra do modelo de comunicação hegemônico – no qual um centro produz informação para a massa consumir – provocada pelas tecnologias também se aplica à educação. "O modelo tradicional de sala de aula, de professor detentor de conhecimento e aluno consumidor está cristalizado na instituição educacional e tem de ser subvertido também". Ela reforçou ainda a necessidade da criação de sistemas que sirvam como apoio para o docente e minimizem a ansiedade de introduzir as tecnologias em sala de aula e da consequente reorganização do trabalho pedagógico. "Precisamos garantir que os recursos da rede sejam usados em toda plenitude por professores e alunos nesse processo de aprendizagem coletiva", frisou.

Cartola - Agência de Conteúdo - Especial para o Terra Cartola - Agência de Conteúdo - Especial para o Terra
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