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RS: piada de docente abre debate sobre limite do humor

O limite da brincadeira em sala de aula mudou, asseguram especialistas

24 abr 2015 - 19h52
(atualizado às 20h35)
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O caso envolvendo um professor de Direito Empresarial III, na PUC de Porto Alegre, que fez piada em sala de aula sobre violação de mulheres, dividiu estudantes, contra e a favor do professor, e levantou a questão quanto aos limites do humor. A mesma frase usada por Azambuja resultou na demissão de Juan Manoel Castelao Bragaño, presidente de um órgão consultivo do Ministério do Emprego espanhol, em 2012. Braganõ fez a piada durante uma reunião do conselho da instituição. Mas e na sala de aula? Muitas vezes, professores usam a graça para descontrair e atrair os alunos.

Na capital gaúcha, a frase dita foi: “As leis são como as mulheres, existem para ser violadas.” Colocada como uma gracinha normal em sala de aula, ela arrancou risadas de parte dos alunos da turma, mas trouxe problemas para o professor Fábio de Melo Azambuja. Um estudante achou a brincadeira ofensiva e postou em seu perfil do Facebook. O Diretório Central do Estudantes (DCE) cobra um posicionamento da universidade e a reitoria anunciou que vai averiguar os fatos e tomar medidas cabíveis.

Foto: Reprodução

A professora de Antropologia Urbana, Comunicação e Educação da PUC de Minas Gerais, Sandra Tosta acredita que situações como a de Azambuja são cada vez mais recorrentes. Não pelas piadas de gosto duvidoso, que segundo ela, não são novidade, mas sim pela discordância e revolta com os gracejos. “Os estudantes estão mais instrumentalizados para se opor, seja argumentando ou buscando seus direitos, quando se sentem ofendidos.”

Atenta a esta nova realidade, a direção do curso pré-vestibular Intergraus, de São Paulo, orienta seus professores a terem cuidados com comentários e piadas durante a aula. Carlos Alberto Siscato é professor de química e um dos coordenadores do curso. Para ele, a principal questão é evitar menções que possam ofender determinados grupos.

“Antes de mais nada, o bom senso recomenda que não se diga nada que possa ser ou parecer preconceituoso, principalmente quando tratar de questões como religião, etnia ou gênero.” Siscato explica que a direção busca reforçar em reuniões com os professores as orientações, que além da questão de grupos, aponta os cuidados com situações individuais. Alguns alunos dormem em aula, outros passam muito tempo mexendo no celular, e é importante evitar comentários jocosos que possam intimidar os estudantes ou estimular o bullying. O professor lembra que muitas vezes o que faz o jovem dormir ou ficar distraído com o celular pode não ser desleixo, mas alguma questão externa.

A mudança de postura em relação a piadas é apontada por Siscato como uma mudança maior na papel ocupado por estudantes e docentes. “O professor não é mais o dono da sala, nem o detentor do conhecimento. O conhecimento está disponível, está na internet. O jovem se sente mais seguro para questionar.”

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À esta nova condição, o professor soma a questão do chamado politicamente correto. Na opinião dele, características que sempre fizeram parte do humor brasileiro deixaram de existir. “O humor (hoje) está nas situações, não no preconceito. A graça de rir do outro não existe mais, pode ser um sintoma de civilização, de progresso. A tolerância com desmandos é menor.” Mesmo assim, Siscato acredita que é possível fazer brincadeiras em sala de aula, desde que mantido o filtro do respeito.

A linha entre o que é engraçado e o que é ofensivo não é tão simples, mas Sandra acredita que está ligada à identidade das pessoas. Para a professora, vivemos um período onde, cada vez mais, os indivíduos assumem suas características de gênero, sexualidade, etnia e crença, e exigem ser tratados com respeito.

Sandra acredita que é possível e saudável construir um ambiente descontraído e com humor em sala de aula, mas cabe ao professor ter sensibilidade para não permitir que ninguém seja agredido. Por outro lado, Siscato acredita que também é importante dar crédito aos professores e entender que também existem interpretações erradas. “É importante dar um chance para que a pessoa se explique. Muitas vezes a intenção não foi expressar algo ofensivo.” No entanto, ele salienta que quem tem cuidado com as palavras que utiliza corre menos risco de ser incompreendido.

Cartola - Agência de Conteúdo - Especial para o Terra Cartola - Agência de Conteúdo - Especial para o Terra
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